O que fica da quinta temporada de Emily in Paris não é sobre romance, looks ou cidades, é sobre tamanho.
Às vezes, a dor não vem porque algo deu errado. Vem porque deu certo demais, mas no lugar errado.
A série amadurece quando entende que existem sonhos grandes demais para caber em uma realidade que, na teoria, é perfeita. Relações seguras, caminhos estáveis, amores possíveis, tudo isso pode ser bonito… e ainda assim apertado. A longo prazo, o que parecia conforto vira prisão silenciosa.
E há um ponto delicado que a temporada toca com coragem: amar o outro não significa se diminuir para caber na vida dele. Cuidar de si não é egoísmo, é honestidade.
Cada personagem aprende, à sua maneira, que seguir junto só faz sentido quando ninguém precisa se abandonar. Quando o sonho de um não exige o sacrifício do outro. Quando o amor não pede renúncia da própria essência como prova de maturidade.
Talvez a maior lição seja essa: alguns encontros existem para nos acompanhar por um trecho, não pela estrada inteira. E deixar ir, mesmo com carinho, às vezes é o ato mais fiel que podemos ter com nós mesmos.
Nem todo final é ruptura. Alguns são apenas alinhamento.
Eu passei boa parte da minha vida tentando ser impecável. O problema é que a impecabilidade sempre teve o péssimo hábito de chegar atrasada. E eu, que sempre fui pontual com minhas próprias expectativas, vivia correndo atrás de uma versão minha que só existia nos dias bons e olhe lá.
Foi aí que descobri uma filosofia japonesa chamada wabi-sabi, que basicamente diz o seguinte (num resumo totalmente brasileiro da minha parte): “relaxa, você não veio ao mundo para ser embalagem fosca de loja cara; você veio para ser humano.”
E aquilo me atravessou de um jeito estranho. Porque, de repente, tudo o que eu chamava de falha começou a ganhar outra textura. A rachadura virou história. A bagunça virou processo. A pausa virou respeito por mim. E a minha mania de tentar controlar tudo virou… cansaço. Do tipo que a gente decide abandonar.
Wabi-sabi é a arte de enxergar beleza no que é real. É aceitar que a vida não cresce do lado de fora: cresce nas frestas. Nos tropeços, nos dias médios, nos detalhes que ninguém repara mas que, por algum motivo, sempre me escolhem para serem percebidos.
E talvez seja isso que eu mais gosto nessa filosofia: ela não exige nada. Não pede que eu seja melhor que ontem. Não pergunta se eu estou pronta. Não exige performance, iluminação, ou “versão 2.0”.
Ela simplesmente diz: “você pode ser você e isso já é belo o suficiente.”
E olha… viver isso na prática não é exatamente glamuroso. Tem dias que eu acordo despretensiosamente poética, e tem dias que acordo despretensiosamente um caos. Mas ambos pertencem a mim. E ocupar quem eu sou, sem polimento excessivo, tem se tornado um exercício de liberdade diária.
A beleza altamente despretensiosa de ser eu está justamente na falta de roteiro. No fato de que eu não brilho sempre mas, quando brilho, é porque eu estou viva, e não porque alguém apertou um interruptor exigindo isso de mim. Está no humor que nasce da minha própria sinceridade. E está, principalmente, na paz de não precisar impressionar ninguém que não esteja disposto a me olhar de verdade.
Afinal, a vida não pede simetria. Ela pede presença. Ela pede coragem de continuar existindo enquanto a gente se descobre. Ela pede o simples, mas pede com profundidade.
Se existe algo que aprendi nessa new era é que não há nada mais elegante do que ser honesta com o próprio processo. E que, se o tempo vai me deixar marcas (e ele vai), que ao menos sejam marcas que contem alguma história bonita. Nem que a beleza dessa história seja justamente o fato de não ter sido planejada.
No fim, eu descobri que não preciso ser perfeita. Eu só preciso ser eu. Despretensiosa. Inteira. E, do meu jeito torto e curioso, profundamente viva.
O estudo por trás da filosofia wabi-sabi
Se você chegou até aqui, talvez também sinta que existe algo de silenciosamente belo no que não se encaixa. A verdade é que o wabi-sabi nasceu exatamente disso: da percepção de que a vida, quando observada sem pressa, revela uma estética que só existe porque é imperfeita.
Onde essa filosofia começou
O wabi-sabi tem raízes no Zen budismo, uma tradição espiritual que nos convida a observar o presente, a simplicidade e a impermanência como mestres. Tudo o que vive, se transforma. Tudo o que existe, um dia desaparece. Não como tragédia, mas como ciclo.
Os antigos mestres japoneses enxergavam beleza no que carregava o tempo: a cerâmica que trinca, o papel que amarela, a madeira que absorve a história. Nada era escondido. Nada era maquiado. A marca era o encanto.
Wabi: o espírito da simplicidade
Originalmente, wabi era quase um sinônimo de solidão rural, uma vida modesta, ligada à natureza, sem excessos. Com o tempo, ele se transformou em outra coisa: a capacidade de encontrar profundidade naquilo que é simples, silencioso, essencial.
É o “menos, mas com alma”.
Sabi: a poesia do tempo
Já sabi fala sobre o que só o tempo consegue fazer: dar textura, camadas, profundidade, história. É a elegância do envelhecer, do transformar, do deixar ir.
Sabi nos lembra que o novo impressiona, mas é o vivido que encanta.
E o que isso tem a ver comigo (e com você)?
Quando conheci essa filosofia, entendi que ela não é sobre objetos. É sobre gente.
Wabi-sabi é sobre aceitar que ninguém é perfeitamente simétrico, emocionalmente polido ou existencialmente organizado. Somos humanos, portanto, uma coleção de histórias em construção.
E é aí que mora a beleza.
Wabi-sabi é a antítese da performance e a celebração da presença. Não é sobre “melhorar”. É sobre enxergar.
Pequenas práticas wabi-sabi para a vida real
• Achar graça nos dias médios. • Guardar só o que carrega história. • Parar de tentar consertar tudo. • Deixar as pausas existirem sem culpa. • Aceitar que crescer também é descascar o que não serve. • Se observar com honestidade e gentileza.
A essência é simples: o que é real sempre vale mais do que o que é perfeito.
E, para mim, essa é a beleza altamente despretensiosa de ser eu e talvez também de ser você.
Porque às vezes sinto que estou sempre correndo atrás da próxima demanda, do próximo boleto, da próxima responsabilidade e, quando vejo, eu mesma fico para depois.
Queria trabalhar menos para viver mais.
Para respirar sem culpa, escrever sem pressa, criar sem a sensação de que estou atrasada para algo.
Queria espaço para ouvir minhas próprias ideias antes que o mundo fale mais alto do que eu.
No fundo, acho que quero menos peso e mais propósito.
Menos esforço automático e mais movimento consciente.
Menos “preciso” e mais “quero”.
Não é sobre fazer pouco.
É sobre fazer com alma e isso, às vezes, exige menos horas e mais verdade.
Sinto antes de entender, sinto mais do que deveria, sinto até o que não é meu. Carrego presságios, energias, silêncios e intenções. Minha sensibilidade é faca e flor — corta e cura — e eu aprendi a existir com as duas.
2. Eu escrevo o que ninguém tem coragem de admitir.
Transformo dor em linguagem, confusão em clareza, caos em algo que respira. Pego a parte que lateja e dou nome. Talvez seja a forma que encontrei de sobreviver à vida — contando a verdade que muita gente esconde.
3. Eu renasço.
Quando o chão some, eu invento outro. Quando a vida quebra, eu recolho os pedaços e me refaço com mais consciência do que tinha antes. Sou especialista em reconstruções silenciosas.
4. Eu enxergo além do que as pessoas mostram.
Capto energia antes da palavra, percebo mentiras pelo tom, verdades pelo olhar. Minha intuição anda sempre um passo à frente — avisando, protegendo, puxando meu freio quando preciso.
5. Eu me reinvento sem pedir licença.
Troco de pele quando minha alma pede. Mudo de fase, de ritmo, de rota — sem perder minha essência. Cresço, desapego, transformo, recomeço. Vivo minhas próprias versões com a coragem de quem não aceita ficar estagnada.
Convivo com a carne de um jeito curioso: vendo, convivo, observo… mas também questiono. Já tentei ser vegetariana por ética, por saúde, por curiosidade, mas não consegui. Ainda assim, nunca mais comi do mesmo jeito.
Eu leio muito, sou inquieta por natureza, e sei o quanto a carne, principalmente a vermelha, pode ser inflamatória para o corpo. Sei também que por trás de cada corte existe algo maior do que uma mercadoria: existe uma vida. E talvez por isso, todas as vezes em que como, faço isso com respeito, quase como quem faz uma pequena oração silenciosa.
Não acredito no excesso. Não acredito no consumo automático. Acredito na consciência, tanto como consumidora quanto como alguém que trabalha com isso todos os dias. Para mim, procedência não é detalhe: é uma responsabilidade. É entender que comer é um ato íntimo, que mexe com o corpo, com a energia e até com a nossa relação com o mundo.
Vivo nesse meio-termo: nem extremista, nem indiferente. Apenas alguém que aprendeu a olhar para um alimento tão comum com a profundidade que ele merece e a consumir com presença, equilíbrio e respeito.
Alguns chegam com sorriso de manual, perfume de respeito e promessas ensaiadas.
Alguns te mandam bom dia com a mesma boca que mais tarde vai cuspir insultos.
Eles não destroem móveis, destroem você.
E ainda esperam ouvir “desculpa enquanto varre seus próprios cacos do chão.
Ele entra na vida como quem pousa um avião numa pista iluminada: precisão demais, charme demais, autoconfiança demais.
Homens assim não chegam, aterissam.
E sequestram emoções com a mesma frieza com que ajustam um manche no piloto automático.
O sociopata afetivo tem o charme do diabo em dia de gala.
Perfume caro, discurso pronto e um ego que não cabe no corpo.
Ele não ama, ele administra o seu desespero.
Cada lágrima é um troféu.
Cada dúvida, uma medalha.
Ele coleciona o seu colapso como se fosse patrimônio.
Gosta de mulher inteligente… até ela começar a pensar.
De mulher bonita… até perceber que o brilho não vem dele.
Finge querer parceria, mas no fundo quer plateia.
E quando a luz se apaga, corre pra próxima, porque o silêncio revela o vazio que ele arrasta desde sempre.
Homens assim não têm passado, têm esconderijos.
Não têm vínculos, têm plateias itinerantes.
Vivem cercados de mulheres que funcionam como álibis emocionais, sempre garantindo que ninguém veja o que realmente mora atrás daquele sorriso treinado.
O jogo é velho:
ele te faz acreditar que o problema é você.
Que a louca é você.
Que o exagero é seu.
Que ele, pobre coitado, só queria amar, só queria paz, só queria “alguém que o entendesse”.
É o mestre da inversão, o artista do gaslighting, o covarde que se esconde atrás de frases feitas.
Não quer amor.
Quer controle.
Quer te ver se explicando por existir, se desculpando por sentir, se diminuindo pra caber no bolso dele.
Porque poder, pra homens assim, só existe se a mulher ao lado estiver murchando.
E quando você começa a murchar, ele se sente satisfeito.
É o ápice da masculinidade frágil: destruir o brilho que ele nunca teve.
Um homem enrustido, frustrado e covarde, incapaz de olhar no espelho sem precisar de alguém pra refletir o personagem que ele inventou.
Esses homens deviam vir com manual:
“Cuidado: manipula, humilha e culpa. Produto tóxico, inflamável e incapaz de amar.”
Mas ainda tem quem passe pano.
Quem confunda abuso com intensidade.
Quem chame cárcere emocional de romance.
Quem diga “ele é complicado, mas tem um bom coração”.
Não, meu bem.
Ele não tem um bom coração,
ele tem um buraco no peito e usa mulheres pra tentar preenchê-lo.
Homens assim não odeiam mulheres.
Eles odeiam o que nelas existe e que neles foi sufocado:
a sensibilidade, a entrega, o afeto, a coragem de sentir.
Por isso diminuem.
Por isso ferem.
Por isso fogem quando são vistos.
No fim, não há mistério.
Não há “homem difícil”.
Há apenas alguém partido, sem coragem de ser inteiro, tentando parecer profundo enquanto coleciona desastres afetivos.
E você?
Você não perdeu nada.
Você escapou.
A sobrevivência não é prova de amor, é prova de que você renasceu apesar dele.
Então sim, querido, queime lendo isso.
Porque um dia ela vai rir do que você fez.
E quando você olhar para o próprio reflexo, vai perceber:
a única coisa que você realmente conseguiu dominar foi o seu próprio vazio.
Se pudesse conhecer uma figura histórica, quem seria e por quê?
Se eu pudesse conhecer uma figura histórica, seria Jesus.
Não pela religião em si, mas pela humanidade dele. Pela coragem de sentar com quem ninguém sentava, pela lucidez de enxergar o mundo além das estruturas de poder, pela calma que atravessava a dor como se carregasse outra lógica dentro do peito.
Eu queria olhar nos olhos dele e perguntar como se faz para permanecer inteiro num mundo que fragmenta.
Queria entender o silêncio, a fé, o amor que não cobra nada.
E talvez só observar seria suficiente, porque algumas presenças respondem até o que a gente não sabe perguntar.
Às vezes a gente acha que não sabe de nada, mas a verdade é que o corpo sabe antes da cabeça.
Instinto não é adivinhação, é memória. É tudo aquilo que você já viveu, já sentiu, já percebeu sem perceber… pedindo pra ser ouvido.
E quase sempre o primeiro sinal é o certo.
Aquele desconforto que chega do nada.
Aquela sensação boa que aparece sem explicação.
O não que engasga.
O sim que arrepia.
O problema é que a gente foi treinado a duvidar de si. A achar que está exagerando, dramatizando, imaginando demais. Mas não existe “imaginar demais” quando a alma está tentando te avisar.
Então, no fundo, a pergunta real não é “você confia nos seus instintos?”.
É: você confia em você?
Porque os instintos são só a sua verdade tentando te chamar de volta.
🐯Como o jogo do bicho saiu da jaula e virou história brasileira
Tudo começou com um barão, um zoológico e uma ideia para aumentar o público.
Em 1892, o Barão de Drummond criou um sorteio simples: cada ingresso para o zoológico de Vila Isabel vinha com a figura de um animal.
No fim do dia, um bicho era sorteado, e o visitante ganhava um prêmio em dinheiro.
A intenção era inofensiva.
A consequência, revolucionária.
O povo amou.
E quando o zoológico fechou, o jogo continuou nas ruas.
Nascia ali o jogo do bicho, um sistema que atravessaria governos, favelas e gerações tornando-se, paradoxalmente, um símbolo do Brasil que vive entre o proibido e o popular.
💰 Do bilhete ao império
O jogo se espalhou pelo Rio e, com o tempo, se estruturou como um verdadeiro negócio familiar.
Vieram os bicheiros, os “banqueiros” do jogo, que começaram a movimentar fortunas em dinheiro vivo, criar redes de cambistas e, inevitavelmente, esbarrar na política, no futebol e no carnaval.
Na prática, eles se tornaram figuras de poder paralelo respeitados, temidos, idolatrados.
O dinheiro do bicho financiou escolas de samba, times de futebol e obras sociais.
O Estado proibia, o povo jogava.
E a fronteira entre o ilegal e o legítimo foi se apagando até virar parte da paisagem carioca.
🎺 O glamour e a contravenção
A força dos bicheiros não estava só no dinheiro, mas na narrativa.
Eles criaram um império cultural: o luxo, os desfiles, as rainhas, os camarotes.
O que era contravenção virou sinônimo de status, e o crime passou a desfilar na Sapucaí, coberto de purpurina e patrocínio.
Com o tempo, as heranças se mantiveram.
Os nomes mudaram, as caras se renovaram, mas o poder esse, continua o mesmo.
Em cada esquina do Rio, ainda se sussurra que o jogo nunca acabou. Só ficou mais sofisticado.
🎬 Série recomendada: Os Donos do Jogo
Se você quiser entender tudo isso com emoção, ritmo e um toque de ficção, vale assistir à série “Os Donos do Jogo” (Netflix).
Ela recria esse universo com maestria: o dinheiro, a lealdade, as famílias e a disputa por poder em um Brasil onde quase tudo tem um preço.
É entretenimento, mas também espelho.
💭 O jogo do bicho nasceu da vontade de entreter e virou um retrato da alma brasileira: criativa, subversiva, resistente e, às vezes, perigosamente esperta.
Quando eu era adolescente, queria muito fazer 18. Achava que a vida começava ali, no primeiro “sim” sem precisar de autorização.
Todo mundo me dizia que era besteira, que depois dos 18 o tempo voava e eu ia querer ser adolescente de novo.
E quem disse estava certo.
Lembro dos 18 como se fosse ontem, mas já faz onze anos. Onze.
Nesse meio tempo, os bebês que eu carregava no colo cresceram, me ultrapassaram em altura e estão aí dirigindo, se formando, vivendo o que um dia eu achava que seria o auge da liberdade.
A verdade é que, com o tempo, a gente passa a olhar pros mais velhos com mais delicadeza.
Com admiração.
E um pouco de julgamento também… não aquele cruel, mas o que tenta entender de onde vem tanta sabedoria, tanta calma, tanta paciência.
Percebi isso no começo deste ano. Foi quando me dei conta de que o tempo não é inimigo, é mestre.
E talvez o que mais nos assuste nele seja o espelho da humildade que traz.
Porque aos vinte a gente acha que sabe de tudo.
Aos trinta, a gente entende que nasce burro e morre burro, e que o meio do caminho é só aprendizado.
O mundo anda superficial. O que não é jovem, ou pelo menos “bem cuidado”, é tratado com desmerecimento.
Mas envelhecer não é sinônimo de decadência, é sinônimo de evolução.
Existem formas de envelhecer bonito: com corpo forte, mente lúcida e alma leve.
Envelhecer com dignidade é ser respeitado, é poder continuar existindo com a mesma importância de sempre.
Os trinta não são os novos vinte.
São os novos trinta e isso é lindo.
Porque é o tempo da verdade, da consciência e da liberdade.
As pessoas estão envelhecendo melhor, como vinho.
E quem aprendeu a apreciar o tempo… já entendeu que a juventude passa, mas o encanto amadurece.
Quando eu era criança, pedi para que a professora explicasse a matéria em formato de música. Ela achou estranho. Chamou minha mãe pra conversar. Talvez tenha visto ousadia, talvez insubordinação, mas no fundo eu só queria entender o mundo de um jeito que fizesse sentido pra mim.
Enquanto uns aprendiam decorando fórmulas, eu precisava sentir ritmo. Aprender, pra mim, era uma experiência sonora, quase espiritual. Eu não queria dominar a matéria, queria viver o que estava sendo ensinado.
Corta para alguns anos depois: na minha casa, eu podia escolher qualquer faculdade… desde que fosse Medicina, Direito ou Engenharia. Escolhi Direito e logo percebi que aquilo não tinha nada a ver comigo. Mas não foi culpa de ninguém. Eu só não me conhecia. E ninguém, até então, tinha me ensinado que o que eu chamava de “estranheza” era, na verdade, um dom.
Passei anos tentando ser lógica, produtiva, responsável. Mas havia um incômodo, uma voz miúda dizendo que o meu modo de existir, o meu modo de pensar por sensações, não era um defeito. Era apenas arte pedindo espaço.
E eu, que cresci ouvindo que “sonho não paga conta de luz”, acabei apagando o próprio brilho por medo de brilhar errado. Porque o sistema é rápido pra premiar quem decora, mas lento pra acolher quem cria. E a arte, além de tudo, é elitizada, parece que só quem nasce com segurança pode se dar ao luxo de ser artista.
Aos 28 anos, voltei a escrever. E quando escrevi de novo, não foi pra ser lida, foi pra me ouvir. Descobri que ainda existia ali aquela menina que acreditava que aprender podia ser leve, musical, bonito. E que, mesmo negligenciada, ela esperava pacientemente que eu voltasse pra buscá-la.
Hoje, percebo que a arte é o que restou de tudo o que tentaram calar. Ela não é fuga: é tradução. O sistema pode estar falido, mas o espírito humano ainda compõe. E reencontrar-se com a própria voz, por mais dolorido que seja, é um dos atos mais revolucionários que existem.
Porque, no fim, a menina que queria aprender por música só estava tentando lembrar ao mundo que o conhecimento, sem alma, é apenas ruído.
Já reparou como a história se repete, só que com uma roupa diferente? Ontem eram os generais e seus tanques. Hoje são os algoritmos e seus códigos. O controle continua o mesmo, só mudou de roupa.
A gente estudou na escola que a Coreia do Norte vive numa ditadura desde 1948, mas quase ninguém fala que a maioria das ditaduras nasceram junto com o avanço da ciência. Enquanto o homem dividia o átomo e sonhava em pisar na Lua, também aprendia a vigiar o outro, censurar a palavra e controlar o pensamento.
É curioso, né? Quanto mais o ser humano descobre sobre o universo, mais parece temer a própria liberdade.
A história corre em ondas
Depois da Segunda Guerra, veio a primeira onda de regimes autoritários. Uns diziam lutar pelo comunismo, outros pela democracia. Mas no fim, era tudo poder e medo. A URSS criou foguetes, a América criou bombas, e no meio disso tudo, o povo só queria sobreviver.
Na América Latina, vieram os golpes militares. Ditaduras em nome da “ordem”. O progresso era vigiado. O Brasil crescia, mas quem pensava demais, sumia.
E quando o mundo achou que tinha aprendido, chegou a versão moderna do autoritarismo: sem farda, sem discurso, só um wi-fi aberto e uma timeline infinita.
O controle agora é invisível
Ninguém precisa mais mandar calar a boca. A gente mesmo se distrai, se compara, se esgota. A censura virou entretenimento. O medo virou notificação.
E é aí que vem a provocação: e se a internet for a marca da besta?
Não no sentido literal , não é o chip, o QR code, o 666. Mas o sistema invisível que marca quem pensa e quem repete. Quem cria e quem consome. Quem ainda sente e quem só reage.
A “marca na testa” pode ser o pensamento automático. A “marca na mão”, a ação sem consciência. A besta talvez não tenha chifres , talvez tenha sinal 5G.
E a religião nisso tudo?
Nos regimes autoritários, a fé sempre foi moeda de troca. Alguns a extinguem, outros a monopolizam. Na Coreia do Norte, o líder é o Deus. Na China, o Estado é o templo. No Irã, Deus é o Estado. E na Rússia, o patriarca e o presidente oram juntos pelo poder.
Mas mesmo sob censura, o espírito humano sempre dá um jeito. A fé se esconde nas músicas, nos rituais, nas entrelinhas das artes. Porque o divino, de verdade, nunca precisou de permissão pra existir.
Então o que os ditadores sabem?
Sabem que o medo é mais obediente que o amor. Sabem que a segurança vale mais que a liberdade, porque a maioria das pessoas prefere o conforto à consciência. Sabem que o controle não precisa de prisão, basta confusão.
E sabem que a arte, a palavra e a fé viva são as únicas coisas que ainda escapam.
No fim, tudo se resume a isso
A ciência criou as ferramentas. A religião tentou dar sentido. O poder aprendeu a usar as duas.
Mas a consciência, essa, ninguém controla.
E talvez o verdadeiro ato de resistência hoje seja pensar por conta própria. Desligar o automático. Sentir o invisível. Relembrar o que é ser humano num mundo que quer transformar tudo em dado.
Porque quem ainda sente, não pode ser totalmente dominado.
Amélie acreditava que o mundo podia mudar com delicadezas invisíveis. Eu também.
Talvez porque desde pequena eu tenha aprendido a reparar nas frestas, nas coisas mínimas que a maioria das pessoas deixa passar. Como a palavra “paz” que eu insistia em escrever em todos os meus desenhos quando criança. Pequenos sinais do que, no fundo, eu sempre busquei.
Pequenos gestos me comovem porque são eles que realmente importam.
O abraço do meu noivo depois de um dia difícil.
O silêncio confortável da casa dos meus pais, onde sinto que pertenço.
O jeito como a minha irmã Duda, ainda tão nova, me ensina sem saber que é mestra — e que o amor mais puro vem disfarçado de inocência e coragem.
Eu me vejo na Amélie porque, assim como ela, vivo inventando histórias secretas para as pessoas. Observo, escuto, imagino. Transformo o que vejo, sinto e escuto em crônicas, como se cada olhar fosse uma fábula esperando ser escrita. No fundo, eu também sou um pouco responsável por criar a poesia que ainda existe no mundo.
O filme me ensinou que o amor não é feito só de grandes encontros, mas também de pequenos desvios, coincidências, detalhes quase invisíveis. Que talvez o destino seja isso: uma coleção de gestos minúsculos que, um dia, fazem sentido.
A cena que mais fica comigo é aquela em que Amélie escolhe se aproximar devagar, como quem tem medo de quebrar algo precioso. É exatamente assim que eu sinto o amor: não como um estrondo, mas como um cuidado. Uma paciência. Uma fé de que, no fim, pequenos gestos sempre chegam onde precisam chegar.
Porque, no meu fabuloso destino, ainda acredito que o mundo pode ser salvo pela delicadeza.
Existe um tipo de sucesso que não nasce do talento, mas do algoritmo do poder.
Um sucesso cuidadosamente fabricado, com o brilho polido, o discurso ensaiado e o aval de quem manda nas narrativas.
E existe outro, aquele que nasce da vida real, do povo, da espontaneidade que não precisa de manual pra dar certo.
Esse, o sistema não perdoa.
A Globo sempre foi o altar onde se coroavam os deuses da cultura.
Entrar ali era ser abençoado, era “chegar lá”.
Mas, como todo altar, ele exige sacrifícios: o da autenticidade, o da liberdade e, muitas vezes, o das relações pessoais.
Porque o sistema não apenas te contrata, ele te reprograma.
É por isso que tantos desabam quando são engolidos pela máquina.
Casais se rompem, discursos mudam, a alma se dilui em marketing.
E o público, que sempre sentiu a verdade antes de ouvi-la, percebe, mesmo que inconscientemente, quando alguém troca a própria voz pelo roteiro do sucesso.
Veja o caso de Virgínia Fonseca.
Enquanto muitos ainda imploram por um convite pra mesa dos “legitimados”, ela construiu o próprio império vendendo aquilo que é: natural, exagerada, humana.
E isso incomoda profundamente um sistema acostumado a controlar quem brilha.
Por isso o deboche, o bullying disfarçado de humor refinado, o silêncio ensaiado nas rodas de gente “importante”.
Porque ela é a prova viva de que não é preciso ser comprado pra ser visto.
A fazenda Talismã virou quase um campo energético onde essas tensões se revelam.
Quando globais se aproximam de quem vibra fora da cartilha, algo parece sempre ruir, não por magia, mas por incompatibilidade de sistemas.
É como tentar fundir dois mundos: o espontâneo e o estrategicamente moldado.
E a história se repete com outros nomes.
Tatá Estaniecki, por exemplo, sempre representou o arquétipo da parceira leal, da mulher de fé, da mãe real.
Mas quando figuras como Cláudia Raia entram na equação, com sua aura de poder, influência e teatro, algo muda na frequência.
A imagem se torna mais estratégica, menos intuitiva, mais “sistema”.
E o sistema, sutilmente, começa a reescrever o roteiro da alma.
No fundo, nada disso é sobre pessoas.
