A solidão inevitável de crescer (e o luto do que não volta mais)

Sinto isso o tempo todo. Talvez seja a saudade da leveza despreocupada da juventude. De chegar em casa e ter comida pronta, roupa lavada, boletos inexistentes e dramas limitados a “será que ele vai me mandar mensagem?”. Tanto a infância quanto a adolescência eram mais leves — e não é papo de romantizar, é só constatação biológica: naquela época, o cérebro da gente ainda não tava completamente desenvolvido pra sentir o peso de tudo.

Tem estudo da University College London mostrando que o córtex pré-frontal (aquele responsável por planejamento, controle de impulso, decisões complexas) só termina de se consolidar entre os 25 e 30 anos. Antes disso, a gente vive meio no piloto automático das emoções, o que torna a vida confusamente feliz, mesmo cheia de mini tragédias adolescentes.

Hoje, adulta, bancando minhas contas e lavando minha própria calcinha, vejo o quanto a gente só dá valor pros nossos pais quando cresce. Quando sai de casa e percebe que papel higiênico não brota no armário, que supermercado suga o salário, que ninguém acorda cedo pra preparar teu café. Aí as dores da vida adulta ficam tão gritantes que o que antes era só “vida normal” agora parece quase mágico. Me dá uma saudade tão doída que às vezes choro, às vezes durmo pra ver se passa, às vezes escrevo pra não explodir, às vezes gasto dinheiro em coisas que não preciso só pra sentir um micro-prazer imediato.

Tem um termo na psicologia chamado nostalgia homeostática — é tipo quando o cérebro puxa memórias boas do passado pra compensar um presente estressante. Um artigo no Current Opinion in Psychology explica que esse “passeio mental” pro passado é um mecanismo de autorregulação emocional. Em outras palavras: a gente idealiza o que foi pra aguentar o que é.

O problema é que dá vontade de voltar pra um lugar que não existe mais. Que nunca mais vai existir. A tal da infância com cheiro de bolo no forno, o colo sem culpa, a despreocupação genuína. “Que tempo bom que não volta nunca mais”, como canta o Milton.

Mas no fim, talvez crescer seja isso: fazer as pazes com a solidão de ser adulto, com a falta do que ficou lá atrás, e tentar encontrar pequenas alegrias no agora — por mais que elas venham disfarçadas de boleto pago ou cama arrumada por nós mesmos. Porque se depender da vida, ela não vai parar pra perguntar se a gente tá pronto.

-b.monma

Publicado por Bruna Monma

Escritora e criadora de projetos autorais. Escrevo crônicas, reflexões e narrativas sobre identidade, tempo e o que não cabe em legendas. Acredito na palavra como forma de presença.

5 comentários em “A solidão inevitável de crescer (e o luto do que não volta mais)

      1. Quando você pensa que é a responsabilidade aumenta, para não ter que se preocupar que é e ficar preocupado com responsabilidade viva como VISIONÁRIO pensa no que não tem e olha o que não ver.

        Curtido por 2 pessoas

    1. Exatamente. Crescer dói porque, no fundo, é um parto constante da gente com a gente mesmo. Mas a alternativa seria estagnar — e isso dói bem mais.

      Obrigada por ter lido e comentado! Seguimos crescendo, com um pouco de dor e bastante lucidez ✨

      Curtido por 1 pessoa

Deixe um comentário

Crie um site como este com o WordPress.com
Comece agora