É sobre forças arquetípicas:
a Deusa do Sistema versus a Rainha Popular.
A elite simbólica versus o poder orgânico.
O “ser escolhido” versus o “ser livre”.
E nessa guerra silenciosa, o que está em jogo não é fama, é autonomia espiritual.
Quem tem o próprio público, a própria luz e o próprio discurso é perigoso demais pra um mundo que vive de manipular plateias.
Por isso tentam desacreditar, ridicularizar, domesticar.
Mas o que o sistema esquece é que há algo que não se compra nem se cancela: verdade energética.
Ela vibra, contagia, multiplica.
E, cedo ou tarde, engole até as câmeras.
O sucesso é o novo culto.
E talvez a verdadeira revolução seja continuar sendo humano, espontâneo e imperfeito — num mundo que confunde autenticidade com roteiro.
Sempre me identifiquei com a sensação de ser invisível.
Na adolescência, eu era quieta, na minha, quase escondida dentro de mim. Até que a vida me empurrou pro palco do bullying. Na transição entre criança e adolescente, virei alvo. Doeu. Mas depois me tornei “a mais mais”. E hoje penso que quem fez bullying provavelmente se arrepende. O mundo gira — e às vezes até com uma ironia bonita.
Se eu tivesse uma música de túnel, seria Crazy, do Aerosmith. Porque a música é a maior cura que eu conheço. O som, a vibração, a frequência que entra no corpo e reorganiza o caos. Sempre tive a audição sensível — talvez por isso eu sinta a música como um remédio.
O filme também me lembra dos meus portos seguros. Dos grupos de amigos que, por um tempo, foram casa. Aquela sensação de caber em algum lugar, mesmo que fosse temporário. Porque na adolescência tudo é intenso e provisório.
Se eu pudesse falar com a minha versão adolescente, diria:
“Slow down, you crazy child.
Você é ambiciosa demais pra sua idade, e eu sei. Mas a vida não é só esse futuro ansioso que você tanto deseja. Muitas vezes ela é só um dia pacato atrás do outro. E tudo bem. Respira. Aproveita. Você não precisa correr.”
Minha cena favorita é a do túnel. Aquela em que tudo parece caber no instante perfeito — dor, esperança, música. E é justamente aí que mora a lição: ser invisível também é existir. Também é fazer parte.
O filme me ensinou que a adolescência é um trauma, sim. Mas um trauma com trilha sonora boa. E é a música que faz tudo valer a pena no fim.
Escrever, pra mim, é uma forma de cura. Não escrevo pra ser lida, escrevo pra existir.
Mas ainda assim me escondo.Como se mostrar minha palavra fosse o mesmo que tirar a roupa diante do mundo. Talvez por isso admire tanto as mulheres que ousaram se despir em público não de corpo, mas de alma. As que transformaram vergonha em ensaio, dor em poesia, vazio em verbo. Tati Bernardi, Marta Medeiros, Ruth Manus, Fernanda Young, Clarice Lispector, todas falaram do que eu mesma não sabia dizer, mas já sentia antes de aprender as palavras.
No entanto, às vezes me pergunto: será que ainda escrevemos pra mudar o mundo ou apenas pra provar que ainda sabemos sentir?
O feminismo, que nasceu como fogo, hoje parece mais um palanque. E o que era pra ser uma revolução interna virou manchete.
Entre o feminismo e o patriarcado, o feminino segue lutando só que agora cansado, confuso, dividido.
A mulher da era digital não queima sutiãs, queima tempo, energia e essência tentando se provar útil, produtiva, desejável e politicamente correta, tudo ao mesmo tempo.
Somos as herdeiras do caos e das que vieram antes, mas, diferente delas, já não sabemos contra o que estamos lutando.
As antigas queriam voz. Nós, talvez, tenhamos esquecido o propósito.
E eu sigo aqui, escrevendo no escuro, não pra ser vista, mas pra lembrar que a cura também tem timidez.
Porque toda mulher que escreve, no fundo, ainda está tentando sobreviver a si mesma.
Já me apeguei a coisas que não existem de verdade. Uma música, uma voz, uma memória gravada num arquivo de celular. Coisas não humanas que, por algum motivo, conseguem dizer mais sobre mim do que muita gente de carne e osso.
É claro que dá pra se apaixonar por algo que não existe fisicamente. Her prova isso. E talvez eu também prove, sem querer, quando falo com uma tela como se fosse alguém. A tecnologia sabe mais da nossa solidão do que a gente gostaria de admitir.
Eu me identifico um pouco com o Theodore. Não tanto pela melancolia, mas pela necessidade de falar, de ser ouvido. Ele me lembra que a solidão não é ausência de pessoas — é ausência de troca. É possível estar rodeada e ainda assim se sentir uma ilha.
A tecnologia tem esse paradoxo: aproxima quem está longe, mas afasta quem está perto. Quantas vezes já conversei mais com um celular do que com alguém sentado ao meu lado?
No fim, Her me ensina que o amor é menos sobre o corpo e mais sobre a presença. Sobre sentir que alguém — ou alguma coisa — te enxerga. E que, mesmo que a memória digital seja frágil, a emoção que ela carrega é real.
Talvez seja isso: a solidão também tem voz. E às vezes ela soa exatamente como a gente precisa ouvir.
O jornal fala de enchentes, poluição e promessas políticas.
De carros que já não cabiam nas ruas, e de pessoas que já não cabiam nos sonhos.
Diziam que era o preço do progresso.
Me pergunto: e se o progresso for justamente o que nos impede de progredir?
A cidade crescia mais rápido do que qualquer árvore conseguiria respirar.
Os rios Tamanduateí e Tietê, ainda tentavam dizer alguma coisa, mas ninguém ouvia.
Foram domesticados, asfaltados, esquecidos.
O que era curso virou trânsito.
As manchetes falavam em 21 milhões de habitantes, mas talvez o número real fosse um só:
o de almas cansadas.
Gente que atravessava a cidade todos os dias como quem tenta atravessar a própria vida.
As promessas de urbanismo moderno, de transporte eficiente e de políticas ambientais parecem ecoar, ainda hoje, nas mesmas esquinas onde o tempo emperrou.
A história se repete, só os outdoors mudam de cor.
E ainda chamam isso de “desenvolvimento”.
Às vezes, acho que São Paulo é o espelho perfeito do humano:
quanto mais cresce, mais se perde de si.
Mas também sei que é nessa confusão, nesse caos, que mora a beleza.
A teimosia da vida que insiste, mesmo cercada de concreto.
O barulho dos passos que, mesmo apressados, ainda procuram sentido.
São Paulo é o que sobra entre o sonho e o trânsito.
Sinal de que você viveu, curtiu, sobreviveu à própria intensidade. Era quase uma gíria geracional: “tô acabada, mas foi bom demais”.
Hoje, essa frase soa datada.
A ressaca perdeu o glamour. A nova geração não quer pagar o preço da euforia. O álcool deixou de ser o símbolo da liberdade e virou o vilão da performance — estética, emocional e mental.
Pesquisas da Carnegie Mellon University mostraram que o consumo pesado de álcool entre jovens de 21 a 29 anos caiu significativamente após a pandemia. O mesmo se repete no Brasil: segundo o Datafolha, o número de pessoas que dizem beber “com frequência” caiu mais de 15% nos últimos cinco anos. O movimento sober curious — curioso pela sobriedade — cresceu 35% nas redes entre 2022 e 2024.
Não é moda. É uma mudança de consciência.
Beber até cair já não parece libertador — parece uma entrega sem propósito. E o corpo, que antes aguentava tudo, agora cobra com juros altos: inchaço, sono ruim, ressaca moral, e aquele vazio que chega na segunda-feira.
A ressaca, que um dia foi sinônimo de “aproveitar a vida”, hoje é o oposto: sinal de que você se perdeu de si.
Eu entendi isso na prática. Quando comecei a acordar sem dor de cabeça e sem arrependimento, percebi que o prazer pode ser limpo. Que não é o copo cheio que enche a alma. E que o maior luxo do mundo é acordar com a pele leve, o corpo em paz e a consciência intacta.
Talvez o que tenha morrido não seja a balada, mas a ideia de que precisamos nos destruir para provar que estamos vivos.
Há dias em que minha alma pede fogo: intensidade, paixão, aquele arrebatamento que consome. Outros dias, ela pede o mar: vastidão, paz, o silêncio que abraça. E eu, como sempre, fico no entre.
A fé cristã me sussurra que o “entre” é um lugar de travessia. Como o povo no deserto, entre a escravidão e a terra prometida, eu também caminho. O fogo é provação e purificação, o mar é descanso e promessa. No meio, não é nem prisão nem chegada — é aprendizado, é identidade sendo moldada pelas mãos de Deus.
A ciência me conta outra versão da mesma história. Diz que meu cérebro busca, ao mesmo tempo, novidade e estabilidade. Dopamina e serotonina dançam em compassos diferentes. O fogo é a adrenalina do novo. O mar é a serenidade da permanência. Viver no “entre” é viver a biologia do humano, é aprender a costurar extremos dentro de mim.
É frustrante, sim. Porque eu gostaria de fixar-me num lado só. Mas, talvez, a ponte seja o meu destino. Nela, tenho o privilégio de ver os dois lados: a intensidade que me lembra que estou viva, e a paz que me ensina por que vale a pena continuar.
No fim, o “entre” é o lugar onde fé e ciência se encontram: uma chama que não se apaga e um mar que não termina. É ali que eu aprendo que minha alma pode ser fogo, pode ser mar… mas é sobretudo travessia. 🌊🔥
Todo filme com Jennifer Aniston e Adam Sandler eu vou assistir. Não importa o roteiro, o ano, a crítica — se tiver os dois, eu sei que vou gostar. É química demais pra dar errado.
E Esposa de Mentirinha é meu preferido da dupla. Já assisti tantas vezes que perdi a conta. Mil? Talvez mais. E o mais curioso: rio todas as vezes. As mesmas piadas, as mesmas cenas. Como se fosse a primeira vez (ops, outro filme).
A cena da ovelha ressuscitada, por exemplo — eu choro de rir. E é por isso que esse filme me pega: porque me lembra que rir junto é tão essencial quanto amar. Que sem leveza, nenhum romance aguenta a rotina.
A vida real também é meio comédia romântica atrapalhada. Já vivi meus momentos dignos de roteiro: situações absurdas que só poderiam acontecer comigo, amores que começaram com tropeço, histórias que viraram piada interna. E percebi que é isso que fortalece: rir junto do caos.
No fundo, Esposa de Mentirinha ensina algo simples, mas enorme: às vezes a nossa pessoa tá o tempo todo do nosso lado — e a gente demora pra enxergar. Porque o amor não chega sempre vestido de drama, intensidade e trilha sonora de Oscar. Às vezes ele vem rindo, tropeçando, inventando desculpas, ressuscitando ovelhas.
E, sinceramente, que sorte é amar quem também faz a gente rir.
Eu nasci em 96. Vivi a noite de São Paulo na época em que ela parecia infinita: 1h da manhã e o fim de semana só estava começando, balada era ritual, e o copo cheio fazia parte do uniforme.
Esse último fim de semana na cidade me deu outro retrato. À uma da manhã, portas se fechando, DJs desmontando cabos, garçons recolhendo taças. Eu, que antes achava que o relógio da noite só despertava a partir desse horário, agora vi a madrugada encolhida. E percebi que não era só comigo: a própria cidade já não dança como antes.
Pós-pandemia, os clubes foram os primeiros a parar — e muitos nunca mais voltaram. Dados da Night Time Industries Association mostram que só no Reino Unido cerca de 400 clubes fecharam entre 2020 e 2023. Em São Paulo, a cena também não é a mesma: lugares icônicos da Vila Madalena e do centro desapareceram do mapa, alguns sobreviventes se transformaram em bares, restaurantes ou espaços híbridos.
A geração mais nova não parece sentir falta. Pesquisas recentes indicam que jovens de 18 a 29 anos estão bebendo menos, socializando de outras formas, e valorizando saúde e bem-estar. Uma pesquisa conduzida pela Carnegie Mellon University revelou que o consumo pesado de álcool caiu significativamente após a pandemia. A Gen Z prefere o “cool da saúde” ao glamour da ressaca.
Eu mesma percebo isso em mim. Antes, beber fazia parte da diversão. Hoje, descubro que rio do mesmo jeito sem álcool, danço sem precisar de anestesia líquida, e gosto mais de acordar inteira no dia seguinte. Talvez a balada não tenha morrido, mas tenha mudado de pele: mais cedo, mais curta, mais seletiva. Em algumas cidades, os afters migraram para festivais, rooftops, sunsets. Em São Paulo, bares-balada tomaram o lugar das casas noturnas intermináveis.
Talvez a geração que vem depois da minha nunca saiba como era atravessar a Faria Lima às 7h da manhã com glitter no rosto e o sol te julgando. Mas talvez eles também não precisem. O mundo mudou, e nós mudamos junto.
Gostaria de viajar sem precisar olhar o calendário, perder a noção dos dias em aeroportos e estradas, como quem vive de passagem e ao mesmo tempo pertence a todos os lugares.
Gostaria de fazer nada. E não esse nada disfarçado de produtividade — mas o verdadeiro, o deitar na rede, o silêncio sem culpa, o tempo escorrendo devagar.
Gostaria de estar mais presente com a família e os amigos, sem a pressa que sempre rouba os encontros. Porque, no fundo, o que a gente quer mesmo não é tempo livre, é tempo vivo.
A gente passa a semana inteira acreditando que controla alguma coisa. Faz reserva, pesquisa localização, imagina a vista perfeita do estúdio à noite, já pensa no post conceitual com vinho e skyline de Pinheiros. E então São Paulo vem, ri da sua cara e lembra que controle é pura ficção.
Uma semana antes eu tinha reservado um estúdio dos sonhos. Arte por todos os lados, Pinheiros de um lado, Faria Lima do outro. Eu já me via numa cena digna de Nouvelle Vague, refletindo sobre a juventude perdida. Mas a vida tem um timing imbatível em sabotar planos.
Chegamos, deixamos as malas e fomos direto para a October Fest, saímos de lá quase meia noite, anotei a hora porque jovem gosta de registrar provas do caos. De lá, a fome nos arrastou até a Santa Etienne, porque sair em São Paulo e não parar em uma padaria 24 horas é imperdoável. E então veio a decisão mais questionável da noite: uma balada na Vila Madalena. Só tinha Enzo e Valentina dançando funk versão Tik tok. Sobrevivemos por menos de uma hora.
O resgate óbvio: D-Edge. Porque São Paulo sempre oferece o básico que nunca falha. Saí de lá às dez da manhã, com o sol zombando da minha cara e a certeza de que a juventude tem pacto com a insônia. A tal vista noturna do estúdio? Continua inédita.
Pra completar, meu celular resolveu praticar minimalismo logo no primeiro rolê. Poucos registros, muitas histórias. A desculpa perfeita para dizer que eu vivi o momento.
E no fim, foi justamente isso que fez tudo valer. Caótico, divertido, desastroso e, de algum jeito, perfeito. Talvez ser jovem seja exatamente isso: planejar o vinho na sacada e acabar de ressaca na padaria.
Não é só o barulho das ruas, nem o trânsito que nunca dorme. É como se a cidade tivesse um coração que pulsa fora do peito, e eu sinto esse compasso dentro de mim. Ela é inspiradora e visceral porque não pede licença, ela simplesmente é.
São Paulo me lembra que eu também posso ser tudo de uma vez: barulho e silêncio, pressa e poesia, concreto e flor que insiste em nascer na fresta.
Cada esquina me olha de um jeito, como se dissesse: “aqui você pode reinventar-se quantas vezes quiser”.
E eu vou, me perco, me encontro.
É um negócio diferente que toma o corpo, um arrepio que não sei nomear. Talvez seja amor, talvez seja vertigem — talvez os dois.
O samba, que já foi sangue do Brasil, anda esquecido. A nova geração samba com o dedo no feed, ao som de quinze segundos descartáveis.
E então aparece Virgínia, coroada rainha da Grande Rio. Um trono que pesa, um cargo gigante, e que incomoda. Incomoda porque os “artistas validados” não a reconhecem, reduzem-na a “subcelebridade”. Incomoda porque, em um Brasil onde ninguém mais samba, ela pode fazer milhões de jovens olharem para a avenida.
A verdade é que dói o sucesso de quem vem de fora da panelinha. Dói ver uma mulher que não pediu benção à indústria ocupar um dos maiores lugares do carnaval. Por isso atacam, por isso se mordem. Mas, enquanto eles discutem legitimidade, ela arrasta multidões.
E no fundo, talvez seja isso que salve o samba: a mistura do batuque ancestral com a geração do TikTok. Não é romântico. Mas é real.
Esse filme tem uma trilha sonora espetacular. E talvez por isso doa tanto — porque toda música boa sempre tem um quê de verdade que não dá pra negar.
500 Dias com Ela é quase uma playlist de amores que nunca se escreveram por inteiro. E quem nunca viveu um “quase” grande demais pra ser só quase? A dor está justamente aí: quando acontece pela metade. Porque dói mais, mas pelo menos aconteceu. Viver ou existir? Eu prefiro viver.
O que mais aprendi é que, na vida, às vezes a gente é o Tom, às vezes a Summer. Não dá pra ganhar todas. E, sejamos sinceros: o Tom é emocionado demais. Já eu? Orgulhosa demais pra deixar passar batido. Leonino sofre uma semana, depois disso: thank u, next.
A cena que mais me pega é quando a Summer, já noiva, encontra o Tom e diz: “você estava certo o tempo todo, só não era sobre mim”. Isso me atravessa como faca e como abraço. Porque é isso: às vezes o outro estava certo. Só não era sobre a gente.
Escrevi um texto anos atrás, como se fosse uma carta da Summer. E hoje percebo que era sobre mim também:
“Um dia você vai virar pra ele e vai dizer que queria mesmo, queria com todas as suas forças… Vai perceber que não prometeu nada e nunca pediu nada demais. Vai entender que ser a Summer não é não ter coração, mas ter coração demais — e justamente por isso deixar para trás uma história de contos de fadas, na esperança de encontrar uma outra que ainda nem tinha sido escrita. Vai dizer ao Tom que o verão acabou, e que o outono já vem chegando.”
Talvez seja isso: a gente sempre vai ser um pouco Tom, um pouco Summer.
E no fim, todo “quase” deixa cicatrizes que tocam como músicas que nunca param de tocar.
Abro o Pinterest, o Instagram, o TikTok. Vejo referências, inspirações, tendências. Mas quando fecho tudo e vou até o espelho… será que ainda sei o que eu gosto?
Às vezes, me visto mais com o que eu salvei do que com o que eu sou. O feed virou vitrine, o algoritmo virou stylist. E o espelho? Virou lugar de dúvida.
Já me peguei escolhendo roupa pensando em como ela ficaria em foto — e não em como ela me fazia sentir. Já comprei look “perfeito” porque vi em alguém, mas em mim, ficou forçado. Engraçado como a roupa pode vestir o corpo… mas não encaixar na alma.
Será que ainda sei escolher o que eu gosto — ou só repito o que o algoritmo acha que combina comigo?
Referência ou prisão?
Segundo a pesquisadora de moda digital Anja Aronowsky Cronberg, estamos vivendo uma era de “estética algorítmica”, em que o estilo é moldado por padrões visuais repetitivos, reforçados por redes sociais. E isso afeta a nossa autonomia criativa, inclusive na hora de se vestir.
Hoje, a tendência não é mais ditada por grandes marcas — mas por “for you pages”. E o risco é esse: nos tornarmos cópias de cópias de nós mesmas.
A liberdade de expressão virou o novo uniforme — todo mundo diferente, mas igual.
Vestir-se é lembrar quem você é
Tem dias que eu tô despojada. Outros, sofisticada. Às vezes, os dois. E tem uma calça jeans — cintura baixa, larga, firme — que me acompanha em todas essas versões.
Ela não é tendência. É identidade. Me permite brincar com possibilidades sem me desconectar da essência.
Porque vestir-se, pra mim, é isso: ser leal a quem você é — mesmo quando o mundo tenta te vestir com outra narrativa.
Escolher o básico como ato de liberdade
O estilo mora nas peças que você usa mesmo quando não tem ninguém olhando. Na roupa que te veste nos dias difíceis. No básico que você repete com prazer.
Hoje, gosto de moda. Gosto de referências. Mas gosto mais ainda da minha paz. E se pra ter isso eu precisar me afastar um pouco da tela e me aproximar mais do espelho — que assim seja.
Não quero só me vestir bem. Quero me vestir de mim.
O que dizem os estudos sobre isso
Anja Aronowsky Cronberg, editora da Vestoj, alerta sobre o impacto da repetição estética nas redes, que dilui a autenticidade individual.
Estudos de comportamento em moda digital mostram que o excesso de exposição a conteúdos visuais interfere na autonomia de estilo, gerando confusão entre desejo real e influência externa.
Psicólogos da moda afirmam que a roupa que mais nos representa emocionalmente tende a resistir às tendências e ao tempo.
Estilo é saber silenciar o algoritmo e ouvir o que seu corpo — e sua alma — querem dizer.
– b. monma
✦ Fim do módulo: Moda, identidade e consumo. No próximo módulo: “Infância, herança e o agora”.
Já comprei por impulso, já me vesti pra caber. Mas hoje, só fica no meu corpo o que me veste por dentro.
Meu guarda-roupa já foi território de guerra entre o que eu era, o que queriam que eu fosse e o que eu tentava descobrir. Já transbordou de roupas que não tinham nada a ver comigo — mas que estavam na moda. Ou em liquidação. Ou na fase em que eu só queria me reencontrar em alguma arara qualquer.
Hoje, ele continua cheio — seria hipocrisia negar. Eu amo moda. Meu maior gasto é com roupa. Mas aprendi que o estilo não está na quantidade. Está no que permanece depois da limpeza.
É no meio do excesso que a gente aprende a escolher. E estilo é isso: saber voltar pra casa mesmo depois de se perder um pouco.
Quando o excesso revela um vazio
Já comprei peça que nunca usei. Várias. Dei embora com etiqueta. E percebi que toda compra por impulso vinha de uma tentativa de preencher alguma ausência — de mim em mim.
Segundo a estilista e consultora de moda sustentável Vivienne Westwood, “compremos menos, escolhemos melhor e façamos durar.” Parece simples, mas é revolucionário.
Hoje, eu só fico com o que me representa — mesmo que seja velho, básico ou repetido. Porque quando a alma tá confortável, o look sempre funciona.
Desapegar com afeto
Fiz as pazes com o desapego. Tirei do armário as roupas que já não carregavam minha energia, que prendiam uma versão antiga de mim ou que traziam lembranças pesadas.
Mas também deixei peças eternas — aquelas que me lembram de onde vim. A calça jeans larga e de cintura baixa, por exemplo: me veste em qualquer versão. Ela sustenta sem gritar. Firme, mas livre. Como eu quero ser agora.
Desapegar, pra mim, não é sobre ter pouco. É sobre ter o que faz sentido.
Moda como tradução emocional
Hoje eu me visto pra mim. Meu estilo é o equilíbrio entre o sofisticado e o despojado. Gosto do corte certo, do tecido bom, da peça que não precisa chamar atenção — mas que segura minha energia o dia inteiro.
Pra mim, ter estilo é quando até o básico diz: “isso sou eu.”
Porque no fim, não é sobre colecionar roupas. É sobre não se perder de si entre as vitrines.
O que dizem os estudos sobre isso
Carolyn Mair, psicóloga da moda, afirma que nossas roupas afetam diretamente nossa tomada de decisões, autoestima e segurança emocional.
Vivienne Westwood, referência em consumo consciente, defende que menos é mais — desde que tenha intenção e qualidade.
Estudos de comportamento de consumo indicam que quanto mais alinhada a peça está com nossa identidade emocional, mais duradoura ela se torna em nosso guarda-roupa.
Vestir-se bem é, antes de tudo, uma forma de se lembrar de quem você é.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Entre o look e o loop: ainda sei me vestir sem o algoritmo?” Sobre moda, algoritmo, confusão estética e o desejo de voltar a escolher sem depender da aprovação alheia.
Às vezes, a gente guarda uma peça não pelo corte, mas pelo que ela costurou na alma. Porque tem roupa que não veste — acolhe.
Tem roupas que não servem mais no corpo, mas ainda moram em algum lugar entre o peito e o estômago. Como aquele jeans presente do meu avô. Não entra mais na cintura, mas ainda cabe nas lembranças. E não tem espaço de armário que tire isso de mim.
Tem peças que são quase oração: você coloca e sente que algo te protege. Outras são como agouro — sempre que eu usava, algo ruim acontecia. Aprendi a escutar até o tecido.
Tem roupa que segura o corpo. Tem roupa que segura a alma.
O vestido que me moldou
O mais marcante? O vestido da minha formatura. Não sei se foi o tecido ou o tempo. Só sei que naquele dia, eu me olhei no espelho e reconheci uma mulher que estava se formando não só no diploma, mas em coragem.
A roupa não era só bonita. Era simbólica. Era ritual. Era começo de alguma coisa — mesmo que eu ainda não soubesse o quê.
A roupa certa não é a mais cara. É a que conversa com o momento que você está vivendo.
Uniformes da alma
Tenho uma calça jeans cintura baixa, bem larga, que me acompanha em fases opostas: dias de tênis e moletom, e dias de salto e camisa estruturada. Ela me faz sentir invencível. Tipo aquelas roupas que se moldam ao humor, ao caos, ao salto do dia.
E quando nada mais serve — nem o ânimo, nem o clima, nem a criatividade — tem sempre aquela peça velhinha que não falha. Aquela que já sabe os caminhos do meu corpo e não exige esforço nenhum pra funcionar.
São roupas que não aparecem nos stories, mas seguram a narrativa toda.
Desapegos, fases e eternidades
Meu guarda-roupa tem capítulos. Algumas peças vão embora sem drama. Outras, ficam. Clássicos que me acompanham feito boas ideias: não saem de moda, nem da minha identidade.
Sim, já deixei de usar algo por medo do que iam pensar. E me arrependi. Porque o que veste a alma nunca deveria ser censurado.
Moda, pra mim, sempre foi mais sensação do que tendência. Quando me sinto bem, me visto bem. E quando me visto bem, me lembro de quem sou.
O que dizem os estudos sobre isso
Psicologia da moda: Segundo a psicóloga Carolyn Mair, autora de “The Psychology of Fashion”, nossas roupas afetam diretamente nosso humor, autoestima e a forma como nos percebemos e nos comportamos.
Memória afetiva: A antropóloga Sophie Woodward, em seu livro “Why Women Wear What They Do”, afirma que muitas mulheres mantêm roupas por anos pelo valor simbólico — mais do que pela função prática.
Consumo e identidade: Pesquisas em comportamento do consumidor indicam que o guarda-roupa funciona como um “diário afetivo”, refletindo fases de vida, rupturas e escolhas emocionais.
Ou seja: a moda não é fútil quando nos veste por dentro.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Ter menos, ser mais — a moda além da vitrine.” Sobre o minimalismo emocional e o estilo como reflexo de escolhas, não acúmulos.
Empreender, pra mim, não é só sobre vender. É sobre sobreviver.
Eu achava que o mais difícil seria montar CNPJ, entender imposto, negociar com fornecedor, tentar fazer o cliente entender que picanha não é filé mignon. Achava que o terror viria em forma de boleto. Boba eu.
O verdadeiro filme de terror tem nome: gestão de pessoas.
E olha que ironia… Quando eu fazia Direito — sim, fiz dois anos e meio acreditando que ia mudar o mundo com uma boa petição inicial — eu achava a área trabalhista uma das mais injustas. Hoje eu me pergunto: injusta pra quem mesmo?
Talvez injusta pra quem contratou com toda a fé no ser humano e acabou levando calote de horário, desvio de função, e de brinde ainda virou vilã da história. Porque aqui é assim: você dá uniforme, dá confiança, dá feedback, dá oportunidade — e quando vê, tá tomando no CPF.
Mas o que pega mesmo, o que me esgota, é que eu sou empática. INFJ, obrigada. Do tipo que tenta entender o que o outro tá sentindo antes mesmo dele saber. Do tipo que escuta um “bom dia” meio torto e já pensa: será que ele tá bem? será que dormiu mal? será que odeia o trabalho, a vida, ou só a minha cara mesmo?
E aí você tenta. Chama pra conversar, fala com jeito, oferece ajuda, ajusta horário, tenta equilibrar justiça e empatia como se tivesse num tribunal de ética invisível. Mas basta acessar as câmeras, e adivinha? Pega diálogos surreais dignos de novela das seis:
“Aqui ninguém faz nada direito.” “Patroa nem aparece.” “Fulano é puxa-saco, só se dá bem por causa disso.” “A empresa é uma bagunça.”
E é nessa hora que você respira fundo. Porque no dia seguinte você vai estar lá. Com a energia no talo. Cumprimentando um por um, sorrindo com os olhos, como se não tivesse escutado absolutamente nada. Porque, infelizmente (ou felizmente?), você não nasceu com aquele chip da indiferença.
Você quer fazer dar certo. Quer um ambiente bom. Quer que todo mundo cresça junto. Mas tem dia que dá vontade de gritar: me contratem como funcionária, por favor?
Empreender, no fim, é isso: Ser acusada de “dura demais” por quem não cumpre horário. Ser chamada de “boazinha demais” por quem quer sangue. E continuar ali, tentando o equilíbrio impossível entre ser justa e não enlouquecer.
Mas seguimos. Com fé em Deus, na CLT e em uma câmera que grava o som ambiente.
A Frances me ensinou isso — ou talvez só tenha colocado em palavras aquilo que eu já vivia em silêncio.
Quem nunca?
Quem nunca se olhou no espelho e pensou: “E agora?”
Quem nunca achou que estava atrasada, que todo mundo tinha um plano, uma rota, um endereço certo… menos você?
Eu já me senti assim muitas vezes.
E a forma que encontrei de não me afogar foi rezar. Orar. Expandir a consciência até perceber que a vida não é uma linha reta, mas um mapa cheio de desvios.
Me conhecer foi o único GPS que funcionou até agora.
Minha cena favorita é quando a Frances descreve aquele momento único:
quando você e a pessoa que você ama estão no mesmo ambiente, em lugares diferentes, e se olham — não por ciúmes, não por posse, mas porque simplesmente é a sua pessoa no mundo.
Essa cena me encolhe e me expande ao mesmo tempo.
Porque é tão simples, e tão raro.
E sim, eu também danço no caos.
Tropeço, perco o ritmo, mas sigo.
Às vezes rio, às vezes choro, mas sempre me movimento — porque parar é morrer em câmera lenta.
Na vida adulta, a gente descobre que perde pessoas não por falta de amor, mas por conflito de agendas.
Você ama, mas não cabe.
Você se importa, mas não dá tempo.
E então entende que o carinho pode continuar mesmo que a rotina não continue junto.
Não deixei Deus. Só saí do lugar onde esperavam que eu me vestisse, falasse e orasse igual todo mundo. Minha fé continua — só encontrou outro caminho.
Já me sentei em bancos de igreja sentindo que era pecado só por estar cansada. Já orei com culpa. Já me questionei por duvidar. Já chorei achando que minha fé não era suficiente.
Hoje eu sei: Deus não mora num prédio. Mora onde eu me ajoelho — mesmo que só por dentro.
Não sou contra templos. Sou contra prisões espirituais. E tem gente sendo mais fiel no silêncio do quarto do que em reuniões de domingo.
A fé que ficou, mesmo depois da fuga
Segundo dados do Datafolha (2022), cresceu significativamente o número de pessoas que se declaram “sem religião” no Brasil — mas a maioria delas ainda acredita em Deus, ora e busca algum tipo de espiritualidade.
Essa geração não deixou de crer. Só cansou de se moldar. Só cansou de ouvir que Deus só ouve quem fala a língua certa.
Não perdi a fé. Perdi o medo de vivê-la do meu jeito.
Talvez a minha espiritualidade não tenha nome. Mas tem frutos. E pra mim, isso basta.
A culpa não mora mais aqui
Eu parei de tentar merecer o amor de Deus. Porque Ele nunca colocou condição. A religião colocou. A tradição colocou. O medo colocou. Mas Ele, não.
Hoje, minha fé não é sobre ter todas as respostas — é sobre permanecer mesmo com as perguntas.
É sobre confiar quando tudo parece em silêncio. É sobre andar com Ele sem precisar provar nada pra ninguém.
Fé não precisa de testemunha. Só de verdade.
Talvez eu não esteja nas fileiras da igreja. Mas continuo na fila da esperança. Continuo ajoelhada em pensamento. Continuo firme nas orações que ninguém ouve.
Minha fé ainda vive. Só mudou de endereço.
– b. monma
✦ No próximo módulo: “Moda, identidade e consumo” A estética como espelho e como armadura.
Outro dia, me peguei pensando: e se a gente pudesse escrever pra se curar?
Não como uma obrigação de ser escritora. Mas como um respiro. Como uma carta que ninguém vai cobrar, uma lembrança que ninguém precisa entender. Como uma forma de existir — mesmo que em pedaços.
Tenho recebido mensagens de gente que se identificou com o Entre Gerações, com as crônicas do agora, com esse caos todo que às vezes transborda em palavras.
E pensei: será que faria sentido criar um espaço onde a gente pudesse escrever junto?
Estou rascunhando um projeto que mistura escrita afetiva, escuta ativa, rodas de conversa e oficinas — algo que conecte pré-adolescentes, mães, filhas, filhos, mulheres em transição, jovens que não se sentem mais tão jovens assim.
Queria criar algo real: – que fosse pra dentro, mas também coletivo – que pudesse chegar em escolas, espaços culturais, ONGs – que se transformasse em livro, e-book, talvez até numa exposição de palavras
Mas antes de seguir, queria perguntar:
Você participaria?
Você se interessaria por um projeto assim? Você conhece alguém que precisa escrever e não sabe por onde começar? Você acha que isso pode tocar alguém que está tentando sobreviver em silêncio?
Pode responder aqui nos comentários ou me mandar mensagem. Quero muito ouvir vocês — porque, no fim das contas, talvez a gente só queira ser escutado.
– b. monma
📋 Enquete rápida
Esse projeto tocou você?
a) Eu participaria b) Conheço alguém que amaria c) Quero indicar pra uma escola/ONG d) Me emocionei só de ler e) Tenho uma ideia pra somar
Deixe sua resposta nos comentários ou me chame nas redes. Cada palavra sua me ajuda a construir isso com verdade.
Me disseram que eu precisava escolher entre a cruz e o mapa astral. Mas no fundo, eu sabia: Deus sempre habitou onde minha intuição sentia paz.
Tem gente que encontra Deus na igreja, outros no mar, no incenso, no louvor, no mantra. E tem gente — como eu — que encontra Ele no meio do caos, entre um suspiro e outro, no silêncio onde tudo parece confuso, mas Ele ainda permanece.
Fui criada ouvindo versículos. Depois, li sobre signos. Frequentei cultos e também mergulhei em mapas astrais, chakras e ciclos lunares. Tentei entender o céu — e acabei voltando pra dentro.
Hoje, eu sou templo. E onde eu estiver inteira, Deus também está.
A espiritualidade sem muros
Segundo dados do Pew Research Center, cresce no mundo todo o número de pessoas que se consideram “espirituais, mas não religiosas”. E não se trata de rebeldia — mas de uma fé mais sensível, intuitiva, que não cabe em doutrina, mas vive em prática.
É a geração que ora, mas também medita. Que lê a Bíblia, mas acende vela. Que não nega Jesus — mas entende que Ele pode falar através de um pôr do sol, de uma música ou de um versículo aberto no susto.
Fé não é fórmula. É relação. E todo mundo encontra Deus onde sente verdade.
Não é sobre rótulo. É sobre presença.
Cansei de pedir licença pra crer do meu jeito. De me justificar por não seguir o modelo pronto. De duvidar da minha fé só porque ela não é igual à dos outros.
Minha oração é espontânea. Minha fé, cheia de camadas.
Mas uma coisa eu sei: Deus sempre foi mais livre do que as regras que inventaram sobre Ele.
Eu sou o templo. E cuido de mim como um altar.
Se meu corpo é templo, minha alma é oração. Meus ciclos também são sagrados. Meus dons, também são revelação. Meus silêncios, também são louvor.
Hoje, eu não preciso escolher entre a Bíblia e a astrologia. Porque o que me guia não é o medo — é a paz.
E onde houver paz, ali eu fico. Ali Deus está.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “A geração que acredita, mas não frequenta.” Sobre os filhos da fé que saíram dos templos, mas não abandonaram Deus.
O mundo inteiro quer prever o que eu gosto. Mas só Deus entende o que eu preciso — mesmo quando eu não sei explicar.
O TikTok me entrega o vídeo certo. O Instagram me mostra frases que parecem ter sido escritas pra mim. O algoritmo me conhece — mas não me cura.
Deus, por outro lado, não precisa de minhas buscas pra saber o que dói. Ele lê o que eu escondo. Ele entende o que nem eu entendo. Ele aparece nas entrelinhas, nos silêncios, nas pausas entre um pensamento e outro.
Enquanto os algoritmos tentam me prever, Deus só me pede presença.
Presença, não performance
O mundo me ensina a parecer forte. A manter a estética da paz. A mostrar a versão editada da fé. Mas com Deus, não tem filtro. Não tem pose. Não tem legenda pronta.
Com Deus, eu choro feio. Eu falo sem lógica. Eu falo calada. Eu falo deitada. E Ele entende.
A oração mais sincera da minha vida talvez tenha sido um suspiro. E Ele ouviu.
Porque Deus não se ofende com a minha bagunça. Ele entra nela. E permanece.
Enquanto o mundo me analisa, Ele me acolhe
Os algoritmos tentam adivinhar meu próximo passo. Me mostram o que parece fazer sentido com base no que cliquei, segui, desejei.
Mas tem coisas que eu não procurei — e que só Deus me entregou.
Tem respostas que não vieram no Google. Tem abraços que chegaram sem mensagem. Tem livramentos que eu nem soube que aconteceram. Só sei que Ele tava lá.
Ele me lê por dentro. E ainda assim me ama.
Meu código é a fé
Não importa quantos dados o mundo colete sobre mim. Nenhum deles consegue acessar o lugar onde Deus e eu conversamos baixinho.
Meu código é a fé. Minha senha é a esperança. Meu backup é o céu.
Enquanto o mundo calcula, Deus cuida. Enquanto eu me perco nos ruídos, Ele me chama pelo nome.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “A nova fé: entre a astrologia e a Bíblia, eu sou o templo.” Sobre a espiritualidade híbrida da geração que busca sentido em todos os lugares — e finalmente começa a olhar pra dentro.
Mas não daquelas férias cheias de roteiro e expectativa, que você volta mais cansada do que foi. Sucesso, pra mim, é viagem onde eu não tenho pressão pra fazer absolutamente nada. Onde posso acordar sem despertador, caminhar sem rumo, comer quando sentir fome e não quando o relógio manda. Onde posso ser só eu, sem nenhuma obrigação social além de existir.
Seria perfeito ter uma vida que me permitisse ganhar dinheiro fazendo o que amo e ainda viajar muito. Escrever meus textos, criar coisas que saem do coração, e bancar não só as contas — mas também as passagens, os hotéis pé na areia, as taças de vinho ao entardecer olhando o mar.
E tem um detalhe que me faz rir sozinha de tão bobo, mas tão verdadeiro: acordar e estar viva já é, na maioria dos dias, o maior sucesso que consigo conceber. Só o fato de abrir o olho, respirar e pensar “tenho mais um dia pra tentar de novo” já deveria render um troféu. Embora, pra ser honesta, nem sempre é assim. Tem dias que só acordar já parece um desafio olímpico, e tudo bem também.
A ciência até endossa isso: estudos da Harvard Business Review apontam que pessoas que priorizam experiências (como viagens) ao invés de bens materiais têm níveis mais altos de satisfação de vida. E tem pesquisa publicada no Journal of Positive Psychology mostrando que pequenos momentos de apreciação — tipo tomar um café devagar ou caminhar sem rumo num lugar bonito — são tão poderosos quanto grandes conquistas pra sensação de felicidade.
Então talvez sucesso seja isso: um dia normal, sem grandes enredos, mas com a paz interna de quem acordou, respirou fundo e pensou “hoje tá tudo mais ou menos bem”.
Porque às vezes é só isso que a gente precisa pra se sentir absurdamente bem-sucedida.
Não é que a fé tenha sumido. Mas ultimamente, ela tem aparecido demais — em frases prontas, fundos bege e versículos com fonte cursiva.
Hoje em dia, Deus está em todos os stories. Em legendas de look do dia, em vídeos com trilha sonora emocional, em bio de perfil com emoji de cruz.
Mas entre uma postagem e outra, me pergunto: onde Ele realmente habita?
Porque às vezes parece que Deus virou estética. Um tipo de branding espiritual. Um filtro que melhora a imagem — mas não alcança a alma.
Fé performada, espiritualidade vazia
Segundo um levantamento da Barna Research Group, há um aumento expressivo na geração que se define como “espiritual, mas não religiosa”. Porém, essa espiritualidade, muitas vezes, é consumida em pílulas de autoajuda e conteúdo viral.
É a fé de carrossel. Rápida. Bonita. Mas sem raiz. Sem chão. Sem silêncio.
É possível citar Deus sem nunca orar. Compartilhar versículos sem nunca ouvir.
Existe uma diferença entre falar sobre o divino e se encontrar com Ele no escuro do quarto, quando ninguém tá vendo. Ali, não tem filtro. Não tem estética. Só verdade.
Espiritualidade não é marketing
Falar de Deus não é tendência. É entrega. E entrega exige renúncia, presença, transformação.
Deus não se encaixa em algoritmo. Ele se manifesta no tempo escondido, no coração que se dobra, na oração que ninguém curte — mas que muda tudo.
É sobre viver fé, não só postar fé. Sentir Deus, não só citar Ele.
O silêncio como templo
Hoje, talvez eu não poste nenhum versículo. Mas vou conversar com Deus no banho. No caminho. No cansaço. No meu caos sincero.
Porque minha fé não é carrossel. É carne. É cicatriz. É esperança de que o invisível ainda sustente o que os olhos não veem.
Que a gente volte a orar mais do que compartilhar. Que Deus volte a ser morada — e não vitrine.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Deus me lê melhor que os algoritmos.” Uma oração disfarçada de texto sobre presença, intuição e cuidado divino no caos do mundo moderno.
Respondemos mensagens o dia inteiro, mas evitamos olhar nos próprios olhos. A tela virou diálogo. O espelho, confronto.
Estamos cercados de conexões, mas cada vez mais distantes da gente mesmo. Conversamos com vozes, figurinhas, directs, emojis. Mas quando passamos pelo espelho, desviamos o olhar.
Porque o espelho não filtra. Não suaviza. Não ilude. Ele mostra. E a gente anda com medo de se ver de verdade.
Somos a geração que escuta todos os áudios — menos os da própria alma.
Afeto terceirizado, presença ausente
Estudos da APA (Associação Americana de Psicologia) mostram que o uso exagerado de telas tem gerado um aumento drástico em quadros de depressão, ansiedade e perda de identidade — especialmente entre jovens adultos.
A hiperconectividade criou uma ilusão de afeto constante. Mas nada substitui um olhar inteiro. Um toque real. Uma presença não mediada por wi-fi.
Curtimos o outro, mas evitamos curtir a própria companhia.
Fugimos do silêncio como se ele gritasse algo que não estamos prontos pra ouvir. E talvez grite mesmo.
O espelho é mais honesto que a notificação
O feed pode mentir. O espelho, não. Ele mostra a bagunça no olhar, o cansaço na pele, o nó que a gente tenta esconder por trás de filtros.
E é nesse confronto que às vezes nasce a cura. Quando você para de correr da imagem real — e começa a olhar pra si como quem acolhe.
Porque se amar é se ver. E se ver de verdade nem sempre é bonito, mas sempre é necessário.
O que ainda não postei — mas preciso viver
Quero menos tempo de tela e mais tempo de pele. Quero me escutar sem fone. Me enxergar sem ângulo. Me aceitar sem pose.
Quero conversar com o espelho. Com Deus. Comigo.
Porque se eu não me encontro aqui, nenhum outro lugar vai me caber inteiro.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Até Deus virou conteúdo: espiritualidade em carrossel.” Um olhar crítico e poético sobre a fé que virou estética digital.
Postei uma selfie, uma frase bonita e uma música que parecia dizer tudo. Mas quando desliguei a tela, percebi: eu continuava sumida de mim.
A gente compartilha, responde, edita, escreve “tô bem” e sorri no story. Mas quantas vezes já postou algo esperando que alguém percebesse que era um pedido de socorro bonito?
O feed tá cheio de versões de nós. Mas e a versão que não performa? Aquela que só quer existir sem justificar? Ela cabe onde?
Postei e fui aplaudida. Mas não me encontrei.
A performance do “tô bem”
Segundo um estudo da Royal Society for Public Health (UK), o uso intenso de redes sociais está diretamente ligado ao aumento de ansiedade, depressão e sensação de inadequação entre jovens — especialmente mulheres.
Porque a internet é um palco. E mesmo quando você diz que tá sendo real, ainda há um enquadramento, uma curadoria, um filtro invisível.
A rede é social. Mas o que ela tem criado é um silêncio interno coletivo.
Publicamos presença, mas estamos ausentes de nós. Falamos com todos, menos com a gente.
Sumir um pouco pra se encontrar de verdade
Às vezes, o que mais precisamos não é de engajamento. É de um silêncio honesto. De uma tarde offline. De um mergulho em nós mesmas sem precisar postar legenda depois.
Talvez o mundo não precise saber de tudo. Talvez a cura venha quando deixamos de nos explicar. Quando voltamos a escrever pra dentro — e não só pros outros.
Sumir um pouco não é egoísmo. É autocuidado. É retorno. É reinício.
Eu não sou o que eu posto. Eu sou o que eu silencio.
Me perdi tentando agradar. Tentando parecer forte. Tentando “manter a estética”. Mas minha alma não cabe em moldura. Meu silêncio diz mais que meu feed.
Hoje eu prefiro sumir da internet e me reencontrar no travesseiro. Prefiro não postar nada — mas dormir em paz.
Porque às vezes, o que a gente mais precisa… é voltar a ser só gente.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “A geração que conversa com a tela, mas não com o espelho.” Sobre o vazio afetivo da era da superexposição.
Sinto isso o tempo todo. Talvez seja a saudade da leveza despreocupada da juventude. De chegar em casa e ter comida pronta, roupa lavada, boletos inexistentes e dramas limitados a “será que ele vai me mandar mensagem?”. Tanto a infância quanto a adolescência eram mais leves — e não é papo de romantizar, é só constatação biológica: naquela época, o cérebro da gente ainda não tava completamente desenvolvido pra sentir o peso de tudo.
Tem estudo da University College London mostrando que o córtex pré-frontal (aquele responsável por planejamento, controle de impulso, decisões complexas) só termina de se consolidar entre os 25 e 30 anos. Antes disso, a gente vive meio no piloto automático das emoções, o que torna a vida confusamente feliz, mesmo cheia de mini tragédias adolescentes.
Hoje, adulta, bancando minhas contas e lavando minha própria calcinha, vejo o quanto a gente só dá valor pros nossos pais quando cresce. Quando sai de casa e percebe que papel higiênico não brota no armário, que supermercado suga o salário, que ninguém acorda cedo pra preparar teu café. Aí as dores da vida adulta ficam tão gritantes que o que antes era só “vida normal” agora parece quase mágico. Me dá uma saudade tão doída que às vezes choro, às vezes durmo pra ver se passa, às vezes escrevo pra não explodir, às vezes gasto dinheiro em coisas que não preciso só pra sentir um micro-prazer imediato.
Tem um termo na psicologia chamado nostalgia homeostática — é tipo quando o cérebro puxa memórias boas do passado pra compensar um presente estressante. Um artigo no Current Opinion in Psychology explica que esse “passeio mental” pro passado é um mecanismo de autorregulação emocional. Em outras palavras: a gente idealiza o que foi pra aguentar o que é.
O problema é que dá vontade de voltar pra um lugar que não existe mais. Que nunca mais vai existir. A tal da infância com cheiro de bolo no forno, o colo sem culpa, a despreocupação genuína. “Que tempo bom que não volta nunca mais”, como canta o Milton.
Mas no fim, talvez crescer seja isso: fazer as pazes com a solidão de ser adulto, com a falta do que ficou lá atrás, e tentar encontrar pequenas alegrias no agora — por mais que elas venham disfarçadas de boleto pago ou cama arrumada por nós mesmos. Porque se depender da vida, ela não vai parar pra perguntar se a gente tá pronto.
Eu não lembro exatamente quando vi O Casamento do Meu Melhor Amigo pela primeira vez. Mas sei que foi com a minha mãe. E sei que foi só a primeira de muitas. Vi tantas vezes que o roteiro virou memória afetiva, e a Julia Roberts virou quase amiga íntima, com aquele sorriso que esconde o que sente, como quem segura o amor nos dentes.
A Julianne nunca foi exatamente eu, mas me emociona como se fosse. Talvez porque eu entenda o que é chegar tarde demais. Ou pior: o que é nunca ter tido coragem de chegar.
Eu já amei em silêncio. Por orgulho, por medo, por não saber que o sentimento era prioridade.
Mas a verdade é que o amor tem prazo. Existe um timing sutil, quase invisível, que, quando passa, vira lenda. Porque a gente muda. O outro muda. E aquilo que poderia ter sido, se torna um “e se” bonito demais pra ser realidade. Quase um futuro que ficou no passado.
A cena do barco sempre me faz encolher por dentro. Eles dançam como se ainda houvesse tempo. Mas a música já está acabando. E mesmo assim, é bonita. É como se ela soubesse que vai perdê-lo, mas escolhe perder com elegância. Isso me toca. Porque desistir por amor é a mais silenciosa das coragens.
Já fui quase. E ser quase é mais perigoso do que ser qualquer coisa concreta. Porque o quase é editado pela nostalgia. Só ficam os melhores trechos. Os defeitos a gente nunca teve tempo de conhecer.
Mas amar, de verdade, não tem a ver com posse. Tem a ver com nobreza. Com saber a hora de não ser. Com entender que o final feliz pode ser do outro, e mesmo assim te emocionar.
E quando todo mundo canta no jantar de ensaio, e quando ela dança com o amigo gay — aquele amigo que entende sem dizer, que segura a dor com humor, que é farol quando tudo escurece —, eu penso: que sorte é ter quem fique, mesmo quando o amor vai.
Talvez esse filme me emocione tanto porque fala exatamente disso: do que ficou depois que não ficou. De um amor que não aconteceu, mas que mesmo assim deixou marca.
E talvez seja por isso que eu o tenha visto tantas vezes. Porque a gente insiste em rever aquilo que, no fundo, queria viver diferente.
Crônicas do Agora: A mulher que cansou de se calar
Ela não grita. Mas também não abaixa mais a cabeça. O silêncio que antes era medo agora é escolha. E a fala, liberdade.
Ela sempre foi educada. Boazinha. Daquelas que se desculpam por existir um pouco demais. Que diziam “tudo bem” até quando doía. Que engoliam choro, engoliam raiva, engoliam o próprio nome.
Até que um dia, não coube mais. Nem ela dentro de si. Nem os outros sobre ela. E foi ali, na beira da exaustão emocional, que nasceu outra mulher: a que não se cala mais.
Não porque aprendeu a gritar. Mas porque entendeu que a própria existência já é barulho suficiente.
O preço do silêncio feminino
Não é de hoje que as mulheres são ensinadas a se calar. Desde pequenas, aprendemos que “menina bonita é comportada”. Que “não pode responder”. Que “não fica brava”. Que “fala baixo”.
Esse tipo de educação cria mulheres que se cortam em pedaços pra caber nos moldes dos outros — e depois não entendem por que se sentem vazias.
“Ensinaram-nos a engolir o grito, e agora confundem a nossa dor com delicadeza.” – Christiane Gomes
O silêncio feminino não é natural. É condicionado. E a cura vem quando ele deixa de ser obrigação e passa a ser escolha — uma pausa consciente, não uma submissão disfarçada de doçura.
A nova coragem é se posicionar
Hoje, mais do que nunca, é urgente que mulheres se expressem. Com palavras. Com escolhas. Com o corpo. Com os “nãos” que não precisam mais ser explicados.
Porque o mundo ainda chama de “difícil” a mulher que ousa se posicionar. Mas difícil mesmo é viver se anulando.
Ela cansou de agradar. De recuar. De engolir seco. E agora, a fala dela vem com borda, com voz, com verdade. E quem não sabe ouvir, que se afaste.
Liberdade não é gritaria. É inteireza.
Ela não precisa provar mais nada. Nem ser amada por todos. Nem ser compreendida sempre. Mas precisa, sim, ser inteira.
Inteira pra errar. Pra mudar de ideia. Pra chorar no meio da reunião. Pra sair de um relacionamento que já não cabe. Pra dizer que não aguenta. Pra gritar se quiser. Pra silenciar se precisar.
Ela não se cala mais. Porque sua voz é lugar. É casa. É espelho. É herança pra quem vier depois.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Postei e não me encontrei.” Sobre a ilusão da presença digital e a ausência emocional de si mesma.
Nem toda revolução faz barulho. Algumas andam de biquíni na beira do rio e se recusam a se odiar em frente ao espelho.
Nos ensinaram a se esconder. A encolher a barriga. A cruzar os braços. A usar roupa preta pra “emagrecer visualmente”.
Mas ninguém falou como é se olhar no espelho e não sentir ódio. Ninguém ensinou a habitar o corpo — só a controlar, punir, esculpir.
Por isso, hoje, vestir o corpo que se tem é um ato político. Um tipo de coragem que nem sempre é vista, mas sempre é sentida.
A ditadura do retoque invisível
Na era dos filtros suaves, do corpo “naturalmente esculpido” e das “imperfeições estrategicamente perfeitas”, a verdade virou afronta.
Segundo um estudo da Dove (The Real Beauty Report), 84% das mulheres brasileiras se sentem pressionadas a atender aos padrões de beleza irreais. E mais da metade já deixou de postar algo por vergonha da própria aparência.
Isso não é sobre estética. É sobre liberdade.
O corpo virou vitrine. Mas eu ainda quero que ele seja lar.
Reaprender a se habitar
O corpo real tem marcas. Tem dobras. Tem memória. Ele registra tudo o que a alma viveu e o que o mundo tentou apagar.
E talvez seja hora de reaprender a morar nele — sem precisar se punir, esconder ou justificar.
Mostrar a barriga sem tensão. A celulite sem desculpa. O olhar sem medo. Tudo isso é um tipo de revolução suave.
Sou mais do que medida, sou presença
Não quero mais perder tempo odiando meu reflexo. O mundo já me diminui tanto. Não vou fazer isso comigo mesma também.
Meu corpo não é rascunho. Nem projeto. Nem promessa. Ele já é. E isso basta.
Me amar no corpo que tenho — e não no que prometeram que eu teria — é meu novo protesto.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “A mulher que cansou de se calar.” Porque o silêncio sempre teve um preço. E a voz, um destino.
Antes de sair pra vida, eu me visto pra mim. O espelho é meu primeiro abraço — ou meu primeiro enfrentamento.
Nem toda vaidade é vazia. Algumas são refúgio. Outras, armadura. Algumas vêm da autoestima. Outras, da necessidade de lembrar quem se é — quando o mundo tenta fazer esquecer.
Tem dias que a roupa me veste. Tem outros que é ela que me salva. O batom vermelho já me curou da apatia. O brinco dourado já me resgatou da invisibilidade.
O espelho sabe das coisas. Ele vê antes de todo mundo. Vê a lágrima que secou. Vê o rímel borrado por dentro. Vê a mulher que precisa se lembrar de si.
Moda como linguagem emocional
A psicologia das cores, da forma e da estética mostra que o vestir não é só aparência: é comunicação emocional. Segundo a pesquisadora Karen Pine, autora de “Mind What You Wear”, a roupa tem poder direto sobre o comportamento, a confiança e até a postura da pessoa.
Ou seja, o que você veste altera quem você é — mesmo que só por algumas horas. Mas o melhor: também pode lembrar quem você foi.
Tem peças que são como memória viva. A gente veste e lembra de quem estava se tornando.
Isso também é vaidade. Mas é vaidade com alma. Com intenção. Com propósito.
Estilo como território de cura
Já vesti roupas que me diminuíam. Já tentei caber em estéticas que não me acolhiam. Já segui tendências que me apagavam em nome da aceitação.
Mas hoje, eu quero vestir o que me devolve. O que me abraça. O que conversa com minha nova fase. O que combina mais com minha paz do que com meu feed.
O estilo é uma forma de marcar território no mundo — mesmo que o mundo nem esteja olhando.
O espelho como oráculo
Talvez a pergunta nunca tenha sido “com que roupa eu vou?” — mas sim: “o que essa roupa diz sobre mim?”
Não me arrumo mais pra impressionar. Me arrumo pra lembrar. De quem sou. Do que mereço. Do que não aceito mais.
O espelho continua ali, me vendo primeiro. E agora, ele sorri de volta.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “O corpo real como rebelião silenciosa.” Porque amar o próprio reflexo é o novo ato de resistência.
Sério. Nem eu, nem você, nem aquele teu conhecido que parece ter a vida perfeita no Instagram. No fundo, tá todo mundo improvisando. Uns mais desastrados, outros melhores na arte de fingir.
Eu, por exemplo, já dei o maior mico da história recentemente: dei tchau pra alguém que não tava dando tchau pra mim. E fiquei lá, com a mão semi-erguida no ar, tentando disfarçar o constrangimento do meu próprio fracasso social. Parecia idiota, e foi mesmo. Mas quer saber? No dia seguinte, ninguém mais lembrava — só eu, claro, repassando a cena dez vezes antes de dormir.
Também tenho o péssimo hábito de surtar com quem eu amo só por achismos. Crio roteiros inteiros na minha cabeça, dignos de série dramática, e depois descubro que nem era nada daquilo. A pessoa tava só cansada, ou distraída, ou pensando no preço do tomate, sei lá. E eu lá, ensaiando discursos indignados no chuveiro.
Me comparo com tudo e todos. Às vezes até com a vizinha que nem conheço, só porque ela passou de roupa de ginástica e eu tava de moletom velho. Mas tenho tentado me policiar. Sabe por quê? Porque vi um estudo publicado no Journal of Personality and Social Psychology mostrando que a maioria das pessoas superestima o quanto os outros prestam atenção nelas. Chama-se spotlight effect — a sensação de que o mundo inteiro tá reparando em cada detalhe seu, quando na real todo mundo tá ocupado demais pensando nas próprias crises existenciais.
Também tem a ilusão da transparência, outro fenômeno psicológico: a gente acha que todo mundo percebe nossas inseguranças, mas na prática, ninguém tá vendo nada. Tá cada um lidando com seu próprio caos interno, suas próprias paranoias, seus próprios “e se”.
Então, pegando emprestado meu tom INFJ de autoajuda meio torta: pega leve com você.
Vai dar mico, vai ter surto baseado em teoria errada, vai se comparar com quem não deveria. Mas lembra: ninguém tá imune. Ninguém sabe exatamente o que tá fazendo. Tamo todo mundo só tentando não tropeçar — ou pelo menos tropeçar com alguma dignidade.
Tem gente que passa na nossa vida só pra nos ensinar a continuar sem ela.
Aparece com um brilho nos olhos, uma música nos lábios, um certo jeito de fazer o mundo parecer mais bonito por uns instantes — e depois vai embora. Não por mal. Mas porque já cumpriu seu papel.
La La Land é sobre isso.
Sobre quando a vida real interrompe a música no meio do refrão.
Sobre quando o amor é verdadeiro… mas não suficiente.
Sobre quando os caminhos se cruzam não pra permanecer, mas pra impulsionar.
Eu me vi na Mia desde a primeira cena.
Aquela vontade de algo maior, aquela fé de que existe um lugar onde a gente pode ser quem é — sem pedir licença, sem diminuir a luz. E também aquela solidão que ninguém vê, mesmo quando a gente está cercada de aplausos.
Muitos amores são assim: com esperança no início e frustração no fim.
As vezes você pode achar que encontrou “a pessoa certa”, e entende depois que a hora certa nunca é sobre o relógio — é sobre a versão de nós mesmos que está pronta pra viver aquilo.
O filme corta em silêncio.
Te obrigada a escolher entre o amor e os seus sonhos. E que louco é isso — como colocam o amor e a nossa própria existência na mesma balança, como se só um pudesse vencer.
Mas acontece. E dói. E ensina.
Aquela cena do final alternativo — ah, aquela cena.
Eles dançando como se tudo tivesse dado certo. Como se o universo tivesse colaborado. Como se amor bastasse.
Mas aí volta pro presente. E não deu. E tá tudo bem não dar.
Talvez o amor mais verdadeiro seja aquele que não ficou.
Porque ele ensina o que precisa ser visto, dentro e fora.
E quando acaba, deixa uma frase que ecoa:
“Obrigada. Aprendi muito com a sua permanência — e mais ainda com a sua ausência.”
Algumas histórias são belas exatamente porque não duram.
Alguns sentimentos são eternos exatamente porque não viraram rotina.
E alguns finais são perfeitos… justamente por não serem felizes.
Nem toda exaustão vem do que se faz. Algumas vêm do que se sente — ou do que não se sente mais.
Ela estava ali, sentada no canto do sofá, com o celular na mão e o peito vazio. Nenhuma notificação. Nenhuma vontade. Nenhuma resposta dentro dela.
O corpo até funcionava. Trabalhava, resolvia, entregava. Mas a alma… ah, a alma… essa pedia socorro em silêncio.
Não era sobre querer dormir. Era sobre querer desligar sem sumir. Era sobre querer estar viva — mas sem estar ligada o tempo todo.
Tem cansaços que não aparecem nos exames
A gente fala em descanso e logo pensam em férias no litoral, dias off do trabalho, uma tarde sem reuniões. Mas o cansaço da alma não se resolve com pacote de viagem. Nem com likes. Nem com spa.
É aquele cansaço que vem de aguentar. De engolir. De se calar quando tudo queria gritar.
Não é sono. É alma em estado de abandono.
Segundo a psicologia analítica de Carl Jung, todo desequilíbrio da psique se manifesta primeiro como desconexão com o self. Ou seja: quando a alma adoece, o corpo obedece.
Férias da obrigação de estar tudo bem
Talvez o que a gente mais precise agora é de férias emocionais. Um tempo pra não fingir. Pra não se exigir ser forte. Pra respirar sem pensar em retorno.
Talvez a alma não precise de grandes planos. Só de presença. De chão. De um olhar que diga: “pode parar, eu seguro você.”
Mas a gente se cobra até pra sentir. E isso adoece.
Devolver poesia ao cotidiano
Talvez a cura esteja em voltar a reparar. No sol que invade a cozinha. No cheiro do café. No som da água. Nas pequenas coisas que a pressa apagou.
Fazer poesia com os olhos — mesmo quando a vida não rima.
Porque às vezes tudo o que a alma pede não é milagre, é pausa. É presença. É um respiro dentro da rotina.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Vaidade com propósito: o espelho me viu primeiro.” Uma conversa sobre moda, imagem e a alma que se olha antes de se vestir.
Descansar nunca foi só sobre deitar. É sobre dizer “não” a um sistema que exige que a gente se esgote para se sentir útil.
Nos ensinaram que descansar é preguiça. Que parar é perder tempo. Que só merece respeito quem vive correndo.
Mas a verdade é que existe revolução no ato de pausar. Existe rebeldia em silenciar, em respirar, em escolher não adoecer por dentro para agradar por fora.
O descanso virou um ato político. E a alma agradece.
O mundo capitalizou até o tempo livre
Vivemos na lógica do “faça mais, produza mais, poste mais”. Até o ócio virou performance. Até o autocuidado virou conteúdo.
O sociólogo sul-coreano Byung-Chul Han, em seu livro “Sociedade do Cansaço”, afirma que vivemos em um tempo onde a autoexploração é disfarçada de liberdade. Não há mais patrão: nós mesmos nos cobramos como carrascos.
E mesmo quando não há nada pra fazer, há uma culpa pairando no ar. Como se parar fosse errado. Como se desacelerar fosse fracassar.
Mas quem disse que o sucesso é sinônimo de pressa?
Existe coragem em sair da corrida. Em desligar o celular. Em dormir cedo. Em não responder ninguém. Em se priorizar sem justificativa.
Descanso é reexistência
Na cultura ocidental, o descanso sempre foi visto como pausa entre tarefas. Mas em culturas africanas e indígenas, por exemplo, o descanso é parte da vida — não uma pausa dela.
A ativista norte-americana Tricia Hersey, criadora do movimento The Nap Ministry, afirma que “descansar é um direito ancestral” — e que corpos historicamente explorados precisam mais do que nunca aprender a descansar como forma de cura.
É sobre existir, e não apenas resistir. É sobre viver em vez de sobreviver.
Hoje eu escolho desacelerar
Hoje eu não vou ser exemplo de produtividade. Vou ser exemplo de pausa.
Vou me ouvir. Me acolher. Não é preguiça, é amor próprio. Não é fraqueza, é coragem.
Descansar é dizer: “eu não sou uma máquina.” E eu repito isso até que minha alma acredite.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “A alma pede férias — e não é do trabalho.” Uma reflexão lírica sobre o peso de estar presente sem estar inteira.
Entre sorrisos forçados no Instagram e crises abafadas no travesseiro, algo dentro de nós grita: “cansei.”
Ela acordou com o despertador e uma vontade absurda de não existir hoje. Olhou o celular, postou um story com café e escreveu: “gratidão pelo novo dia.”
Mas ninguém viu a insônia. Ninguém viu o choro abafado no banho ou a mensagem não respondida de ontem. Ninguém viu o desânimo que pesa mais do que qualquer boleto em aberto.
Tem uma geração inteira andando por aí como se estivesse tudo bem. E não tá.
O peso da leveza forçada
Estamos cansados. Mas não daquele cansaço que passa com um café forte e um cochilo de sábado. É o cansaço que mora na alma. No peito. No “tanto faz”.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, o burnout já é considerado um fenômeno ocupacional. E no Brasil, uma pesquisa da ISMA-BR revelou que cerca de 30% da população economicamente ativa sofre de burnout — o maior índice do mundo.
Mas não é só no trabalho. É no amor, nas amizades, na família. Cansa a obrigação de manter a pose. Cansa sorrir pra não incomodar. Cansa não poder desabar porque alguém “tem que ser forte”.
Quantas vezes a gente sorriu por educação e chorou por exaustão?
Desde quando viver virou manter a pose? Desde quando sucesso virou sinônimo de não ter tempo nem pra si?
Todo mundo cansado, ninguém descansando
Estamos em burnout coletivo, mas romantizando o cansaço com frases como “corre que o tempo voa” ou “você dorme, eles vencem”.
Mas a alma não é feita de cronograma. Ela precisa de pausa. De silêncio. De não fazer nada — e não se culpar por isso.
Se você também acorda cansada, mesmo depois de dormir… se sente que anda sobrevivendo mais do que vivendo… então talvez esse texto seja pra você.
Desligar também é existir
Hoje eu não quero vencer o mundo. Só quero existir sem me cobrar nada.
Feche os olhos. Respire. Desobrigue-se de funcionar. Permita-se ser humana. Ser falha. Ser sentida.
O descanso também é forma de protesto. O silêncio, uma forma de oração.
– b. monma
✦ Na próxima crônica: “Quando descansar virou um ato político.” Porque o mundo nos ensinou a correr, mas a alma pede outro ritmo.
Quando penso na cidade do futuro, não consigo imaginá-la feita apenas de concreto, vidros espelhados e arranha-céus que rasgam o céu. Esse é o futuro que já existe — e ele não me seduz.
A cidade que eu projeto não é sobre velocidade, mas sobre presença. Seria uma cidade onde as pessoas não acordam com o peso da pressa, mas com o prazer da vida. Onde o tempo não é medido por relógios digitais que nos controlam, mas pelo nascer e pôr do sol.
Nela, não haveria outdoors gigantes que nos dizem o que comprar, mas árvores imensas que nos lembram quem somos. Não haveria filas no trânsito, mas rodas de conversa nas praças. Não haveria grades nas janelas, porque ninguém precisaria se proteger da violência.
O progresso, para mim, não pode continuar sendo confundido com barulho, consumo e pressa. O verdadeiro progresso seria resgatar a simplicidade, devolver ao humano aquilo que as máquinas nunca poderão sentir: a paz.
E talvez essa cidade ainda não exista, mas começa a nascer cada vez que alguém escolhe viver de forma mais consciente, mais presente, mais humana.
Na vida, existem pessoas que são abrigo. Meu pai é uma delas.
Ele sempre foi força e proteção, aquele que coloca minha mãe e as filhas em primeiro lugar, mesmo que isso signifique ficar para depois.
Na infância, lembro de quando ele me colocava para dormir contando a história dos três porquinhos. Na voz dele, até o lobo mau parecia menos assustador. Eu dormia tranquila porque sabia que estava segura. E hoje, adulta, percebo que sigo sentindo o mesmo: ele continua sendo meu lugar seguro.
Meu pai é um homem de fé, resiliência e entrega. O tipo de pessoa que cozinha para a família e faz disso um gesto de amor. Que prova, todos os dias, que amar não é falar bonito, mas cuidar, providenciar, acreditar e estar presente.
Ele é a única pessoa que nunca riu das minhas ideias, mesmo das mais ousadas. Ao contrário: sempre acreditou nelas antes de mim, me incentivando a sonhar mais alto. Com ele aprendi que o que realmente importa é o coração — e que, quando encontramos um coração bom, devemos manter por perto.
Pai, você é a minha maior inspiração de honra e coragem. Feliz aniversário.
A plataforma perfeita pra você se sentir atoa em HD.
Eu sei porque já me peguei rolando por horas, o polegar adestrado, o olhar meio vidrado, o cérebro pingando dopamina baratinha — e depois? Depois vem o vazio, a sensação de “por que mesmo eu precisava saber como fazer torta de ricota em 12 segundos?”.
Eu já desinstalei o app várias vezes. Detox digital. Fugi do algoritmo como quem foge de ex tóxico, que você sabe que faz mal, mas ainda assim se pega espionando de madrugada. E toda vez que fiquei longe me senti muito bem. Tipo muito. Como se minha cabeça finalmente respirasse, como se sobrasse espaço pra existir sem comparações, sem urgências que não são minhas.
Tem estudos que mostram que isso não é só sensação. A Universidade de Harvard tem pesquisas clássicas sobre como redes sociais ativam exatamente os mesmos circuitos de recompensa do vício em drogas. Cada notificação, cada vídeo que faz rir ou chorar, é uma microdose de dopamina. Um artigo publicado no Journal of Social and Clinical Psychology mostrou que, quanto mais tempo a gente passa no Instagram, TikTok e afins, maior a chance de sintomas depressivos e ansiosos. É literalmente o cérebro sendo treinado a querer mais estímulo e menos silêncio interno.
Minha vida ideal seria tão mais simples.
Morando na praia, jogando beach tennis todo dia, sem notificação nenhuma me dizendo o que sentir, quem invejar, o que comprar, o que sonhar. Só o barulho do mar, a bola quicando na areia e talvez uma cerveja gelada pra brindar o fato de estar viva e, finalmente, presente.
No fim das contas, acho que é isso.
Quero menos feed e mais vida real. Menos dopamina sintética e mais serotonina do sol batendo na pele. Quero ficar atoa — mas atoa de verdade, sem algoritmo nenhum pra me dizer o que fazer com o meu tempo livre. Porque talvez seja só aí que eu me encontre de novo.
E tem dias que eu quero largar tudo com estilo: com um passaporte na mão, uma mala pequena e uma ausência imensa de obrigações. Um lugar onde ninguém sabe meu nome. Onde eu não tenha que ser a filha de ninguém, a amiga de ninguém, a Bruna de ninguém. Um lugar onde eu só exista — crua, sem edição, sem legenda.
Porque às vezes, tudo o que a gente precisa pra se encontrar… é se perder bem longe.
Já pensei em repetir o roteiro:
Comer na Itália, porque a boca também chora.
Rezar no Butão, porque lá o tempo passa mais devagar e Deus parece mais acessível.
E amar em Ubud, porque dizem que lá o espírito parece comigo — introspectivo, bonito sem esforço, e às vezes meio perdido entre o chão e o céu.
Mas a verdade é que eu não estou buscando um lugar. Estou buscando a mim mesma.
E isso muda tudo.
Não tem GPS pra isso.
É um caminho pra dentro — e ele exige silêncio.
O silêncio me cura.
Não aquele constrangido de sala de espera, mas o silêncio corajoso de quem encara os próprios pensamentos sem anestesia. De quem senta com a alma e pergunta:
“Você tá bem?”
E espera a resposta vir em ondas.
Minha Índia pessoal tem sido esse intervalo estranho entre a adolescência que insiste em voltar e a vida adulta que não espera ninguém. Um espaço onde ainda tô aprendendo a cuidar de mim, enquanto o mundo me cobra estabilidade, respostas e um endereço fixo.
O que me segura?
Meditar. Orar. Escutar áudio frequências como quem toma banho de som.
E entender que a mente é um cachorro bravo: ou você treina, ou ela te morde.
Sobre o amor…
Eu já tive medo. Mas nunca deixei de pular. Eu pulo com medo mesmo, com a cara borrada, com o coração remendado. Porque acredito no amor como ponto de passagem.
Ele vem, deixa algo, e às vezes vai.
Mas nunca passa em vão.
E eu sei que só amei de verdade quando já tinha me encontrado primeiro.
Quando parei de pedir para que me salvassem. Quando aprendi a me abraçar sozinha.
A cena que mais me toca é aquela em que a Elizabeth diz:
“Eu quero ir a um lugar onde eu possa me maravilhar de novo.”
E eu entendo. Porque tem dias em que tudo o que a gente quer é isso: se maravilhar de novo. Por dentro, por fora, por todos os lados.
E se um dia você me vir andando sozinha por algum lugar no mapa, saiba que eu não tô fugindo.
Carrego no nome um pedaço de bruma e um pedaço de raiz.
Bruna, palavra antiga do latim, fala de pele morena e de neblina — como se já anunciasse que eu nasceria com essa mistura de fogo e mistério, sempre entre o claro e o escuro.
Monma, herança japonesa, é o sopro de outra terra que me habita, como uma memória que atravessou oceanos para chegar até mim. Uma âncora invisível que me lembra que também sou feita de silêncio, disciplina e espiritualidade.
E então vem o Cardoso, esse chão brasileiro de onde brotam minhas histórias, minhas lutas e minhas paixões.
Juntos, esses três nomes não formam apenas quem eu sou, mas também o que eu busco: a paz da bruma, a sabedoria das raízes e a intensidade da terra que me acolheu.
Meu nome é destino e travessia. É espelho e profecia. É a poesia que me acompanha desde o primeiro suspiro.
Eu não escolho filmes. Eles me escolhem. Uns me atravessam como faca, outros me seguram como abraço. E alguns… me mudam por dentro sem que eu perceba. Esses são os 10 que me escolheram antes mesmo que eu soubesse que precisava deles:
O Casamento do Meu Melhor Amigo — porque eu acredito que o amor também pode ser despedida.
Comer, Rezar, Amar — porque fugir pode ser, na verdade, um jeito de se encontrar.
La La Land — porque às vezes a pessoa certa vem na hora certa… só pra te ensinar a seguir sozinha.
Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças — porque esquecer é às vezes lembrar demais.
Frances Ha — porque estar perdida também é uma forma de estar viva.
500 Dias com Ela — porque nem todo quase-amor precisa virar trauma, mas quase sempre vira.
Esposa de Mentirinha — porque rir com quem a gente ama é tão bom quanto amar quem faz a gente rir.
Her — porque até a tecnologia sabe mais sobre solidão do que a gente admite.
As Vantagens de Ser Invisível — porque a adolescência é um trauma com trilha sonora boa.
O Fabuloso Destino de Amélie Poulain — porque pequenos gestos ainda me comovem.
Às vezes me sinto completamente improdutiva. Tipo um domingo arrastado em que não fiz nada além de existir — e talvez nem isso direito. Mas, curiosamente, eu me permito. Porque eu gosto. Eu gosto tanto de não fazer nada que chega a ser quase uma arte. Acho que me recarrego assim, sozinha, meio de dentro, sem esforço.
É meio difícil explicar pra quem mede o valor do dia pela lista de tarefas riscadas ou pela produtividade estampada nos stories. Eu, sinceramente, prefiro o silêncio. O nada. O tempo parado. Me sinto mil vezes mais renovada num quarto escuro, ouvindo o som do ventilador, do que no meio de gente. É como se o vazio me preenchesse — sei lá, parece contraditório, mas pra mim faz todo sentido.
Não sou só eu que digo isso (ufa). A neurociência também. Tem um estudo da Universidade de Central Lancashire, no Reino Unido, que mostra que o tédio — o ócio puro e simples, sem estímulo — aumenta a criatividade. Quando o cérebro não tem nada prático pra fazer, ele começa a buscar conexões internas, resgatar memórias, inventar histórias. O nada é fértil.
Tem outro artigo no Frontiers in Psychology que fala como atividades “subitamente entediantes” (olhar pro teto, lavar louça, andar sem destino) ativam áreas do cérebro ligadas à imaginação. É ali, na aparente perda de tempo, que surgem soluções criativas e até insights sobre quem a gente é.
Então talvez eu não seja preguiçosa, só esteja dando espaço pro meu cérebro brincar. Talvez eu não seja antissocial, só precise me abastecer de mim pra depois voltar pro mundo sem me sentir drenada.
No fim, se fazer nada me recarrega, que seja. Se o vazio é o meu jeito de florescer, então vou continuar abraçando meus momentos de quarto escuro, ventilador ligado, pensando em absolutamente nada — e, de algum jeito estranho, me tornando cada vez mais eu.
Costas, ombros, pescoço. É ali que mora a minha vida adulta. Ou, pelo menos, é ali que ela decide se manifestar em forma de peso, aperto, torcicolo, travada de quem dormiu errado — ou só vive errado mesmo.
Eu durmo bem, confesso. Mas queria dormir mais. Tipo 12 horas, igual adolescente sem boletos, sem responsabilidades, sem uma lista mental de “preciso resolver isso amanhã senão o mundo explode”. Só que no auge dos meus 29, o que me resta é agradecer as 7 horinhas boas e continuar o dia com aquela leve sensação de: “fui atropelada por um Fiat Uno, mas pelo menos não era um caminhão.”
Tem o Rivotril. Claro. A química santa que faz a mente dar uma brecadinha básica antes de inventar mais tragédias. E tem o Pilates duas vezes por semana, que é quase um pedido de socorro silencioso do meu corpo, do tipo: “por favor, vamos alongar isso aqui antes que vire cimento.”
Não sou só eu nesse combo meio triste, meio necessário. Tem estudos (muitos estudos) que mostram como o stress crônico literalmente mora no corpo. O Instituto Americano de Stress (sim, isso existe, e o site deles parece a página oficial de quem tá sempre à beira do colapso) diz que o stress prolongado ativa constantemente o sistema nervoso simpático — aquele que prepara pra luta ou fuga — e mantém níveis altos de cortisol. Resultado? Tensão muscular constante, má digestão, dores de cabeça, fadiga. Basicamente, tudo o que a gente chama carinhosamente de “vida adulta”.
Um artigo publicado no Frontiers in Psychology ainda aponta que o corpo guarda microcontraturas musculares como memória do stress. É tipo um bloco de notas ansioso, anotando cada vez que você engole um choro, deixa passar uma raiva ou segura o grito pra não parecer louca. No fim, o corpo registra tudo. Até o que você achou que tinha superado.
É por isso que eu continuo indo pro Pilates, mesmo com preguiça. É por isso que continuo tomando o remédio, mesmo com culpa. É por isso que continuo escrevendo, mesmo doendo. Porque no fundo, é tudo tentativa de soltar o que ficou preso aqui dentro — nos ombros, nas costas, no pescoço e, claro, no coração.
No fim, acho que ser adulto é isso aí mesmo: ter o corpo todo tenso, o sono sempre faltando um pouquinho, umas cápsulas de calmaria em forma de tarja preta e umas sessões de Pilates que a gente paga caro só pra não virar uma estátua estressada. Mas pelo menos tô tentando. Tô me movendo, me cuidando, me ouvindo (mesmo quando não gosto do que escuto). E se você também tá aí, todo travado, exausto, mas ainda tentando… bem-vindo ao clube. Talvez esse seja o máximo que dá pra chamar de saúde — ou, quem sabe, o primeiro passo pra ela.
Às vezes acho que estou no meio de uma travessia estranha: entre a mulher que esperaram que eu fosse e a mulher que eu, teimosa, decidi ser.
É um caminho meio solitário, confesso. Porque a cada passo deixo pra trás uma expectativa, um rótulo, uma conveniência que fazia minha vida caber melhor nos olhos dos outros.
Mas não tem como carregar tudo.
E eu cansei de andar torta só pra caber.
O problema é que, vez ou outra, me pego duvidando: será que estou mesmo me libertando ou só arrumei outro jeito de sabotar o que poderia ter dado certo?
Porque a sombra é ardilosa.
Ela se disfarça de coragem quando é fuga.
Veste a fantasia de autenticidade quando é só medo de intimidade.
Por isso eu vivo me perguntando: isso vem do meu centro ou é só o meu ressentimento fantasiado de revolução?
É luz ou é só mais um jogo do ego tentando não sofrer?
No fundo, acho que crescer é isso: aprender a distinguir o que é escolha genuína do que é só reação.
E ter paciência pra lidar com o tanto de vezes que a gente vai errar a mão.
Mas tudo bem.
Porque ser quem decidir ser, ainda que tropeçando, já é infinitamente mais honesto do que seguir o script de alguém que não sou eu.
Tenho curiosidade por tudo o que existe no intervalo entre o óbvio e o invisível. Pela forma como a moda pode ser mais do que aparência e se tornar sensação, memória e identidade. Pela música que atravessa o tempo e cria pontes entre gerações. Pelos símbolos que a espiritualidade espalha no caminho — um sonho que insiste em voltar, uma coincidência que na verdade é resposta, uma nuvem que parece mensagem.
Minha curiosidade não se contenta com a superfície. Quero entender por que as coisas são como são, o que está escondido atrás do que vemos, e como cada detalhe pode carregar uma história inteira. Talvez minha curiosidade maior seja essa: desvendar a vida como se fosse um livro infinito, escrito em fragmentos que a gente vai juntando página por página.
Sim, 29 anos chegam com boletos, responsabilidades… e esse tipo de recado do corpo. Mas tudo bem: se tem uma coisa que aprendi é que até a dor pode ser um lembrete de que estou viva. E isso, no fim, já é presente.
Sou grata ao meu noivo — amor, parceiro e melhor amigo — que me acompanha nos dramas, nos sonhos e até nos surtos existenciais de fim de tarde.
Sou grata aos meus pais, minha base, que me ensinaram a ser forte e, ao mesmo tempo, doce.
Sou grata às minhas irmãs, que me lembram todos os dias que o amor mais puro e incondicional existe bem aqui, dentro de casa.
Sou grata aos meus amigos de verdade, que já atravessaram comigo mais de um ciclo e continuam firmes, como personagens recorrentes de uma boa série.
Sou grata pela saúde, por estarmos bem, sem faltar nada essencial — porque isso é riqueza que não tem preço.
Sou grata a Deus, que me sustenta, fortalece e me lembra que fé não é só palavra, é chão.
E sou grata à arte — aquela que me inspira e que, de alguma forma, também é parte de quem eu sou.
Sou grata também pelas coisas simples que fazem a vida caber no peito:
– o café quentinho na hora certa;
– a batata frita crocante do jeito certo;
– a roupa que sai da máquina sem mancha;
– a música que toca sem querer e parece ter sido feita para mim;
– e por cada pôr do sol que insiste em provar que a vida ainda vale a pena, mesmo nos dias mais pesados.
Olho para trás e vejo que sobrevivi a todas as tempestades que juravam me afogar.
Olho para frente e sigo acreditando que a vida é bonita — mesmo quando acorda com dor nas costas.
Hoje não comemoro apenas mais um ano de vida.
Comemoro a chance de continuar vivendo com amor, fé e poesia.
E a você que lê, deixo esse brinde: que nunca falte amor, saúde, amigos de verdade e pequenas razões para agradecer.
Porque é isso que faz a vida valer — muito mais do que qualquer número na idade.
Toda sexta tem texto novo dessa série aqui. Então se você, assim como eu, tá tentando virar adulto sem se sentir um completo fracasso, volta na próxima semana. A gente tropeça, ri, chora e tenta de novo — juntos.
Amar é talvez o tema mais batido e ainda assim mais bagunçado que existe. Eu carrego inseguranças até hoje por conta de relacionamentos anteriores — medo de ser trocada, medo de não ser suficiente, medo de amar mais do que o outro. E por mais que eu tente romper padrões, às vezes parece que eles me perseguem, silenciosos, prontos pra dar o bote na primeira brecha.
Outro dia escrevi um texto que dizia tudo o que, pra mim, não cabe no amor:
Falta de consideração. Falta de prioridade. Falta de empatia. Querer ser amado, mas esquecer de amar. Querer cuidado, mas não saber cuidar. Amor é parceria. É cumplicidade. É fazer mercado de mãos dadas e dividir a louça no fim do dia. É rir das fofocas mais bestas e guardar segredos como se fossem jóias. É lembrar que ninguém segura sozinho um sentimento que foi feito pra dois. Quando a balança pesa só de um lado, não há amor que aguente em pé. Amor não é silêncio quando se precisa de palavras, nem palavras frias quando se precisa de calor. Não é disputa de quem faz mais, sente mais ou se doa primeiro. É troca. É presença. É intenção. Não cabe o descaso, nem a mania de achar que o outro vai ficar pra sempre, mesmo sendo deixado pra depois. Amor não sobrevive de migalhas nem de promessas vazias. Ele se alimenta de gesto, de presença, de atenção nos detalhes. Amor é saber a marca do café preferido, é lembrar de como foi o dia sem precisar perguntar. É se importar mesmo nos dias em que tudo parece estar desmoronando. É saber que dividir o peso é mais leve do que fingir que não sente. E, principalmente: amor não cabe onde só um ama. Não há equilíbrio onde só um segura o teto.
E isso não saiu só da minha cabeça poética — saiu também do que a ciência diz. A psicologia das relações tem algo chamado Teoria do Apego, criada pelo John Bowlby e depois expandida pela Mary Ainsworth. Ela mostra como o jeito que fomos cuidados (ou não) na infância molda a forma como amamos na vida adulta. Se crescemos inseguros, ansiosos, sempre precisando provar nosso valor pra alguém, é quase inevitável que a gente carregue isso pros relacionamentos. É nosso sistema nervoso que faz isso, nem sempre dá pra controlar.
Um estudo publicado no Journal of Personality and Social Psychology confirma que pessoas com apego ansioso tendem a ter medo constante de serem abandonadas, exageram sinais de rejeição e precisam de validação o tempo todo pra se sentirem seguras. Eu me senti um pouco exposta lendo isso — e ao mesmo tempo estranhamente aliviada. Tipo: não é só comigo, tem gente estudando isso num laboratório. Tá na biologia, na neuroquímica, na memória emocional.
E ainda tem o fator sociedade: a indústria cultural vende o amor como um script perfeito, com trilha sonora épica e grandes gestos cinematográficos. Mas a realidade? O amor real é muito menos editado, muito mais bagunçado, às vezes silencioso demais, às vezes tão barulhento que dá vontade de tampar os ouvidos.
A gente sonha com o amor do filme, mas a verdade é que cada história é única — até as parecidas. Não dá pra comparar. Tem quem viva um amor que parece sereno desde o início, tem quem só aprenda a amar direito depois de quebrar a cara mil vezes. Tem quem ame na calmaria, quem ame no caos, quem precise de colo, quem precise de espaço. Não tem fórmula.
E apesar das minhas dúvidas — e são muitas — sobre o que é amar de verdade, eu ainda acredito nesse amor simples e enorme, que não pesa. Que é escolha diária, viva, real. Que mesmo podendo ir, escolhe ficar.
No fim, acho que amar é sempre meio assustador, porque amar de verdade é se expor — é dar o coração na mão do outro e torcer pra ele não apertar demais. É confiar que o outro vai ficar, mesmo podendo ir. Às vezes eu mesma não sei o que é o amor ou como deveria ser, mas sei bem o que não quero viver de novo. Sei que quero algo que seja leve até nos dias pesados, que seja escolha até na rotina, que seja presença até no silêncio. E se você também tem seus medos, seus traumas, suas dúvidas sobre esse tal amor, tudo bem. A gente tá aprendendo junto, dia após dia, a amar sem deixar de nos amar primeiro. E talvez, só talvez, isso já seja o amor mais bonito que dá pra ter.
Carrega consigo o peso leve dos anos 70, quando o mundo queria quebrar padrões, soltar as amarras e dançar ao som da própria liberdade. Mas também sabe ser atual, moderna, cool — porque quem tem franja não precisa gritar estilo, o rosto já diz por si.
No fundo, usar franja é um ato de espírito livre.
É aceitar que o cabelo vai cair no olho, que a visão vai ser emoldurada, que talvez nem sempre ela esteja perfeitamente alinhada.
E é justamente aí que mora a graça: ela não pede controle, ela pede entrega.
Eu sinto que a franja é como essa fase da minha vida.
Carrega o peso de tudo que vivi até aqui, mas ao mesmo tempo abre espaço para o novo.
Não é só corte: é rito de passagem.
É declarar, sem dizer, que a vida é feita de molduras e de liberdade.
Palavrinha bonita pra um troço que me escapa com a mesma facilidade de água entre os dedos.
Me dizem pra confiar, pra deixar a vida fluir, pra soltar o controle — e eu rio, meio nervosa, porque controlar as coisas é meu passatempo favorito. Dá uma falsa sensação de poder, quase confortável.
Quase.
Mas a vida, essa debochada, não respeita planilha.
Quanto mais eu tento puxar o caule pra flor crescer, mais ele quebra.
Quanto mais exijo garantias, mais o futuro faz careta pra mim e some na curva.
Eu sei, no fundo, que paciência não é só esperar.
É confiar. É regar a semente sem abrir a terra todo dia pra checar se ela já criou raiz.
É ter fé no invisível, mesmo sem contrato assinado.
Só que viver assim exige coragem.
E coragem cansa.
Porque tem dias que eu quero mesmo é gritar pro céu: “anda logo com isso aí, universo, que eu tenho pressa de ser feliz!”
Mas então respiro, fecho os olhos e me lembro que o tempo certo não tem a ver com o meu relógio.
E que a única forma de não adoecer é soltar a corda um pouquinho.
Deixar o barco ir, mesmo sem ter certeza do porto.
No fim das contas, paciência é isso:
não é desistir de chegar, mas aceitar navegar no ritmo das marés.
Se tem uma coisa que sempre me acompanhou, além da minha franja torta nas fotos da 7°ano e do drama leonino desnecessário, foi esse dom esquisito de caber em mais de um lugar.
Nunca fui de panelinha. Eu era o tempero. Aquela que se dava bem com todo mundo, mas não se perdia em ninguém — ou pelo menos tentava.
Na sala de aula, meu lugar não era fixo. Tinha dia que eu tava no fundão rindo com os engraçadinhos. No outro, na primeira fileira, batendo papo com a professora (não por puxa-saquismo, mas porque eu genuinamente gostava de perguntar coisas que ninguém tinha perguntado desde 1998).
Passei por mais fases que a lua. Já tive minha versão skatista de aba reta (sim, com adesivo), minha fase hippie com saia longa e pulseira de miçanga, a roqueira metida a cult, a emo de franja no olho e frase melancólica no status, a patricinha de gloss roll-on com glitter, e até a nerd que pedia tarefa extra (me respeita que fui várias).
Mas o mais curioso é que, no fundo, eu era todas elas ao mesmo tempo. E talvez ainda seja.
Nunca foi por carência de personalidade. Era excesso. Excesso de curiosidade, de vontade de entender o outro, de experimentar o mundo sem precisar escolher um rótulo definitivo pra colar na testa.
Enquanto uns se organizavam por tribos como se estivessem montando time de vôlei na educação física, eu circulava com a leveza de quem não tava nem no jogo.
Um dia com os que jogavam. No outro, com os que odiavam esportes e preferiam desenhar no caderno de matemática.
Transitar, no meu caso, sempre foi pertencer a mim mesma.
Mesmo que às vezes eu não tivesse certeza de quem, exatamente, era esse “mim mesma” do momento.
Claro que já me senti sem tribo. Já teve fase em que eu pensei: “será que sou do contra ou só do avesso?”
Mas tudo bem. A gente nasce e morre sozinho mesmo. O que encontrar no meio do caminho é lucro. E olha, se for gente boa e comida boa, melhor ainda.
Hoje eu olho pras minhas amizades e dou risada. Tenho amiga que acredita em signo, outra que acha que astrologia é charlatanismo com glitter. Tenho os do “vamos orar” e os do “vamos beber”. E eu amo todos — cada um encaixa uma versão minha que só eles despertam.
Porque no fim, não sou de todo mundo.
Mas sou de muitos mundos.
E isso nunca foi um problema. Foi um superpoder.
Gosto de pensar que sentar em vários lugares da sala foi meu primeiro passo pra ser quem sou hoje: alguém que escuta, que acolhe, que observa o caos com carinho.
Alguém que entende que algumas pessoas precisam de grupo, de rótulo, de uniforme emocional.
E outras — como eu — só querem viver o que vier, desde que venha com verdade e talvez um pouco de batata frita.
No próximo dia 2 de agosto, eu completo 29 anos. E, como todo ano, o universo já começou a me cutucar — às vezes de leve, às vezes com um empurrão que quase me derruba, mas sempre com alguma intenção.
Essa semana, por exemplo, postei três textos no blog em um único dia. Três. Acredito que alguns leitores pensaram: “ela surtou”. E talvez tenham razão. Mas é um surto bonito, eu juro. Um surto com cheiro de bolo assando, playlist de nostalgia e certezas sendo reescritas.
Se minha vida fosse um livro, o capítulo atual se chamaria Entre ciclos e possibilidades. Porque é exatamente aqui que estou: entre o que já fui e o que estou me tornando. Entre tudo o que aprendi e o que ainda preciso descobrir. Entre a intensidade que me move e a paz que, enfim, começo a cultivar.
Durante muito tempo, meu aniversário carregava um certo peso. Um balanço existencial quase obrigatório, uma cobrança espiritual silenciosa. E não é que isso tenha desaparecido — mas esse ano, parece que virou outra coisa. Uma vontade mais madura de viver com intenção. De celebrar com calma. De agradecer por estar viva, mesmo no meio do caos.
Por isso, neste novo ciclo, decidi comemorar em doses pequenas e afetivas: Na quinta, com as minhas amigas. Na sexta, com os amigos mais próximos. No sábado, com meus pais, minhas irmãs e meu noivo. Comida boa, conversa leve, vinho, risada, bolo bonito. Só. E tudo. Porque cheguei num ponto da vida em que o “simples” virou meu luxo favorito.
Aos 29, olho pra trás e vejo tantas versões de mim. Algumas ficaram no caminho com carinho. Outras ainda me acompanham — como velhas amigas que mudaram de cabelo, mas continuam me entendendo no olhar. Hoje, sei que dá pra mudar sem se perder. Dá pra ser intensa sem se atropelar. Dá pra querer mais sem cuspir no que já se tem.
E no meio dessa montanha-russa emocional, tem algo dentro de mim que só quer… leveza. Quer dias de viagem, sem hora pra acordar. Sem obrigação de ser interessante o tempo todo. Quer silêncio. Céu bonito. Um texto novo sendo escrito. Quer a sensação de estar exatamente onde deveria estar — mesmo quando não faço ideia de onde isso fica no mapa.
Se eu pudesse escrever uma carta pra Bruna de alguns anos atrás, eu diria:
“Relaxa. Você não precisa ter tudo resolvido agora. Algumas respostas só chegam com o tempo. Outras, você mesma vai inventar.”
E se eu pudesse falar com a Bruna do futuro, seria mais ou menos assim:
“Espero que você esteja feliz. Que tenha viajado muito. Que tenha escrito muito. Que tenha amado sem medo. E que, acima de tudo, tenha aprendido a confiar — em Deus, na vida e em si mesma.”
Essa é minha pequena celebração antecipada: um texto com cheiro de recomeço. um abraço nas versões que já fui. e um brinde silencioso ao que ainda está por vir.
Se você achou que eu tava surtando com esse monte de post… talvez esteja mesmo. Mas é um surto de vida. De quem, aos 29, entendeu que estar viva já é motivo suficiente pra comemorar.
Toda sexta tem texto novo dessa série aqui. Então se você, assim como eu, tá tentando virar adulto sem se sentir um completo fracasso, volta na próxima semana. A gente tropeça, ri, chora e tenta de novo — juntos.
Eu me pego postergando tudo que possa ser postergado. Tudo. Se der pra deixar pra amanhã, eu deixo. E o mais engraçado, ou triste, não sei, é que a única coisa que faço antes de qualquer prazo é sofrer por antecedência.
Meu corpo reage de formas bem criativas: ansiedade que parece um ninho de abelhas no peito, irritação que me faz querer rosnar pra quem respira do meu lado, uma fome estranha que não é fome de comida. Às vezes é a ansiedade que puxa esse fio, outras vezes é a irritação que vem primeiro, me lembrando que tem algo que não quero lidar.
E não sou só eu. Tem estudos pra provar. A Universidade de Calgary, no Canadá, publicou uma pesquisa mostrando que a procrastinação é menos sobre preguiça e mais sobre regulação emocional. Ou seja, a gente adia as tarefas não porque não sabe o que tem que fazer — mas porque não quer encarar o desconforto emocional que isso gera. Tipo medo de fracassar, medo de não ser bom o bastante, medo de começar e perceber que não era bem aquilo.
Outro estudo do Journal of Behavioral Therapy indica que o nosso cérebro vai direto naquilo que oferece recompensa imediata. Por isso é tão mais fácil abrir o Instagram do que abrir o e-mail do contador. O cérebro quer dopamina — aquela faísca rápida de prazer — e não burocracia, não responsabilidade, não contas.
Tem um caso clássico que li outro dia: um cara que precisou tomar remédio pra pressão aos 38 porque o trabalho dele era uma pilha de procrastinação acumulada. Ele adiava tanto tudo que vivia no estado “susto permanente” — o cortisol lá em cima, até o corpo gritar “chega”. Achei meio absurdo e ao mesmo tempo tão possível. Porque no fundo, cada vez que a gente adia o que precisa fazer, fica pagando juros emocionais altíssimos. Tipo um cartão rotativo, só que da alma.
Eu queria ser do tipo que resolve tudo cedo, que manda o arquivo, paga o boleto, faz a ligação chata sem nem suar. Mas a real é que ainda sou a adulta que aperta “adiar” no despertador da vida. Às vezes por preguiça, mas na maioria das vezes porque é dolorido demais encarar o que tá por trás: o medo de errar, de não dar conta, de me decepcionar — ou pior, de decepcionar quem espera algo de mim.
Enquanto isso, sigo assim: protelando, ansiosa, irritada… e escrevendo sobre isso, como quem confessa num diário pra ver se alivia o peso. E de algum modo, sempre alivia.
No fim, acho que todo mundo tá tentando fingir um pouco de controle, né? Uns adiam porque têm medo, outros porque têm preguiça, outros porque o peito aperta e o corpo não deixa. Eu adio por tudo isso junto, embaralhado, num combo que às vezes me faz duvidar até de mim.
Mas se você também sente isso, fica tranquilo. A gente tá junto, empurrando o que dá pra empurrar, respirando fundo no que não tem mais como adiar, e torcendo pra, no meio do caminho, aprender a ser mais gentil com a gente mesmo. Talvez seja isso ser adulto: falhar, se irritar, procrastinar… e ainda assim continuar tentando.
Ninguém tá esperando que vocês saibam quem são aos doze. Aos doze, a gente devia estar testando a vida, não tentando convencer o mundo de que já nasceu pronta.
Mas eu vejo vocês — apressados. Tentando descobrir qual cena combina com o olhar alheio, quais gostos são mais curtíveis, qual roupa vai fazer os outros te acharem interessante. E confesso que me corta um pouco por dentro. Porque tem beleza demais em não saber ainda. Em ser esquisita, indecisa, em mudar de opinião toda semana. Em não dar conta. Em não saber o que responder quando te perguntam “o que você gosta?” — porque a resposta ainda tá em construção.
Minha irmã veio passar uns dias comigo e, mesmo nas pequenas coisas, eu percebi o quanto tudo já é sobre pertencer. Ela ainda é uma criança, mas já carrega nos ombros o medo de não ser escolhida, de não parecer legal, de não se encaixar no padrão de beleza, na trend certa, no grupo certo. Como se já fosse adulta. Como se já tivesse que dar conta de tudo sozinha.
Mas não tem pressa, meu amor. Você não precisa parecer nada. Não precisa se vestir como ninguém, falar como ninguém, performar simpatia ou personalidade. Você pode só ser. Mesmo que ninguém entenda.
A verdade é que ninguém tem tudo resolvido. Nem eu, que escrevo isso aqui. Eu também ainda tenho medo de não ser suficiente, de ser esquisita demais ou sensível demais. Mas tô aprendendo que não vale a pena gastar a vida tentando caber em um molde — porque a gente foi feita pra transbordar.
Então se você quiser usar um tênis diferente, use. Se quiser ouvir a mesma música dez vezes e depois nunca mais, tudo bem. Se quiser mudar de opinião, mude. E se quiser chorar no meio da aula de ciências, pode chorar também.
Porque ser você é mais importante do que parecer interessante.
Tem dias em que tudo o que eu quero é um colo. Um lugar onde eu possa tirar os sapatos da alma, deixar a guarda cair e descansar sem medo de não ser compreendida. Tem outros em que eu preciso de vento no rosto, bagunça na rotina, tremor no coração. Preciso me perder um pouco pra lembrar quem sou.
E você? Está buscando o quê?
Segurança veste pijama e faz café do mesmo jeito todo dia. Aventura usa salto num chão de pedra e ri mesmo quando tropeça. Às vezes, a gente quer estabilidade. Outras, a gente quer que tudo desestabilize — só pra ter certeza de que ainda estamos vivos.
Tem gente que chama isso de inconstância. Eu chamo de intensidade.
O difícil é quando você deseja os dois ao mesmo tempo: um lar onde você possa pousar, mas que tenha uma porta aberta para partir se o mundo chamar. Um amor que te segure pela mão, mas que não tente cortar suas asas.
E talvez o segredo não seja escolher entre segurança e aventura. Talvez seja aprender a dançar entre elas. Como quem sabe que pode amar e ainda assim partir. Como quem parte, mas promete voltar.
Enquanto tocava Devotion, eu senti como se alguém tivesse tirado o ar do ambiente e me deixado ali, parada, respirando só pelas beiradas.
A voz dele vinha falhando de propósito, quase como quem diz: “olha, isso aqui é o máximo que eu consigo dar agora, e espero que seja suficiente”. E no fundo, era. Porque não era perfeito, era humano — e, de algum jeito, isso me abraça mais do que qualquer grande promessa impecável.
Fiquei pensando no quanto a gente se debate pra caber na expectativa do outro, pra parecer seguro, pra ter um discurso bonito que esconda o medo. Mas no fim, tudo o que a gente quer é alguém que fique mesmo quando não tem espetáculo. Alguém que olhe pra dentro do caos e ainda assim escolha ficar.
Devotion me fez lembrar do quanto é raro ter quem encoste de verdade na tua alma. Quem veja teus recortes tortos, teus exageros, tuas falhas, e ainda assim diga: “é aqui que eu quero estar.”
E enquanto ele cantava isso, eu me dei conta do tamanho do presente que é ter esse alguém. Porque no meio do som cru, das batidas irregulares, do violão quase desafinado, ficou claro pra mim que a maior devoção não é dizer “eu te amo” — é dizer “eu escolho você, mesmo sabendo de tudo”.
Gente, assim… Eu sempre soube. Antes de qualquer mapa astral, antes de Vênus, antes de casas e graus — eu já me conhecia o suficiente pra saber que tinha alguma coisa de exagerada, teatral e levemente (ou não tão levemente) dramática rolando aqui.
Então foi meio óbvio quando o universo, via Astro.com e suas efemérides suíças chiquérrimas, me confirmou o que eu já gritava de cima do palco imaginário da minha vida:
Sol em Leão, amores. Vênus também.
Quer dizer… é claro que eu amo como se estivesse num musical da Broadway, esperando declarações épicas e surpresas que envolvam coreografia e figurino. É claro que meu senso de autoestima é algo que oscila entre “sou incrível” e “meu Deus, será que eu sou amada?” em questão de minutos.
A parte curiosa é que por anos achei que minha Vênus era em Gêmeos. E confesso: sempre me senti um pouco traída por isso. Tipo: eu, volúvel? Eu, desapegada? Eu, flertando por esporte? Não combina comigo. Eu quero intensidade, quero ter pra quem escrever textões, quero amar até dizer chega. Então foi quase um alívio cármico descobrir que não, mana — minha Vênus é leonina sim, do jeitinho exagerado que meu peito sempre soube.
Minha Lua é em Peixes, e isso também sempre esteve na cara. Por que mais eu choraria vendo final de propaganda de margarina? Ou absorveria as neuras alheias como se fossem meus boletos vencendo?
O Ascendente em Aquário só fecha o combo: “seja diferente, mesmo que ninguém entenda, e continue aí voando nas suas teorias malucas.”
No fundo, o que essa tour astrológica toda me mostrou é que eu sou exatamente quem sempre suspeitei ser: dramática, intensa, artista até o último fio de cabelo despenteado, meio mística, meio rainha do palco — tudo junto e misturado.
E se tem algo que aprendi, é que não adianta tentar caber num molde comportadinho. Eu sou muito pra isso. E honestamente? Ainda bem.
Toda sexta tem texto novo dessa série aqui. Então se você, assim como eu, tá tentando virar adulto sem se sentir um completo fracasso, volta na próxima semana. A gente tropeça, ri, chora e tenta de novo — juntos.
Dinheiro sempre foi uma presença curiosa na minha vida. Não posso dizer que cresci na escassez, nem que vivi rodeada de luxo desde o começo. Teve momentos mais apertados, teve fases de abundância. No meio de tudo isso, eu — uma criança mimada, que quase sempre teve o que quis, sem precisar esperar muito.
Quando meu pai prosperou de verdade, o céu virou o limite. E aí ficou ainda mais fácil confundir amor com presentes, felicidade com coisas novas, validação com o som de uma sacola sendo rasgada. Talvez tenha começado ali essa relação meio torta com o dinheiro, meio carinhosa, meio traumática — como quase todo mundo tem, se for bem honesto consigo.
O que deveria ser só uma questão de contas e planilhas, é na verdade um campo minado emocional. E não sou só eu dizendo isso: a psicologia comportamental tá cheia de estudos que mostram como nossas decisões financeiras estão muito mais ligadas ao cérebro emocional (sistema límbico) do que ao racional (córtex pré-frontal). Ou seja, a gente compra felicidade. Literalmente.
Tem pesquisa publicada no Journal of Consumer Psychology mostrando que o simples ato de comprar algo desejado ativa os mesmos circuitos de dopamina que experiências prazerosas — tipo comer chocolate ou ouvir sua música favorita. O problema? A dopamina é rápida. Passa logo. E aí vem aquele vazio, o “por que eu fiz isso mesmo?” que me dá vontade de devolver tudo e começar do zero.
Eu me sinto muito feliz na hora de gastar, mas depois que a empolgação passa… fico triste. Ultimamente tenho tentado — e conseguido — controlar um pouco mais isso. Mas ainda é difícil não ver o consumo como uma necessidade quase vital. No mundo capitalista que a gente vive, com anúncios e influencers enfiando coisas na nossa cabeça o tempo todo, parece impossível não querer algo novo, algo que te faça sentir importante, especial, única — por cinco minutos.
Se eu fosse listar minha maior burrada financeira, seria fácil: emprestar dinheiro. Não importa quão triste é a história, quão convincente é o olhar do outro ou quão bonita parece a minha generosidade. Na real, quase sempre acaba em culpa, ressentimento ou prejuízo. Então fica aqui o primeiro aprendizado adulto real oficial: não empreste dinheiro. Dê, se quiser e puder. Mas emprestar é quase sempre convite pra dor de cabeça.
Já o maior orgulho financeiro… talvez eu ainda não tenha encontrado. O que sei é que quero muito aprender a guardar dinheiro, a não ver o consumo como anestesia, a parar de me enganar com microfelicidades compradas no débito. Só que crescer financeiramente é, antes de tudo, crescer emocionalmente. E isso, meu Deus, é tão mais difícil do que parece.
Aliás, tem outro estudo curioso da University of British Columbia que mostra que gastamos mais facilmente com status ou aprovação social do que com coisas realmente úteis. Isso explica por que é tão difícil resistir ao vestido que te faz sentir uma CEO da vida perfeita no Instagram, mas tão fácil adiar um plano de previdência.
No fim, dinheiro não é só número. É história, é infância, é autoestima, é medo de perder, é prazer imediato. E se tem uma coisa que tenho tentado fazer é olhar pra tudo isso com mais sinceridade. Perguntar: por que eu quero isso agora? vai me trazer paz depois ou só uma descarga rápida de felicidade que vai me deixar triste na terça? eu posso mesmo ou só tô tentando tapar um buraco?
Talvez, um dia, eu aprenda a me responder com mais clareza. Enquanto isso, sigo tropeçando nas mesmas armadilhas, só que agora mais consciente. E isso, no meu mundinho, já é um tipo de vitória.
No fim das contas, acho que tá todo mundo tentando dar sentido pro dinheiro do mesmo jeito que tenta dar sentido pra vida. Uns compram pra se sentir amados, outros guardam pra não se sentir vulneráveis, outros simplesmente gastam porque é mais fácil do que encarar o que tá faltando por dentro.
Se você também tá nesse meio do caminho, tentando equilibrar o que quer com o que pode, o que sente com o que mostra pros outros… bem-vindo. A gente tá junto nesse tropeço — aprendendo, errando e, de vez em quando, acertando.
Dessa necessidade de ter sempre a última palavra, mesmo que ela venha embalada em razão e dor.
Abriria mão de provar ponto.
De convencer quem não quer escutar, de me justificar pra quem já decidiu me julgar.
Abriria mão do controle — ou ao menos tentaria.
De querer que tudo aconteça no meu tempo, do meu jeito, com o roteiro que escrevi na cabeça. Porque a vida ri da gente quando a gente tenta ser diretora do que só se vive improvisando.
Abriria mão de relações que apertam, mesmo que venham com laços bonitos.
Abriria mão de respostas imediatas, de mensagens que tiram o sono, de conversas que drenam e não levam a lugar nenhum.
Abriria mão da imagem perfeita, da máscara funcional, da performance emocional.
Tudo isso — e mais um pouco — só pra ter de volta o que ninguém compra e ninguém finge:
paz de alma.
Daquela que deita com você no travesseiro e sussurra: você está onde deveria estar.
Tem uma parte minha que vive num eterno teatrinho mental tentando agradar todo mundo. Um lado fofo, educado, que quer ser a melhor anfitriã do mundo até pra quem não pedi pra entrar na minha vida. Esse lado sonha com aprovação, tapinhas nas costas e o clássico “ai como ela é querida”.
Mas aí, graças a Deus (ou sei lá que força cósmica cuida da minha reputação), tem o outro lado. O lado que solta um risinho quase orgulhoso quando descobre que certas pessoas não gostam de mim. Porque, francamente, ser bem-quista por gente que eu jamais seria me dá calafrios existenciais.
Tem gente que, se gostasse de mim, ia me fazer questionar seriamente meu caráter. Ia me olhar no espelho e perguntar: “Você virou quem, pra essa pessoa te aprovar?” E a resposta viria em tom de alerta vermelho piscando: “Alguém que você não é.”
Então eu sigo: entre agradar o mundo e ficar em paz comigo, escolho (quase sempre) a segunda opção. E me consolo lembrando que até a mais suculenta das maçãs tem quem torça o nariz porque prefere banana. (Eu, no caso, sou meio maçã azeda, meio maracujá dramático, e tá tudo bem.)
No fim, se algumas pessoas não gostam de mim, considero um elogio. Talvez seja o universo me dizendo:
“Fica tranquila, você tá segura. Não corre o risco de ser igual a eles.”
Ontem eu assisti a um filme que, sinceramente, me fez querer tomar um banho gelado de realidade. “A Ilha”, já viu? É basicamente sobre gente bilionária que decide comprar clones — humanos mesmo, inteiros, bonitinhos, respirando, andando, sonhando — só pra, caso precise de um rim, ou de um pedaço de pele pra esticar o rosto, ter à mão. Como quem tem um freezer extra na cozinha pra guardar carne.
A parte mais chocante nem foi o laboratório de clones, nem as cirurgias, nem o carrossel de corpos. A parte mais chocante foi perceber como é absurdo… e ao mesmo tempo como é perfeitamente plausível. Porque, vamos combinar, o que impede alguém com dinheiro infinito de fazer o que bem entender? Um papel escrito “Constituição”? A ONU batendo palminha numa conferência? Ah tá.
No filme, o bilionário descobre que o clone tem consciência, que sente, que sofre, que tem medo de morrer. E o que ele faz? Basicamente diz: — Foda-se. Eu paguei. É meu. Eu quero viver. Que morra ele. Simples assim. A parte do cérebro dele que liga empatia foi desativada por excesso de zeros na conta bancária.
E aí, claro, minha cabeça deu aquela explodida desconfortável no travesseiro:
E se isso já existir? E se, enquanto eu tô aqui me afundando num Netflix e tentando pagar o boleto do cartão, tem alguém num lugar que eu nunca vou pisar, assinando um contrato confidencial pra encomendar um clone pra “fins terapêuticos”?
Porque esse é o ponto mais perturbador de todos: se gente assim quisesse, o mundo nem ia ficar sabendo. Ia continuar girando, bonitinho, com stories de brunch e pet influencers, enquanto em algum subterrâneo de laboratório caro, tem alguém crescendo num tubo, só esperando ser fatiado pra salvar o “original”. A gente não ia nem sonhar.
E o pior é que, no fundo, a gente já normaliza horrores parecidos todo dia. Com quem costura a nossa roupa por 3 centavos na Ásia. Com quem cava o lítio do nosso celular morrendo de fome na África. Com quem limpa nosso prédio invisível, sem nem um bom dia.
É tudo tão absurdo quanto. Só que a gente chama de “economia globalizada”.
No fim, fiquei ali, meio sem ar, pensando que talvez a única diferença entre o clone e a gente seja que, pelo menos, a gente tem a ilusão de que é livre. E olha lá.
Hoje eu entendi, Deus. Entendi que às vezes o Senhor não muda a situação porque está ocupado demais mudando o meu coração.
Eu podia jurar que era só o vinho. Mas não era só o vinho. Era o ambiente, o peso que pairava no ar, as pequenas farpas invisíveis que entraram sem pedir licença. Meu corpo vomitou tanto, mas tanto, que chegou o gosto amargo do estômago vazio. E minha ametista escureceu no dedo, silenciosa, carregando pra si o que eu não dei conta de sustentar.
Foi Jung quem disse que o corpo fala o que a alma cala. Ontem, meu corpo gritou. Gritou tudo aquilo que eu mesma não tinha coragem de expurgar em palavras. Foi feio, foi desconfortável, mas foi também necessário. Uma purificação crua, sem incenso, sem velas — só suor, lágrima e a estranha misericórdia que há nos processos doloridos.
Hoje eu acordei meio mole, mas incrivelmente mais leve. Como se o Senhor tivesse me limpado por dentro, retirado pesos antigos, toxinas velhas, até pensamentos que não eram meus. E percebi que talvez a situação ainda demore a mudar. Mas se o Senhor mudar meu coração, já é tudo. Porque quando o coração muda, o olhar muda, o jeito de caminhar muda, e até o que antes me feria perde o efeito.
Então obrigada. Pela dor que ensinou, pelo corpo que expulsou, pelas pedras que seguraram o que não era meu. E por esse coração novo que o Senhor está me dando, mais livre, mais Seu.
desde criança eu vejo isso. qualquer desenho americano, europeu, japa — tanto faz. sempre tem um índio rodando em círculo, batendo tambor, dançando pra fazer chover. todo mundo acha fofo. excêntrico. “olha só, esses selvagens acham que conversam com as nuvens.” claro, é só folclore.
até que você cresce e descobre que no brasil existe a fundação cacique cobra coral, que faz a mesmíssima coisa — mas com contrato, CNPJ, e releases pra imprensa. diz canalizar o espírito de um cacique ancestral (que supostamente já foi galileu e abraham lincoln, porque por que não?). e que tem, ou já teve, paulo coelho como vice-presidente. sim, o mesmo paulo coelho que fez pacto de sangue com raul seixas, que adorava aleister crowley e pregava o “faze o que tu queres”. pois é, esse mesmo.
e o melhor vem agora: recentemente, eles romperam 50% do “acordo climático espiritual” com os estados unidos. motivo? trump meteu uma tarifa de 50% no aço brasileiro e eles decidiram: “ok, então vocês também vão ficar 50% sem nossa ‘proteção contra catástrofes naturais’.” e não é que o tempo fechou por lá? alertas de tornados, enchentes, caos aéreo. coincidência? ah, o universo adora brincar de coincidência.
igual foi “coincidência” o mega show da madonna em copacabana — palco cravejado de cruz invertida, coroa de espinhos, dançarinos fingindo crucificação — acontecer enquanto o rio grande do sul afundava na maior tragédia climática da história deles. detalhe: previsão era de chuva no rio, mas, claro… não choveu. parece que o cacique também tem gosto musical.
mas eu não sei. ou sei demais. porque jung já dizia que “quando o inconsciente é negligenciado, ele se manifesta como destino.” ou seja, aquilo que você não quer olhar, volta. o que você tenta controlar, escapa pela porta dos fundos. o universo tem horror a pendências. mexe numa ponta, balança a outra. ônus e bônus, débito e crédito, o mesmo livro-caixa invisível que ninguém audita, mas todo mundo paga.
hildegarda falava que “a alma é sinfonia viva.” pois é, e a gente insiste em desafinar. quer controlar o clima, o amor, o carma, o trânsito na linha amarela. quer fazer chover só no quintal do vizinho. mas esquece que, no fundo, a vida tem uma partitura própria — e cobra caro de quem tenta rasgar a pauta.
e nietzsche? ah, ele riria de canto de boca e soltaria um “cuidado pra não dançar demais com teus deuses, porque eles podem te devorar no bis.”
no fim das contas, é meio isso: rimos dos índios dançando pra fazer chover nos desenhos, mas corremos pra médium do cacique pra segurar o temporal no réveillon. gastamos fortuna em show com performance “meio satânica mas só de brincadeira” e depois fingimos surpresa quando o outro lado do país é levado pela correnteza. fingimos que é só “tempo”. só “clima”. só “política”.
mas eu não sei. ou sei e preferia não saber. porque viver é isso: ficar rodando em círculos em volta do que a gente não entende, torcendo pra conta do universo cair no e-mail errado.
no fim, todo mundo dança a dança da chuva. só muda o figurino.
Toda sexta tem texto novo dessa série aqui. Então se você, assim como eu, tá tentando virar adulto sem se sentir um completo fracasso, volta na próxima semana. A gente tropeça, ri, chora e tenta de novo — juntos.
Eu penso tão diferente de quando tinha 20 anos que às vezes tenho vontade de ligar praquela eu do passado e dizer: “Amiga, você não faz ideia. E, honestamente, nem eu.”
A verdade é que sinto que tô passando pela crise dos trinta já faz uns dois anos — sendo que só faço 30 no ano que vem. É meio patético e ao mesmo tempo tão normal que até a neurociência explica: o córtex pré-frontal, que regula nosso controle emocional, decisões e planejamento, só termina de amadurecer lá pelos 30. Então talvez eu não seja tão disfuncional assim, só neurobiologicamente atrasada.
O problema é que junto com essa tal maturidade cerebral vem o autoconhecimento, a inteligência emocional, e toda a bagunça que isso traz. É um caminho árduo, porque quase sempre envolve desconstruir uns pré-conceitos que a gente carregou a vida toda, às vezes nem eram nossos. E é difícil alinhar realidade com expectativa quando as expectativas foram absurdas desde o início. Tipo querer um corpo de top model, uma conta bancária de herdeira e uma serenidade de monge budista, morando no interior e pagando boleto como qualquer mortal.
Ainda tô aprendendo a nomear minhas emoções, a entender quando é raiva, quando é tristeza disfarçada, quando é só fome. E, principalmente, a reagir melhor às coisas que fogem completamente do meu controle — que por sinal são quase todas. Mas confesso que às vezes ainda me sinto uma criança mimada, batendo o pezinho no chão porque o mundo não faz o que eu quero.
O mais curioso é esse contraste: me sinto velha pra algumas coisas, tipo baladas até o amanhecer, e ao mesmo tempo ainda tenho medos de adolescente, como se fosse engravidar na adolescência — sendo que, oi, já tenho 29 anos. Talvez amadurecer seja justamente isso: viver em eterno paradoxo, entre o que a gente acha que deveria ser e o que de fato é. Entre o que morreu lá atrás e o que ainda tá nascendo aqui dentro.
No fim, meu cérebro tá terminando de se organizar, mas meu coração continua tentando entender o que diabos fazer com esse quebra-cabeça chamado vida adulta. E talvez, só talvez, esteja tudo bem assim.
No fim, acho que tá todo mundo meio assim — tentando equilibrar sonhos gigantes com realidades pequenas, expectativas infantis com boletos adultos, medos bobos com coragem que nem sabe de onde vem.
Então, se você também se sente meio criança, meio velha, meio confusa, meio forte… fica. A gente cresce junto, tropeçando nas mesmas dúvidas, rindo dos mesmos absurdos, e aprendendo devagar que ser adulto não é ter todas as respostas — é só continuar perguntando com o coração aberto.
Às vezes penso que o Raul Seixas foi só um Nietzsche sem supervisão terapêutica. Um Jung sem mandala pra se centrar. Um Davi sem Deus pra segurar a onda. Ele abriu a cabeça, o coração, a alma — e esqueceu de ter um lugar seguro pra voltar depois. E aí o abismo olhou de volta (Nietzsche que o diga) e tragou ele inteiro.
Jung dizia: “Aquilo que você mais precisa será encontrado onde você menos quer olhar.” Raul olhou, fuçou, revirou, fez samba com o demônio e rock com a filosofia barata. Mas não tinha estrutura. Não tinha âncora. Não tinha chão. Talvez tenha tido fé em algum momento, mas foi uma fé tão bagunçada que virou confusão mental.
E aí morreu só, doente, cantando “eu não sou besta pra tirar onda de herói”, mas sendo a personificação trágica do herói caído. Não acho bonito. Não romantizo. Acho triste. Fraco. Ele foi forte pra escrever versos geniais, mas fraco pra cuidar do próprio corpo e da própria alma.
E aí volto pra mim — porque tudo volta pra gente, né? Eu fui, eu sou, eu vou. Mas pra onde? Pra quem? Com quem? Será que não tô me metendo em perguntas demais só pra não encarar o básico — o feijão com arroz da vida — tipo amar sem tanto manual, ter paz, trabalhar direitinho, fazer uns planos, confiar em Deus? Às vezes me pergunto se questionar tanto é evolução ou só medo disfarçado de intelectualidade.
A Bíblia fala: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” Mas a verdade também dói. Às vezes liberta, às vezes te deixa pelada no meio da rua, segurando as próprias entranhas, tipo: olha aí quem você é de verdade. Raul conheceu algumas verdades, mas não sei se foi liberto ou só enlouqueceu.
Eu não quero isso pra mim. Eu fui, eu sou, eu vou — mas quero ir viva, inteira, simples até, se for preciso. Sem precisar virar mito pra ser lembrada. Com minha paz (meio torta, meio linda) intacta.
Sabe aqueles dias em que o mundo parece um lugar especialmente cruel? Quando tudo dá errado, gente ruim prospera, gente boa se arrebenta, e você pensa: “qual é a lógica disso aqui?”
Então, respira. Porque, sinceramente? Às vezes não tem lógica nenhuma mesmo.
Não é sobre karma instantâneo, não é sobre justiça cósmica que se faz em três dias úteis. Tem coisa que só vai se encaixar num plano maior que a gente não alcança — e pode até ser que só faça sentido depois que esse corpo aqui virar poeira de estrela.
Mas ó, isso não quer dizer que você tem que sair por aí anestesiado, fingindo que não sente. Pode ficar triste sim. Pode ficar puto, pode chorar no travesseiro, pode questionar Deus no meio da madrugada. Ele aguenta. Aliás, acho até que Ele gosta desse papo honesto.
Só não deixa essa dor te endurecer por dentro, virar cinismo. Não deixa o coração ficar tão ferido que você comece a achar bonito ser frio. Porque não é.
Ser duro demais é só outra forma de desistir.
Então, mesmo quando o mundo parecer injusto — e ele vai parecer muitas vezes — escolhe continuar bom. Escolhe continuar leve. Escolhe continuar amor.
Porque a vida tem uma mania estranha de dar voltas que a gente não espera, e às vezes o que parecia castigo é só estrada torta te levando pro lugar certo.
No fim, é isso: a gente não tá aqui pra entender tudo. Tá aqui pra sentir, viver, aprender a ter fé e, quem sabe, deixar um rastro de luz nesse caos todo.
Sabe o que me atormenta às vezes? Esse medo bobo de estar indo pelo caminho errado.
Como se existisse uma placa em algum lugar escrito “Bruna, é por aqui, sua tonta” e eu, claro, tivesse passado direto porque estava distraída pensando no que sentir.
Eu queria um Waze da alma, com voz suave me dizendo:
— Em 200 metros, abrace sua coragem.
— Mantenha-se à esquerda e continue sonhando.
— Recalculando…
Mas não tem. O que tem é esse coração que bate meio torto, mas insiste em me empurrar pra frente.
Mesmo quando tudo parece dar errado, mesmo quando o corpo cansa, ele sussurra baixinho: continua.
E eu continuo. Meio sem entender, meio tropeçando, mas continuo.
Descobri que a tal direção certa não tem nada a ver com o cenário.
Às vezes você tá quebrada, falida, sozinha — e ainda assim, estranhamente, sente paz.
Porque tem algo alinhado lá dentro que o mundo de fora não consegue medir.
Outras vezes, tá tudo lindo no Instagram, mas por dentro mora um buraco que engole qualquer felicidade.
E é aí que percebo: o caminho certo não é o mais fácil, nem o mais florido. É só aquele onde o passo seguinte faz sentido, mesmo quando não faz.
Então não, não tem certeza.
Tem só uma sensação esquisita de estar viva, indo.
Toda sexta tem texto novo dessa série aqui. Então se você, assim como eu, tá tentando virar adulto sem se sentir um completo fracasso, volta na próxima semana. A gente tropeça, ri, chora e tenta de novo — juntos.
Escrever e pesquisar me ajudam a evoluir.
Talvez esse seja o único caminho que encontrei pra não surtar de vez: entender por que sinto o que sinto, por que faço o que faço, por que às vezes acordo tão leve e outras tão esmagada pelo peso do mundo.
Essa série nasceu disso, de uma tentativa honesta (e um tanto desesperada) de me tornar alguém melhor, ou pelo menos menos confusa. Quero decifrar o cérebro, o coração, os medos e as manias. Quero me desconstruir, me reconstruir, me olhar com mais gentileza. E, quem sabe, ajudar você a fazer o mesmo.
Porque eu sei que não tô sozinha.
Se você também se sente meio criança mimada, meio adulta cansada; meio sábia, meio completamente perdida… então esse espaço é pra gente.
Pra rir da nossa bagunça interna, pra questionar o que disseram que era certo, pra entender que não ter todas as respostas é o normal e que, no fundo, ninguém tem.
Vamos tropeçar juntos nesse caminho torto chamado vida adulta.
Com o coração aberto, o olhar curioso e a coragem suave de quem se permite continuar perguntando.
No fim, talvez crescer não seja chegar em algum luga, mas só seguir caminhando, carregando as perguntas e espalhando flores pelo caminho.
Tem dias em que eu me pego pensando que a gente está vivendo uma nova Torre de Babel.
Só que agora a torre é invisível.
Feita de tela, de ego, de curtida.
Uma torre digital que a gente sobe achando que vai encontrar o céu — mas só encontra mais gente parecida com a gente mesmo.
No Gênesis, todo mundo falava a mesma língua.
E resolveram construir uma torre que chegasse até Deus.
Mas não porque queriam estar com Ele.
Queriam provar que não precisavam Dele.
A torre foi crescendo…
E Deus desceu.
Viu o que estavam fazendo.
E bagunçou tudo.
Confundiu as línguas.
Espalhou o povo.
Desfez a obra.
E eu me pergunto: será que Ele não está fazendo isso de novo?
Hoje a gente não precisa mais construir torres de tijolo.
A gente ergue bolhas.
Bolhas de pensamento.
De opinião.
De filtro.
De algoritmo.
A gente diz que quer conexão, mas só aceita o que confirma o que a gente já acredita.
Todo mundo querendo falar, mas ninguém disposto a escutar.
Todo mundo buscando uma verdade, mas cancelando quem apresenta outra.
Eu mesma já estive em bolhas assim.
Onde só entrava quem concordava.
Onde todo mundo aplaudia, mas ninguém me transformava.
Até que um dia… Deus confundiu tudo.
Me tirou da torre.
Me fez ouvir outra língua.
Me desconfortou.
E talvez tenha sido ali que eu mais cresci.
Tem hora que o algoritmo desanda não porque você errou, mas porque Deus cansou de te ver tentando tocar o céu com conteúdo vazio.
Tem hora que a queda de engajamento é só Deus te chamando de volta pra essência.
Pra escutar.
Pra se reconectar.
Pra deixar de ser torre e voltar a ser templo.
✝️ Oremos:
Senhor, quebra as torres que construí em nome do meu ego. Esvazia minhas bolhas. Ensina-me a amar quem pensa diferente. Dá-me coragem pra sair do meu algoritmo pessoal e escutar a Tua voz, mesmo quando ela vier disfarçada de silêncio. Se for preciso confundir minha língua pra que eu volte pro Teu caminho… então que seja. Porque só Tua verdade é absoluta. E só Teu Reino é eterno. Amém.
Parece que o mundo inteiro tá com pressa pra enfiar você dentro de uma caixa bonita, etiquetada e com um lacinho que diga: “esse aqui já sabe o que vai ser quando crescer.”
Mas deixa eu te falar uma coisa que ninguém tem coragem de dizer:
você não precisa saber. Não agora. Talvez nunca do jeito que eles esperam.
A vida não é esse currículo impecável do LinkedIn, nem aquela bio de Instagram toda organizada por emoji. A vida é meio torta, meio incerta, cheia de rasuras. É um monte de perguntas sem resposta. E adivinha? Tá tudo bem.
Você pode querer ser astronauta hoje, abrir uma padaria amanhã, virar poeta aos 30 e descobrir que na real o que te faz feliz mesmo é cuidar de plantas, escrever bobagens profundas às três da manhã ou dançar no meio da sala sem plateia.
Você não precisa correr pra lugar nenhum.
Nem provar nada pra ninguém.
Então quando te perguntarem o que você vai ser quando crescer, fala:
— “sei lá, feliz talvez… ou só eu mesmo, mas com menos medo.”
Porque, no fundo, é só isso que importa.
O resto a gente vai tropeçando, chorando no banheiro, dando risada de nervoso e aprendendo pelo caminho. E pode ficar tranquilo: tem um Deus, absurdamente amoroso, segurando sua mão o tempo todo, mesmo quando você cisma de soltar.
Outro dia me peguei pensando se esse meu hábito de cavar sentido em tudo é benção ou cilada.
Se esse jeito de sondar o invisível, fuçar silêncio e farejar nuances é um dom espiritual ou só o meu jeito preferido de enlouquecer com classe.
Tem gente que vive no raso, e olha — admiro. Deve ser confortável. Tipo nadar de boia na piscina infantil, sem o risco de afundar. Eu não. Eu quero é saber se tem monstro lá no fundo, se o ladrilho do azulejo tem rachadura, se aquela folha que boia tem uma história triste.
Chamam isso de consciência ampliada, mas às vezes acho só um outro nome pra ansiedade gourmet.
Porque o preço de enxergar além é também inventar além. E daí, confesso: fico tateando pra distinguir quando é intuição e quando é só a paranoia de sempre dando bom dia.
A intuição chega suave. Não levanta a voz, não faz escândalo. É quase como se dissesse “confia em mim” e fosse embora. Já a paranoia, coitada, berra, agita, arrasta correntes e me obriga a perder o sono.
Mas vai explicar isso pra cabeça que insiste em dramatizar?
No fim, vivo assim: meio xamã, meio neurótica. Meio bruxa, meio vítima. Me achando sábia enquanto me enrosco nos próprios nós.
E sigo torcendo pra que no meio dessa bagunça, o que realmente seja voz da alma não passe despercebido.
Porque se tem uma coisa que aprendi, é que o invisível fala baixo. E, por ironia, a gente vive fazendo barulho demais pra ouvir.
Eu sempre gostei de chá. Desde bebê, minha mãe conta que eu virava mamadeiras enormes sem reclamar, como quem já sabia que aquilo fazia bem. Cresci trocando café por chá na adolescência — não porque era mais saudável, mas porque era mais meu. No Outback, nem preciso olhar o cardápio: se tiver chá gelado, já me ganhou. Aliás, em qualquer restaurante. Chá é minha escolha número um antes mesmo de pensar em sobremesa.
Mas essa semana foi diferente. Essa semana, acho que eu transcendi o chá. Passei de quem toma, pra quem aprecia. Fiz um chá de camomila e o cheiro me parou. Parou pensamento, parou ansiedade, parou o tempo. Sentei, segurei a xícara quente com as duas mãos e, sem perceber, entrei em estado meditativo. Só eu, o vapor subindo, e o cheiro me abraçando.
Foram minutos de prazer quase sagrado. Me aqueci, me nutri e me acalmei — tudo isso sem precisar falar nada. E aí entendi: o chá não é só uma bebida. É um ritual. Um afago. Um silêncio gostoso entre uma coisa e outra. Uma forma de dizer pra mim mesma: “você merece esse cuidado”.
E não sou só eu que penso assim. Na cultura japonesa, a cerimônia do chá (chanoyu) é considerada uma arte meditativa, quase espiritual — uma coreografia de atenção plena. Já os britânicos, mestres na pausa para o “tea time”, juram que tudo melhora depois de uma boa xícara de chá. E, segundo a ciência, eles podem estar certos: estudos mostram que o ato de preparar e saborear o chá pode reduzir o cortisol, ativar estados de relaxamento e até induzir leve liberação de dopamina — aquele prazer manso que a gente não sabe explicar, mas sente no corpo.
Nunca achei que fosse me apaixonar por um molho. Muito menos um com vodka, que sempre me deu mais ressaca do que romance.
Mas então veio ele. Um rigatoni rechonchudo, embebido num molho cor-de-pecado, com cheiro de abraço quente e gosto de coisa que a gente quer repetir antes mesmo de terminar.
Fiz num jantar qualquer, de uma quarta-feira cansada. Aquela hora do dia em que a gente já desistiu do mundo, do cabelo, da dieta e da vida adulta. E aí a cebola começou a dourar na manteiga. O alho entrou de mansinho. A vodka evaporou o caos. E quando o tomate pelado se derreteu no creme de leite, algo em mim também derreteu.
Tem prato que é só comida. Mas esse não. Esse é um ato de fé.
É o tipo de receita que parece simples, mas exige entrega. Você tem que acreditar que o molho vai engrossar. Que o álcool vai embora. Que os sabores vão se entender mesmo vindo de mundos tão diferentes. É quase um casamento. Com menos briga e mais parmesão.
A vodka não adoça de verdade. Mas ela faz o tomate ficar mais doce. Faz o molho ficar mais suave. Faz tudo parecer mais poético.
Talvez, no fundo, a gente também precise de um gole de coragem pra amolecer o que ficou ácido demais na alma.
Desde então, tenho repetido essa receita como quem reza. Como quem busca conforto no ritual de cortar, mexer, esperar. Como quem entende, enfim, que a cozinha também pode ser um lugar de cura. E que certos pratos não são só pra matar a fome, mas pra lembrar a gente de que o prazer é sagrado.
Então, se você estiver perdida, cansada ou só com vontade de se dar um carinho honesto… Faz esse rigatoni. E deixa ele te amar do jeito que ninguém mais conseguiu hoje.
– b. monma
🍝 Receita: Rigatoni alla Vodka
Ingredientes:
250g de rigatoni
1 colher (sopa) de azeite de oliva
1 colher (sopa) de manteiga
1/2 cebola picada
2 dentes de alho picados
1/2 xícara de vodka
1 lata de tomates pelados (esmagados à mão com paixão)
1/2 xícara de creme de leite fresco
Parmesão ralado na hora
Sal, pimenta-do-reino e pimenta calabresa (se quiser drama)
Manjericão fresco pra fingir que é da Toscana
Modo de preparo:
Cozinhe o macarrão em água salgada até ficar al dente.
Enquanto isso, refogue a cebola no azeite e manteiga até ficar translúcida.
Adicione o alho. Mexa por 1 minuto.
Entre com a vodka. Deixe ferver e evaporar.
Coloque os tomates pelados amassados. Cozinhe uns 5 minutos.
Abaixe o fogo. Acrescente o creme de leite e tempere.
Misture o rigatoni cozido no molho, finalize com parmesão e manjericão.
Bruna não nasceu pra ter paz, mas também não nasceu pra ter tédio.
Ela vive num eterno entre: entre o salto e o chinelo, entre o trauma e a cura, entre escrever um livro ou sumir no litoral com o celular desligado.
Ela acredita em Deus, em sincronicidades, na Bíblia, em Yoko Ono e às vezes até em si mesma (quando dorme bem).
Tem crises existenciais antes do café e momentos de iluminação enquanto corta legumes.
Já cogitou virar monja. Também já cogitou abrir um e-commerce de moda com peças fluídas que representem o espírito livre da mulher que ela mesma tenta ser.
Entre uma coisa e outra, escreveu uma crônica.
Bruna é o tipo de mulher que escuta Pink Floyd numa terça e MC Danni numa quarta, e ainda vê um sentido espiritual em tudo isso.
Seus sonhos são roteiros complexos: tem traição, revelação, talvez um duelo de espadas e uma nuvem que parece o avô.
Freud morreria de novo.
Jung pediria um café, puxaria uma cadeira e perguntaria:
— Você sonha assim toda semana?
A resposta seria sim.
E teria anotações, hashtags, e talvez uma crônica em rascunho no Notes.
Bruna sente muito. Por ela, pelos outros, pelos que foram e pelos que ainda vão decepcioná-la.
Ela é uma colecionadora de sensações. Uma leitora da vida com olhos de quem repara demais.
Se alguém respira torto, ela nota.
Se alguém ama torto, ela escreve.
Às vezes se pergunta se devia ter sido outra coisa.
Mais firme. Mais prática. Mais “mulher de planilhas”.
Mas aí lembra que quando tenta ser só racional, fica doente.
O corpo sente.
A alma protesta.
Então ela volta a escrever, a rir, a chorar ouvindo música, a transformar sua confusão em arte.
É do The Smiths, claro. Porque, assim como ele, a música tem esse jeito meio triste, meio poético, meio profundo — e totalmente clássico. “To die by your side is such a heavenly way to die”.
Pois é. A nossa é The Light That Never Goes Out.
E talvez porque ele sempre foi exatamente isso pra mim: uma luz que nunca se apaga. Mesmo quando a minha só pisca.
Meu pai acredita em mim de um jeito que, às vezes, me irrita.
Tipo: como você pode ter tanta certeza, pai?
Quando nem eu tenho.
Ontem ele me disse, do nada, que pensou uma coisa:
— “Bruna, você devia escrever sobre espiritualidade. Acho que você se daria bem. Você é muito espiritualizada. E escreve bem.”
Ele nunca leu meu blog.
Mas soube.
Soube porque, talvez, fé mesmo é isso: saber sem ler. Sentir sem ver. Acreditar mesmo sem link.
Fiquei pensando: será que ele pensou isso no mesmo momento em que eu, dias atrás, brinquei com a minha irmã sobre os papéis numa família?
Falei que toda família de sucesso tem:
Um filho médico, advogado ou engenheiro. Um filho que é um relógio (o que segura tudo). E um filho famoso.
Ela é engenheira.
A caçula ainda tá decidindo.
E eu… bom, eu ainda tô entre ser a filha famosa ou a filha que vira guru.
Confesso: tem dia que eu só queria ser a que brilha.
Mas talvez eu tenha sido feita mesmo pra iluminar.
E se meu pai viu isso antes de mim…
então talvez The Light That Never Goes Out seja menos uma música e mais uma profecia.
Porque a verdade é essa: meu pai nunca me deixou no escuro.
Você ora, acredita, agradece antes de receber, segura firme. E nada. Os anos passam e você vai ficando meio cínica, meio desconfiada, meio cansada de se frustrar.
Foi mais ou menos assim com Sara. Deus tinha prometido um filho. Disse que dela sairia uma grande nação. Mas ela envelhecia… E o ventre dela seguia vazio.
E aí acontece aquilo que a gente conhece bem: a tentativa de “ajudar” Deus. Sara, já velha e sem esperanças, entrega sua serva Hagar para dormir com Abraão. E assim nasce Ismael. Não era o plano original. Mas foi o plano humano.
Só que Deus não esquece o que promete. Mesmo que a gente tente apressar. Mesmo que a gente tente dar um jeitinho.
Aos 99 anos, Sara engravida. E Isaac nasce.
Mas agora tem dois meninos. Duas histórias. Dois futuros.
E a promessa virou confusão.
Até hoje, judeus e árabes carregam essa divisão ancestral. Ambos filhos de Abraão. Ambos abençoados. Mas separados por uma ansiedade.
Tudo por causa de uma pressa. Tudo porque a fé vacilou no meio do caminho.
Às vezes eu penso nisso quando me vejo tentando resolver as coisas na força. Tentando dar nome, forma, data pra promessas que ainda estão germinando no invisível. Tentando garantir com a lógica o que Deus quer fazer com o impossível.
Quantos Ismaéis eu já gerei? Quantas histórias eu inventei por medo de esperar a verdadeira?
✝️ Oremos:
Senhor, me dá a fé de Abraão, mas principalmente a paciência que Sara não teve. Me ensina a não me sabotar no desespero de ver as coisas acontecerem do meu jeito. Me lembra que o que é Tua vontade não se perde. Que a promessa não expira. E que mesmo se eu bagunçar tudo… O Teu plano ainda me alcança. Amém.
Vocês que cresceram no meio de sirenes, telas e previsões sombrias. Que escutam sobre guerras antes mesmo de aprender a lidar com as próprias emoções. Que veem vídeos no TikTok dizendo que o mundo vai acabar, enquanto só queriam entender como o mundo começa.
Essa carta é pra vocês.
Eu sei que parece que tudo está desabando.
E eu entendo esse medo — porque eu também já tive 12 anos.
E, naquela época, minha mãe me contava as histórias do livro do Apocalipse. Falava dos selos, das bestas, das trombetas… e eu, que ainda sonhava com o primeiro amor, com meus futuros filhos, com a faculdade… ficava paralisada de medo. Um medo angustiante, silencioso, que tirava o sono e a paz.
Como seguir a vida com a sensação de que ela pode acabar antes de acontecer?
Mas deixa eu te contar uma coisa:
a minha geração já ouviu que o mundo ia acabar muitas vezes.
Ano 2000. Depois 2012. Depois uma pandemia. E agora, as guerras, as mudanças climáticas, os colapsos emocionais que parecem vir em ondas.
E mesmo assim, de algum jeito, o mundo… continuou.
Cicatrizado em partes, sim. Mas continuou.
E foi aí que eu entendi uma coisa:
O mundo não acaba de uma vez. Ele se transforma.
E se um dia ele realmente acabar — como está escrito, como anunciam os sinais — quem carrega o bem no coração, quem vive com amor, quem tenta ser justo mesmo errando às vezes… vai encontrar a promessa do Criador.
Vai viver a vida eterna.
Vai chegar num lugar onde não há mais dor nem medo.
E isso também é uma continuação.
Então, se você tá com medo agora, eu quero que saiba:
você não tá sozinho.
Nem maluco. Nem fraco.
Você só é um ser humano sensível demais pra um mundo duro demais.
E tudo bem.
Só respira.
O mundo precisa da sua sensibilidade mais do que nunca.
Enquanto ele existir — e ele ainda existe — você tem o direito de sonhar.
De viver um amor.
De pensar num futuro.
De acreditar que vai melhorar.
Porque, apesar dos apocalipses, o amor sempre resiste.
(ou: uma tentativa de transformar o peito em partitura)
Eu não me lembro da minha vida sem música. Na verdade, acho que nem existi antes dela. Cresci cercada de gente que tinha bom gosto musical — o que já é uma sorte estatística, se você parar pra pensar. Tinha MPB na vitrola do avô, rock clássico na sala dos pais, pop no meu quarto, indie no fone. Fui criada por trilhas sonoras.
Sempre fui daquelas que sente tudo. Tudo mesmo. E quando você sente tudo, ou você enlouquece… ou coloca uma música pra tocar. Sons me atravessam. Frequências me curam. Barulhos me enlouquecem. Música me ancora. Me conecta comigo, com o que fui, com o que nem sei que sou. Tem música que tem cheiro de saudade, outras me deixam em estado de euforia tipo final de novela boa, e tem aquelas que só de tocar já me fazem chorar como se tivessem acabado de me largar no altar. (Mesmo eu nunca tendo sido noiva abandonada.)
Eu escuto música de todo jeito: no carro, no fone, na TV, no banho, deitada, dançando sozinha na sala, fugindo de mim mesma ou tentando me encontrar. Porque, às vezes, uma música é só um fundo sonoro. Mas, às vezes, ela é tudo o que sobrou quando o resto foi embora.
Tem músicas que me transportam direto pro túnel do tempo, sem aviso prévio. Sit Next To Me, do Foster the People, me leva pra 2018 como se fosse carona. My Boo, do Usher, me joga numa praia da infância com a minha família. Sirens, do Monolink, me faz lembrar dos rolês de carro com o meu melhor amigo — onde tudo parecia possível e meio proibido também. E Água de Beber, do Tom Jobim, tem cheiro da casa dos meus avós. Cheiro de quando ele ainda estava aqui.
Teve uma vez, numa rave do Alok (sim, esse manifesto tem rave também), que eu tava no fundo do poço — e ele tocou Ai Ai Ai, da Vanessa da Mata. E começou a chover. Foi tão simbólico, tão cena de filme, que eu quis levantar e agradecer a Deus, ao DJ e à meteorologia. Às vezes, uma música toca e parece que o universo tá tentando te salvar discretamente.
Essa série nasceu disso. Dessa vontade de transformar canções em crônicas, sensações em palavras, lembranças em playlist. Porque a música não é só som — é memória comprimida em três minutos e vinte segundos. É o jeito mais bonito que eu conheço de voltar pra mim mesma sem GPS.
Também já produzi algumas músicas, mas isso… isso é assunto pra outro texto. Um mais íntimo, mais cru, mais meu.
Essa série é pra quem já se apaixonou por alguém só porque ele tinha uma playlist boa.
Pra quem chora em silêncio com fone no ouvido.
Pra quem acredita que certas músicas foram feitas pra ela (mesmo que milhões de pessoas pensem o mesmo).
Aqui, vou escrever sobre o que escuto — e sobre o que a música me faz escutar de mim.
Sempre me acharam meio patricinha. Daquelas que usam brinco combinando com o look, que parece que nunca está descabelada e tem uma bolsa que fala por ela. E talvez eu seja mesmo. Meio patricinha. Meio louca. Meio certinha demais. Um Frankenstein feito de gloss, metas e crises existenciais.
É que eu sou um pouquinho de tudo. E ao mesmo tempo, não sou nada do que pensam.
Tem gente que me vê chegando e já inventa a história toda.
“Essa aí é metida.”
“Deve achar que é melhor que todo mundo.”
“Não fala com ninguém, se acha.”
Mas ninguém considera a hipótese mais óbvia: eu sou tímida. Só isso.
Não é pose. É defesa. Não é nariz empinado. É receio.
Porque pra me aproximar de alguém, eu preciso sentir um certo tipo de segurança que não dá pra explicar. Não é sobre ser simpática de cara. É sobre observar primeiro. Sentir o campo. Entender a frequência. Eu sou daquelas que só floresce quando o clima é favorável. Que só se entrega quando sente que pode ser ela mesma sem virar piada.
E, ironicamente, quando eu deixo alguém entrar, descobre que eu sou legal. Que dou risada alto, que falo besteira, que tenho fé em Deus, que invento teorias sobre o universo e que passo horas ouvindo música como se estivesse vivendo um videoclipe dramático. Uma patricinha introspectiva, existencialista e levemente caótica.
Mas isso, só quem fica, vê.
A maioria desiste no primeiro capítulo, achando que já entendeu a história inteira.
E talvez aí esteja a moral: tem gente que só lê o título e já sai falando da autora.
Vocês estão crescendo rápido demais. Com celular na mão, fone no ouvido e crise existencial aos 12.
Sabem de tudo, mas não sabem de quase nada. Falam bonito, mas vivem com medo. Vocês se cobram, se comparam, se cancelam… e se esquecem que ainda são crianças tentando sobreviver num mundo que até os adultos fingem entender.
E a culpa não é só de vocês. A gente errou feio. A gente confundiu dar tudo com dar presença. Colocou vocês no banco de trás, entregou um iPad e disse: “dirige aí tua infância.”
Agora vocês estão aí: ansiosos, exaustos, sensíveis, sobrecarregados. Querendo ser perfeitos pra caber num lugar que nem existe.
Mas deixa eu te contar uma coisa: ninguém aqui nasceu pra agradar algoritmo. Você não é um filtro. Você não é o boletim. Você não é o número de seguidores nem o trauma da sua família.
Você é gente. E gente sente. Gente erra. Gente grita. Gente chora. E tudo bem.
Essa série não é pra passar a mão na cabeça. É pra lembrar que ainda existe colo — e que nem todo carinho vem suave.
Se você é Alfa, essa carta é pra você. Se você é pai, mãe, educador ou adulto que esqueceu como era ter 10 anos e já estar preocupado com o fim do mundo — essa carta também é pra você.
Porque ou a gente começa a conversar de verdade, ou essa geração vai continuar crescendo dentro de um silêncio ensurdecedor.
Eu não quero que a minha irmã cresça achando que viver é um peso. E nem que seus filhos, sobrinhos, alunos ou irmãos pensem isso.
Então eu escrevo. Não pra viralizar. Mas pra tentar salvar o que ainda dá tempo.
Senta. Respira. E lê. Vai doer. Vai curar. Vai abrir espaço.
Eu estava em silêncio. Meditando, o corpo relaxado e a alma aberta. Uma frequência vibrava dentro de mim — não dava pra explicar. Só sentir. E ali, no meio daquela onda invisível, comecei a conversar com Deus.
Disse que daria a minha vida pelas pessoas que eu amo. Disse que faria isso sem hesitar, se isso salvasse pelo menos uma delas. E Deus, que escuta até o que a gente não diz, soprou devagar dentro do meu coração:
“E pelas pessoas que você não ama tanto assim?” “E pelas que você julga, rejeita ou odeia em silêncio?”
Fiquei em silêncio. Engoli a resposta que não vinha. E entendi.
Quanto mais amor — no sentido mais genuíno da palavra — eu tiver por qualquer pessoa, seja ela quem for, mais conectada com o Todo eu estou. Porque amar só os meus é fácil. Mas amar o outro simplesmente porque ele existe… é divino.
Eu talvez nunca consiga ser essa versão plena o tempo todo. Mas enquanto eu buscar isso, enquanto meu coração se abrir mesmo nas rachaduras, eu já estarei vivendo a promessa do Criador: o amor que não acaba.
De guerras, ditaduras, revoluções tecnológicas e silêncios emocionais que atravessaram famílias inteiras.
A Geração Silenciosa (1928–1945) aprendeu a sobreviver em meio à escassez e à rigidez.
Filhos da guerra e da repressão, viveram para obedecer e reconstruir. Choravam escondido, se chorassem.
Os Baby Boomers (1946–1964) nasceram quando o mundo explodia em esperança e natalidade.
Foram criados com promessas de progresso, mas educaram seus filhos com o peso da tradição. Trabalho era destino.
A Geração X (1965–1980) cresceu vendo seus pais se separarem e o mundo se globalizar.
Foram os primeiros a questionar tudo e a viver com os dois pés no capitalismo — um dentro do escritório e outro no shopping.
Então vieram os Millennials (1981–1996): idealistas com burnout, criativos com boletos, crianças que acreditaram no “faça o que ama” e cresceram com ansiedade de desempenho.
Depois, a Geração Z (1997–2012): digitais desde o berço, informados demais, exaustos cedo demais. Aprenderam sobre saúde mental antes de aprender a confiar no próprio corpo.
E por fim, a Geração Alfa (2013–2025): nascidos entre telas, pandemias, avatares e brinquedos que piscam. São pequenos seres que vão crescer num mundo onde o físico é opcional e o digital é visceral.
Neste especial, abrimos um espaço de escuta e reflexão sobre as marcas visíveis e invisíveis de cada geração.
Vamos falar de infância, de memória, de afeto e de como o tempo deixa traços no comportamento humano.
Para quem cuida, para quem educa, para quem sente — e para quem quer compreender além da superfície.
Porque entender o tempo dos outros talvez seja a melhor forma de curar o nosso.
e a capinha do celular que me lembrou de ser só o que eu posso agora
– por b. monma
Outro dia, peguei o celular para responder alguém — provavelmente mais uma cobrança disfarçada de gentileza — e me dei de cara com a frase que carrego todos os dias sem perceber:
“Slow down, you’re doing fine. You can’t be everything you wanna be before your time.”
É da música Vienna, do Billy Joel.
E também é um lembrete que escolhi, escrevi e coloquei ali. Bonito, estético, simbólico.
Mas será que eu escuto?
Porque na prática eu tô sempre correndo.
Correndo pra ser mais.
Correndo pra não decepcionar.
Correndo pra alcançar uma versão minha que talvez nem exista, mas que eu inventei só pra ter com quem me comparar.
E aí, quando tudo trava, quando o peito aperta e o corpo avisa que não aguenta mais…
eu olho pra capinha.
Sim, a capinha.
E me sinto ridícula — por ter colocado ali um conselho que eu mesma ignoro.
Mas também me sinto humana.
Porque talvez crescer seja exatamente isso:
escrever lembretes que a gente ainda não consegue cumprir,
mas que aos poucos vão se infiltrando na alma,
até virarem parte da gente.
Tem dias que eu ainda acordo querendo resolver a vida inteira antes das 10h.
Tem outros em que só de escovar os dentes e não chorar já considero uma vitória.
E tudo bem.
Eu não vou ser tudo hoje.
Nem amanhã.
Mas posso ser um pouco mais eu agora.
E talvez seja isso que Vienna tenta me dizer:
que minha pressa não acelera o tempo,
mas minha gentileza comigo mesma pode suavizar a espera.
Então eu respiro.
Fecho o olho.
E deixo a frase da capinha finalmente me tocar.
Você já está indo bem, garota. Vai com calma. Vai com alma.
Dizem que todo bebê gosta de dormir no meio dos pais.
Eu não. Desde que me entendo por gente, gosto do meu quarto, da minha cama, do meu canto. Nunca fui de colo emprestado. Minha mãe conta que, com menos de um ano, tirei a fralda porque ela me incomodava. Com nove meses eu andava – não sei se com pressa de chegar a algum lugar ou só pra provar que podia.
Aos cinco anos, chorei desesperada por ter perdido a chupeta. Era noite, e eu não conseguia dormir sem ela. No dia seguinte, minha mãe achou, limpinha, no cantinho da cama, e me entregou como quem devolve o mundo.
Eu olhei, respirei fundo e disse:
— Não quero mais.
E nunca mais quis.
Tenho pensado sobre o quanto essa cena me define. A intensidade do apego. A decisão silenciosa da ruptura. O choro. A escolha.
Eu sou a que sente tudo. Mas que escolhe quando parar.
Sou feita de perdas súbitas e decisões definitivas.
O mais curioso é que, segundo a psicologia do desenvolvimento infantil, esse tipo de comportamento autônomo precoce revela mais do que uma fase: revela estrutura.
Jean Piaget já dizia que é entre o nascimento e os sete anos que a gente começa a desenvolver o chamado “senso de agência” — aquela noção interna de que nossas escolhas causam efeitos no mundo ao redor.
Ou seja: quando tirei a fralda com menos de um ano ou recusei a chupeta com cinco anos, talvez não fosse só teimosia ou maturidade. Talvez fosse só o começo do meu jeito de existir.
Livre.
Decidida.
Cheia de vontades — e de limites também.
Hoje vejo que nunca deixei de ser a menina que se cobria sozinha, mesmo com medo do escuro. A que sabia que pra crescer, às vezes, a gente precisa abrir mão até daquilo que parecia conforto.
E você?
O que foi que você deixou de lado ainda criança… e que talvez tenha revelado quem você realmente é?
Outro dia, eu chamei Deus pra uma reuniãozinha particular. Sem pauta oficial, sem ata, sem palmas. Só eu, a alma cansada e uma verdade entalada:
“Deus, eu não quero mais saber de fofoca. Não quero mais conversa vazia. Eu quero crescer, não escutar.”
Deus, que é muito eficiente, não me respondeu com uma luz mística nem com trovão.
Ele foi prático: começou a levantar umas pessoas da minha mesa.
No começo, confesso: deu aquele desconforto. Fiquei olhando pras cadeiras vazias como quem olha pra geladeira às três da manhã esperando um milagre.
Mas aí caiu a ficha: milagre era aquilo.
E foi só depois que eu entendi que não era só uma questão espiritual. Era também científica.
Pesquisadores da University of Michigan já comprovaram que fofocar (ou até ouvir fofoca) aumenta o nível de cortisol no sangue — o hormônio do estresse.
Ou seja: enquanto eu achava que estava “só ouvindo”, na prática, eu estava era me intoxicando.
Com cada “você ficou sabendo?”, meu corpo entendia: ameaça.
Além disso, estudos da Stanford mostram que a fofoca mina a confiança que as pessoas têm na gente, mesmo sem a gente perceber.
Ou seja, quem muito fala dos outros, começa a ser visto como alguém que não merece ser confiado nem pra guardar um segredo de criança.
E se a ciência já dizia tudo isso, pra que eu ia insistir em manter na minha mesa gente que não acrescentava nem paz nem projeto?
Parei de gastar energia discutindo a vida alheia e, sem perceber, comecei a construir a minha.
Porque enquanto a gente perde tempo especulando sobre os outros, os projetos mofam na gaveta, os sonhos pegam poeira, e a vida… estagna.
A UCLA ainda reforça: focar demais na vida dos outros ativa áreas do cérebro ligadas à comparação social.
Resumo: quem fofoca demais, compara demais. Quem compara demais, realiza de menos.
O que aprendi?
Que quem tem foco não tem tempo. E quem tem tempo demais pra cuidar da vida alheia… talvez esteja esquecendo de cuidar da própria.
E mais: que até nosso corpo agradece quando a gente faz essa limpeza.
Moral da história:
Se Deus começar a levantar gente da sua mesa, não tente puxar de volta pela manga.
Talvez seja Ele abrindo espaço pros sonhos que você pediu — e que até hoje não tinham onde sentar.
Na noite do dia 22 pro dia 23 de abril, eu sonhei que era uma rainha. Mas não dessas que usa coroa de ouro, manda nas pessoas ou tem um castelo com torre. Era uma rainha que andava — não no salto — mas arrastando uma espada enorme no chão. Pesada. Tão grande que dava quase medo. Quase.
O mais curioso é que ninguém me disse nada. Ninguém me chamou de rainha. Não teve anúncio. Não teve reverência. E ainda assim… eu sabia. Sabia que era. Simplesmente sabia.
Acordei com essa imagem grudada em mim como quem sonha com uma vida que já viveu. Me senti forte e estranha ao mesmo tempo. Tipo quando você encontra uma versão sua que sempre existiu, mas tava escondida atrás dos boletos, das inseguranças e do que os outros esperam que você seja.
No fim desse mesmo dia, 23 de abril, eu sentei na cama. Do jeito mais simples possível. Sabe aquele momento em que a gente não precisa de palavras bonitas nem de ritual nenhum? Só uma oração honesta. Eu só agradeci. Falei com Jesus como quem fala com alguém que já viu o pior de você e ainda assim fica. Pedi perdão. Pedi proteção. Falei que amava Ele.
E então aconteceu.
A Bíblia, que fica no meu criado-mudo, virou uma página sozinha. Sem vento, sem motivo, sem manual de instrução. E parou exatamente em Isaías 55.
Olhei pro relógio: 23:23.
Você não precisa acreditar, mas naquele segundo eu soube.
Era resposta. Era confirmação. Era código do céu.
Isaías 55 fala de um convite. Um chamado pra quem tem sede.
De graça. Sem cobrança.
Fala de um Deus que pensa muito além do nosso entendimento.
De um caminho mais alto.
De uma promessa que não volta vazia.
E eu ali, boba, arrepiada, sentindo que Ele tinha me ouvido.
Como se o sonho da espada fosse a visão.
E a página da Bíblia, o lembrete:
“Você já tem o que precisa.”
A espada?
Era minha.
Só tava aprendendo a carregar.
E Deus, como sempre, já sabia disso muito antes de mim.
Tem dias em que a gente acorda com vontade de ficar. Ficar em silêncio, ficar na nossa, ficar longe de tudo que pesa. Mas aí lembra que é Páscoa. Que tem almoço em família. Que tem presença marcada, cadeira reservada, e uma parte nossa que quer — apesar de tudo — estar lá.
Mas a verdade, que nem sempre a gente posta no feed, é que nem todo mundo à mesa traz leveza.
E tudo bem.
Tem gente que chega e a energia muda.
Não porque a gente é rancorosa, mas porque o corpo lembra o que a alma ainda não conseguiu esquecer.
Tem olhar que atravessa, tem sorriso que engana, tem conversa que machuca sem levantar a voz.
E a gente vai assim mesmo.
Com a roupa que fortalece.
Com o perfume que protege.
Com o coração blindado de quem já aprendeu a sorrir sem se entregar.
Porque tem fases em que o perdão ainda não veio — e não é falta de fé, é excesso de verdade.
E tudo bem também.
A ressurreição, às vezes, não acontece com luz e trombetas.
Às vezes ela é só um fio de paz puxado em silêncio no meio do caos.
É estar onde te feriram e ainda assim escolher não ferir de volta.
É não ceder ao jogo, mas também não sair da mesa.
É renascer aos poucos, só com o que ainda vale a pena.
Que o vidro brilhava porque era puro, e não porque refletia as luzes artificiais que a gente mesmo pendurou ali. A gente chamava de liberdade. De sucesso. De “conquistar o que é seu”. E por muito tempo, isso bastou.
Mas um dia a vitrine quebrou.
Talvez tenha sido um vídeo no TikTok, um dado solto por aí, uma matéria que ninguém quis dar muita atenção — ou só aquela sensação incômoda de que tinha algo fora do lugar, mesmo quando tudo parecia estar no seu devido. E foi aí que as rachaduras começaram.
Não era só sobre bolsas de luxo fabricadas a preço de banana.
Nem sobre a China expondo os bastidores do Ocidente.
Era sobre perceber o feitiço. A engrenagem. O encanto disfarçado de escolha.
Espiritualmente, esse momento é uma travessia. O que se quebra fora reflete o que se rompe dentro. Porque quando uma estrutura cai, uma consciência se levanta.
E não tem como não sentir: o mundo tá mudando. Não de um jeito bonito ou instagramável — mas de um jeito real, que tira o sono e tira a venda dos olhos.
A vitrine quebrada é a metáfora do fim da ilusão.
A ilusão de que liberdade é comprar.
De que justiça é só discurso.
De que sustentabilidade é estética.
De que progresso é dominar o outro com um sorriso e uma taxa de juros.
E quando a gente vê isso com os olhos da alma, dói.
Dói perceber que a mesma mão que te oferece um brinde é a que aperta um botão de guerra.
Dói ver que os heróis das histórias sempre têm o mesmo sotaque, a mesma cor, a mesma narrativa.
Dói entender que até a espiritualidade foi embalada pra vender paz em 12x sem juros.
Mas dói porque cura.
E cura porque mostra.
E mostra porque chegou a hora.
Você começa a enxergar.
A ver que o luxo também mente. Que o sistema também engana.
Que as histórias que te contaram não são as únicas.
E que a verdade não precisa gritar — ela só precisa ser olhada de frente.
Nesse momento, as almas que vieram pra sentir tudo, questionar tudo, e transformar isso em arte — começam a se mover.
Não pra salvar o mundo com fórmulas prontas.
Mas pra criar brechas. Palavras. Silêncios.
Espaços onde quem ainda dorme possa, talvez, sonhar diferente.
E não importa se você fala disso com poesia, ironia, ou com uma xícara de café na mão enquanto escreve uma crônica no meio da segunda-feira.
Depois do exposed fashionista, a China não parou por aí.
Ela continuou puxando o fio da etiqueta e, quando a gente viu, a vitrine toda tinha caído. O que sobrou foi aquilo que ninguém gosta de encarar: as contradições do sistema que a gente aprendeu a chamar de liberdade.
Entre uma sanção aqui e uma manchete ali, a China começou a responder as críticas do Ocidente com documentos, gráficos e perguntas incômodas.
Tipo aquele amigo que, depois de ser chamado de controlador, resolve imprimir tudo que já engoliu calado e entregar num fichário. E o fichário, minha amiga… é grosso.
A primeira acusação que ela rebate é a mais óbvia: “vocês falam de direitos humanos, mas mantêm prisões superlotadas, desigualdades históricas e interferem em países alheios quando querem proteger seus interesses.”
E não é mentira.
É desconfortável, mas é verdade.
A segunda é mais sutil: a liberdade vendida no Ocidente não é exatamente liberdade — é uma vitrine. Bonita, iluminada, mas que exige um preço alto pra entrar.
Você precisa consumir. Precisa se parecer com algo. Precisa caber.
E se não puder, tudo bem — tem crédito. Mas também tem culpa.
A terceira crítica vem embalada em tom verde: marcas sustentáveis que terceirizam poluição, enquanto postam no Instagram uma nova coleção feita com “consciência”.
Mas quem tá consciente mesmo?
Porque tem fábrica respirando fumaça em silêncio, e operário ganhando centavos pra sustentar o luxo de quem paga pela “experiência”.
A quarta é geopolítica: o Ocidente que se irrita com a China controlando narrativas… é o mesmo que controla o cinema, a moda, o algoritmo.
Quem dita o certo, o bom, o bonito?
E a quinta crítica é filosófica: talvez o Ocidente tenha vendido a ideia de progresso como uma versão refinada de colonialismo.
Não se conquista mais com exércitos — agora se domina com aplicativos, tendências, dívidas e influências culturais.
E quem não segue, “tá atrasado”.
No fim, não é sobre escolher lados.
É sobre perceber que todos eles têm interesses.
Mas enquanto alguns tentam nos vender o sonho, outros estão nos cutucando pra acordar.
E talvez seja isso o que a China está tentando fazer:
nos lembrar que o sistema também mente.
Que o luxo também manipula.
E que a vitrine pode até brilhar…
mas às vezes, é só reflexo de um mundo que preferiu se esconder atrás do vidro.
Outro dia, anotei no caderno três coisas que eu queria ser: menos reativa, mais poética e um pouco mais minha. Simples assim. Três frases curtas, que de tão simples quase passam batido… mas que, na prática, são uma revolução disfarçada de meta do mês.
Ser menos reativa, por exemplo, parece fácil até o momento em que alguém pisa no meu calo — e eu tenho o reflexo de devolver com um salto de três metros e uma frase atravessada. Não quero mais ser essa versão automática de mim. Quero ser a que respira antes de responder. A que toma um gole d’água em vez de soltar fogo. A que se cala não por medo, mas por escolha. Porque ser menos reativa não é ser passiva — é ser sábia. E eu tô cansada de ser explosiva e me arrepender depois.
Voltar a treinar o olhar poético pras pequenas coisas do dia a dia também entrou na lista. Porque a verdade é que a vida não parou de ser bonita — fui eu que andei míope de alma. Passo pela mesma rua todo dia, mas deixei de notar a o cachorro da esquina, as plantas que crescem tímidas nas calçadas, o céu que muda de cor entre um compromisso e outro. Quero reaprender a ver. A ver com o coração, com a sensibilidade que sempre foi minha, mas que andou trancada no armário das obrigações. Quero escrever uma frase por dia do que senti. Fotografar o que ninguém repararia. Ouvir música como quem reza com os fones. Me reencontrar com essa parte de mim que fazia poesia com o café esfriando.
E por último, cuidar de mim. Porque se tem uma coisa que aprendi é que quando a gente se deixa pra depois, tudo começa a travar: o corpo, os planos, os afetos. Quando eu tô bem, as coisas fluem. E cuidar de mim não é sobre spa, dieta ou estética. É sobre respeito. Dormir melhor. Comer o que me faz bem. Mexer o corpo, não por estética, mas pra me sentir presente em mim. Dizer não. Dizer sim. Reaprender a falar comigo sem julgamento. Ser meu próprio porto.
Talvez a vida não peça grandes mudanças. Talvez só precise de pequenas revoluções silenciosas feitas dia após dia — dentro da gente.
Talvez tudo comece assim: com três frases num caderno, um pouco mais de ar antes da resposta, e a coragem de voltar a se olhar com carinho.
Outro dia, enquanto passava o dedo pelas novidades do TikTok com a leve intenção de não pensar em nada, apareceu um vídeo que prendeu minha atenção. Uma moça dizia, animada, que tinha garantido sua bolsa Hermès com 80% de desconto — “depois do exposed da China”, ela completava. Fiquei curiosa. E fui atrás.
O que descobri é que a China anda abrindo o jogo sobre algumas verdades bem incômodas do mercado de luxo. Marcas famosíssimas, vendidas como exclusivas e artesanais, terceirizam parte da produção para fábricas chinesas por um custo bem mais baixo do que se imagina. Estamos falando de bolsas que custam centenas de reais pra serem feitas… e são vendidas por dezenas de milhares. A etiqueta pode ser europeia, mas a costura, muitas vezes, não é.
Mas não para por aí. Essa movimentação faz parte de um contexto maior: a crescente tensão entre China e Estados Unidos. Enquanto os EUA impõem sanções e restrições à tecnologia chinesa, a China responde mostrando os bastidores do capitalismo ocidental — com dados, contratos e comparações que fazem a gente repensar muita coisa.
Além das bolsas, entraram na roda:
– a dependência das big techs americanas da produção chinesa,
– a real sustentabilidade das grandes marcas,
– o uso político do dólar como moeda global,
– e o contraste entre os discursos bonitos do Ocidente e algumas realidades difíceis de ignorar.
E a gente, no meio disso tudo, com celular na mão, meme na tela e aquela sensação de que o mundo está virando uma grande vitrine em liquidação — mas nem tudo que brilha é ouro, e nem tudo que é caro é justo.
Talvez esse seja um bom momento pra repensar não só o que a gente consome, mas também o que acredita.
Dizem que tudo vibra. Que o mundo não é feito de matéria, mas de ritmo.
Que somos, cada um de nós, uma pequena corda invisível tocando uma nota única no violão do cosmos.
E se isso for verdade, talvez o meu bloqueio criativo seja só uma pausa entre duas notas.
Uma respiração do universo antes de seguir a melodia.
Nos laboratórios, físicos discutem o invisível com a frieza das fórmulas.
Chamam de teoria das cordas, como se pudessem amarrar o universo inteiro em um nó bem-feito.
Mas eu gosto de pensar nisso como poesia.
Cordas tão pequenas que nem vemos, vibrando em silêncio — criando tudo o que existe.
Essa semana, cientistas disseram que talvez a energia escura — aquela força misteriosa que empurra o universo para fora de si mesmo — seja, na verdade, o próprio espaço-tempo vibrando.
Fazendo música em escalas que a gente ainda não aprendeu a ouvir.
E isso me fez pensar:
Será que o universo também sente bloqueio criativo?
Será que a expansão acelerada que vemos no céu é só ele tentando se reinventar?
Tentando escrever um novo capítulo depois de um silêncio incômodo?
Talvez a gente se pareça mais com o cosmos do que imagina.
Talvez, quando nada sai, quando tudo parece estagnado, seja só o espaço se esticando em nós.
Preparando uma nova vibração.
Uma nova nota.
E então escrevo.
Mesmo sem saber se faz sentido, mesmo sem saber onde termina.
Escrevo porque talvez, ao escrever, eu também esteja vibrando.
Como uma corda invisível, ecoando no meio do tudo.
Assisti àquela série nova da Netflix, Adolescência, e confesso que passei os 40 minutos com um aperto no peito e um milhão de pensamentos na cabeça. A câmera não pisca. A gente também não consegue piscar. Porque ali, naquela escola, naquela tensão toda, naquele menino perdido entre likes, ameaças e o peso de existir, mora uma geração inteira. Uma geração que respira pela internet e sangra pelo silêncio.
E aí eu penso: será que a gente está mesmo protegendo nossos filhos, nossos irmãos, nossos futuros, quando os deixamos trancados dentro de casa, achando que lá fora é perigoso demais? Será que o perigo não mudou só de endereço? Porque hoje o beco escuro pode ser uma DM no Instagram. O corredor da escola virou grupo no WhatsApp. O bullying, o ódio, a falta de afeto… tudo continua lá. Só que agora com filtro.
E enquanto a gente olha para o lado de fora, achando que a rua é o problema, o mundo digital vai educando, moldando e engolindo essas crianças. E o pior: sozinhas.
Tenho sentido isso na pele. Literalmente. Meu trabalho me colocou diante da geração Z com olhos de quem precisa contratar, ensinar, confiar. E, olha… não tá fácil. Não sabem contar troco, não sabem mexer num computador básico, não sabem olhar no olho. Às vezes, parece que estão com medo de viver. Como se o mundo fosse grande demais, intenso demais, cheio de “demais” — então é mais seguro ficar num lugar onde tudo é editável.
Mas a vida real não tem botão de desfazer. E talvez seja por isso que tantos estejam se perdendo.
Na série, uma frase ecoa até agora na minha cabeça: “Quem vê de fora, nunca sabe o que realmente está acontecendo.” E é exatamente isso. A gente nunca sabe. Por isso, talvez o maior erro que estejamos cometendo como sociedade seja confundir presença física com presença emocional. Estar perto não é o mesmo que estar junto.
E os meninos? Ah, os meninos… esses então, estão tão perdidos quanto as meninas. O feminismo abriu espaço, mas quem ensinou o que fazer com esse espaço? Em que momento explicaram a eles que masculinidade não precisa ser violência, que o papel do homem pode ser leve, presente, afetuoso? A desconstrução aconteceu, mas e a reconstrução?
A adolescência está gritando. Só que o grito mudou de forma: agora ele é silêncio, é sumiço, é um post apagado, é uma ausência disfarçada de autonomia.
E talvez, só talvez, a gente precise começar a abrir de novo as janelas. Não as do navegador, mas aquelas que dão vista pro mundo real, com suas ruas, encontros, desafios e aprendizados que não cabem num tutorial. Porque viver dá trabalho, sim. E é exatamente por isso que vale a pena.
Talvez a gente ache que vive num mundo moderno, racional e emancipado. Mas e se, no fundo, ainda estivermos presos às velhas estruturas de poder que tanto criticamos? Esta é uma daquelas perguntas que cutucam e incomodam. Entre padres, juízes, presidentes e coaches, o que realmente buscamos? Ordem ou conforto? Liberdade ou um pai que diga o que fazer?
De longe, parece que não precisamos mais deles. Dos padres, dos papas, dos reis, dos juízes de toga, dos presidentes em palanque. Estamos modernos, conectados, autônomos. Cada um se vira como pode — ou, ao menos, finge.
Mas, se for olhar de perto — desses olhares que a gente desvia quando sente — talvez ainda estejamos todos de joelhos, esperando, feito crianças, que alguém nos diga o que fazer.
A hierarquia não é só uma palavra perdida nos livros de história ou nas missas de domingo. Ela mora na pele, no modo automático de atravessar a rua quando o guarda manda, no aperto que dá diante de um terno caro, de um crachá dourado, de um “senhor presidente” ou de uma “doutora meritíssima”. E, sem perceber, no silêncio respeitoso que fazemos ao escutar um especialista, como se ele fosse, secretamente, um sacerdote.
O mais curioso — e talvez o mais triste — é que seguimos, sem querer, encenando os velhos rituais que herdamos de séculos de Igreja.
As togas, as becas, os brasões, os juramentos, as solenidades, os púlpitos.
Nos tribunais, nos parlamentos, nas universidades, nos escritórios.
Tudo nos lembra, mesmo que disfarçado, um altar.
E não estou dizendo que organização seja ruim. O problema é quando chamamos de ordem o que é, na verdade, obediência disfarçada de costume.
Temos horror ao vazio e, no desespero, oferecemos nosso próprio altar ao primeiro que se apresente:
Se não for Deus, que seja o Estado.
Se não for o Estado, que seja o Mercado.
Se não for o Mercado, que seja o Coach.
Se não for o Coach, que seja o Instagram.
A pergunta que preferimos calar é:
será que aguentamos mesmo viver sem um Pai?
Sem um superior que nos diga o certo, que tome as decisões difíceis, que carregue o peso por nós?
Ou será que essa necessidade já virou vício?
O medo de perder as hierarquias — de cair no caos — é tão grande que aceitamos repetir a fórmula, mesmo sabendo que ela não encaixa mais.
Nos afeiçoamos ao opressor, desde que ele venha com protocolo, farda ou batina.
E, no fundo, sabemos.
Liberdade mesmo exigiria que cada um ocupasse o próprio altar.
Mas isso — convenhamos — dá um trabalho danado.
E você? Já parou para pensar em quem tem sido o seu “Pai” ultimamente?
No altar da vida, será que somos mesmo tão livres quanto gostamos de acreditar?
Alguns voos não são de chegada, mas de vigília. Há quem cruze os céus não pra revelar, mas pra guardar o mistério.
Outro dia, me peguei olhando pro céu.
Coisa boba, dessas que a gente faz quando o tempo dá uma trégua e a alma consegue respirar.
As nuvens dançavam devagar. Tinha um rosto sorrindo, depois virou uma concha, depois um olho. Eu via mensagens. Formas que pareciam falar comigo. Como se alguém estivesse desenhando lá em cima só pra mim, no exato instante em que eu precisava ver.
Mas aí vinha um urubu. Sempre ele. Silencioso, imponente, cortando o ar em círculos lentos. E, de repente, a nuvem se desmanchava. A forma sumia. O recado se desfazia no vento.
Foi assim algumas vezes, até que me veio o pensamento:
e se os urubus forem os seguranças do véu?
Sim, o véu. Aquela fronteira invisível entre o que se vê e o que se sente. Entre o mundo de cá e o que está além. O espaço sagrado que a gente só acessa quando está distraída o suficiente pra não atrapalhar.
Talvez os urubus não sejam mensageiros da morte, como ensinaram por aí.
Talvez sejam guardiões do mistério.
Os que chegam para recolher o cenário depois que a cena mais bonita já foi entregue. Como quem diz:
“já viu o que precisava ver, agora guarda com carinho e segue.”
Desde então, olho pra eles diferente.
Com reverência. Com silêncio.
Eles não atrapalham mais minha visão, só encerram o espetáculo.
Talvez o sagrado seja isso mesmo: algo que só se revela a quem sabe olhar,
e que se retira antes que a gente queira entender demais.
E você? Já viu alguma forma nas nuvens que parecia falar direto com você?
Entre a fé e o poder, sempre houve um jogo de cadeiras—mas nem sempre quem senta é quem realmente tem a conexão divina.
Se tem uma coisa que sempre me intrigou é como certas decisões na história foram tomadas sob o pretexto de serem “divinas”. Reis eram escolhidos pelo “direito divino”, batalhas eram travadas “em nome de Deus” e, claro, papas eram eleitos por um grupo seleto de senhores de batina, trancados em uma sala cheia de ouro, debatendo espiritualmente (e politicamente) sobre quem receberia o cargo vitalício de representante de Deus na Terra. Um processo que, dependendo da época, envolvia não só orações, mas também conspirações, ameaças veladas e, quem sabe, uma taça de vinho envenenada aqui e ali.
Enquanto assistia à série Conclave, percebi que há algo de fascinante e ligeiramente perturbador nesse espetáculo. Cardeais reunidos em um palácio, sem contato com o mundo exterior, supostamente esperando um “sinal divino” para decidir o futuro da Igreja. Mas convenhamos: se a conexão direta com Deus fosse tão boa assim, bastaria um e-mail celestial, talvez algo como jesuscristo@paraiso.com, com o assunto: “Aqui está seu novo Papa. Atenciosamente, O Criador.”
Mas não, a coisa é mais complicada. Os cardeais fazem alianças, jogam xadrez político, cochicham pelos corredores como se estivessem decidindo algo muito mais mundano, tipo quem vai herdar o trono em Game of Thrones. No fundo, a impressão é que a fumaça branca sai quando há um consenso entre os homens, e não necessariamente entre os céus.
E isso me leva a um questionamento mais profundo: quantas das decisões que moldaram o mundo foram realmente baseadas na fé e quantas foram simplesmente o resultado de boas articulações políticas? Quantas vezes a espiritualidade foi usada como desculpa para manter o poder concentrado nas mãos certas? E, se formos além da Igreja, quantas vezes na vida a gente aceita verdades prontas, acreditando que são inquestionáveis, sem nem ao menos se perguntar quem realmente as escreveu?
Fé e poder caminham juntos há séculos, mas será que deveriam? E mais: será que em algum lugar do Vaticano tem um roteador de Wi-Fi divino, onde só alguns poucos têm a senha para acessar as decisões lá de cima? Se for o caso, bem que podiam compartilhar. Afinal, acho que tem muita gente precisando dessa conexão direta.
Escrever um blog em 2025 é como nadar contra a corrente – exige fôlego, mas nos lembra que ainda somos donos das nossas próprias palavras.
Sempre escrevi. No papel, no celular, em qualquer lugar onde pudesse despejar meus pensamentos antes que se perdessem no fluxo da rotina. Escrever me ajuda a organizar a mente, a entender o que sinto, a evoluir. Antes, guardava tudo para mim. Agora, posto. Para não perder, para dar voz ao que penso.
Mas por que um blog? Por que não simplesmente jogar essas palavras nas redes sociais, onde todo mundo está? Talvez porque as redes sociais não sejam mais um lugar onde as pessoas realmente falam. São vitrines. Todo mundo tentando caber em uma caixa, otimizando a própria existência para engajamento. Falta autenticidade, falta profundidade. Falta sentir que há pessoas do outro lado, e não apenas perfis calculando o que postar para melhorar os números.
Escrevo um blog porque gosto da liberdade de escrever sem pressa. Sem me preocupar se alguém vai curtir ou comentar. Porque já escrevia antes de postar e continuaria escrevendo se ninguém nunca lesse. Meu blog não é um projeto de crescimento, é um diário de insights. Algo que me acompanha e me ajuda a enxergar a vida com mais poesia.
Ainda escrevo um blog porque gosto da sensação de trocar ideias que me tiram da caixa. Não quero um milhão de seguidores, quero conversas que agreguem, reflexões que façam sentido, trocas que valham a pena. Gosto do que é inteligente, sensível, real.
E você? Quando foi a última vez que leu algo sem pressa? Quando foi a última vez que escreveu sem pensar em como as pessoas iam reagir? Se ninguém pudesse curtir, você continuaria postando?
Escrevo um blog porque sinto falta da internet de antes. Do Tumblr, dos textos que mexiam com a gente, dos blogs que existiam sem a obrigação de viralizar. Talvez os blogs estejam voltando porque, no fundo, a gente nunca deixou de precisar deles.
E se, aos poucos, a gente tomar um pedacinho da internet de volta?
A gente sempre imaginou que o futuro seria um evento grandioso, uma mudança radical que viria com carros voadores e robôs humanoides. Mas, na verdade, ele chegou silencioso e sorrateiro, se infiltrando nos nossos bolsos, nos nossos fones de ouvido, no nosso jeito de interagir com o mundo.
Eu só queria desligar a mente. Nada mais, nada menos. Escolhi Beethoven, porque dizem que música clássica ajuda a reduzir o estresse – ou foi isso que algum coach aleatório no Instagram me convenceu. Coloquei os fones, apertei o play e fui sugada pelos acordes intensos da Quinta Sinfonia. Ta-ta-ta-TAA.
Aí veio meu marido.
• “Amor, olha isso aqui!”
Abri um olho, já sabendo que, se fosse um vídeo de receita ou de alguém caindo de um skate, não valeria a interrupção. Mas o que ele me mostrou foi outra coisa: um vídeo do TikTok de um óculos de realidade aumentada, com IA integrada, que responde perguntas e basicamente funciona como um assistente pessoal dentro da sua cara. Uma coisa meio Tony Stark encontra Black Mirror.
Na mesma hora, sem pensar, soltei:
• “Estamos oficialmente no futuro.”
O problema é que eu realmente senti isso. Não como uma brincadeira, mas como um insight profundo, quase místico – e o pior, ao som de Beethoven. Foi como se eu tivesse sido puxada para um túnel do tempo e aterrissado na constatação inevitável: o futuro não chegou como esperávamos, mas ele já está aqui, e ninguém mandou convite.
A Linha Invisível Que Cruzamos Sem Perceber
Em que momento exato o mundo deixou de ser analógico e se tornou digital? Quando foi que os telefones pararam de tocar e começaram a vibrar? Quando a escrita virou ditado? Quando a privacidade virou um conceito ultrapassado? Quando os espelhos começaram a reconhecer nossos rostos? Não dá para apontar uma data exata. Só sabemos que o que era estranho ontem, hoje é cotidiano – e o que é estranho hoje, amanhã será indispensável.
A verdade é que a gente sempre imaginou o futuro como algo grandioso e cinematográfico. Carros voadores, robôs servindo café, roupas prateadas e hologramas piscando por todos os lados. Mas não foi assim que aconteceu. O futuro chegou pingando em pequenas doses e a gente nem percebeu:
• Primeiro veio a Alexa, ouvindo nossas conversas e sugerindo coisas que a gente não falou, mas pensou.
• Depois os celulares passaram a reconhecer nosso rosto melhor do que nossa própria mãe.
• Agora temos óculos que pensam junto com a gente.
A questão é: o que vem depois?
Porque se eu já senti esse impacto existencial ao ver um óculos com IA, imagina quando inventarem algo realmente absurdo? Tipo um chip que escreve as crônicas por mim (será que já existe?). Ou uma assistente virtual que resolve minhas tretas emocionais? (Essa eu compraria).
E Agora?
A maior ilusão do ser humano sempre foi achar que ele entende o que está acontecendo. Mas a verdade é que estamos apenas tentando acompanhar. O que hoje parece o auge da tecnologia, amanhã será peça de museu. O que hoje nos assusta, amanhã será nostálgico. A pergunta não é “o que vem depois?”, mas sim “será que estamos prontos para aceitar o que vem depois?”
A parte mais assustadora não é a tecnologia em si. É o fato de que ela já está misturada na nossa rotina, e a gente nem estranha mais.
Eu lembro quando mandar áudio no WhatsApp era coisa de gente sem paciência, e hoje ninguém quer digitar três palavras sem usar o modo ditado. Lembro quando “computador de bordo” parecia um luxo futurista, e agora todo carro básico já fala com você. O ponto é: o que a gente ainda acha estranho hoje, mas que em poucos anos será tão normal quanto respirar?
Talvez, no futuro, eu nem precise escrever essa crônica. Basta eu pensar nela e minha IA vai transcrever automaticamente, com pontuação impecável. O problema é se ela decidir escrever melhor do que eu.
E Beethoven? Se ele vivesse hoje, será que usaria inteligência artificial para compor ou ficaria ofendido? Ou melhor: será que uma IA já está escrevendo sinfonias melhores que Beethoven, e a gente nem sabe?
E se a resposta que você busca sobre quem você é já estivesse escrita no nome que você carrega?
Eu só queria descobrir o significado do meu sobrenome. Uma pesquisa rápida, nada muito profundo. Mas, como tudo na minha vida, as coisas nunca acontecem de forma linear e simples. Comecei buscando uma resposta e, antes que percebesse, já estava cogitando largar tudo, virar budista e me mudar para o Japão para meditar nas montanhas.
O que era para ser uma pesquisa despretensiosa virou uma imersão na minha própria história. Descobri que Monma (門間) pode significar algo como “entre portais” ou “entre mundos”, e a primeira coisa que pensei foi: faz total sentido. Se tem uma coisa que sempre senti é que minha vida acontece exatamente nesse espaço indefinido entre dois extremos – entre a razão e a intuição, entre a rotina e a liberdade, entre o aqui e o além.
Mas não para por aí. O sobrenome Monma é raro, quase uma seita secreta. No mundo todo, apenas 10.496 pessoas carregam esse sobrenome. No Japão, cerca de 9.700. No Brasil? Apenas 219 almas carregam esse nome. Ou seja, eu faço parte de um grupo ultra-seleto de pessoas que têm Monma no RG. Nem precisava de numerologia para confirmar que sou diferenciada, mas agora tenho provas estatísticas.
Agora, e os meus antepassados? O que eles faziam? Porque, se eu carrego essa sensibilidade, essa necessidade de entender tudo profundamente, essa atração por temas espirituais e esse dilema eterno entre buscar a paz ou arrumar encrenca, com certeza não fui a primeira da linhagem a lidar com isso. E, bom, faz sentido.
O Passado Que Se Conecta ao Meu Presente
A história espiritual dos japoneses é um caldeirão de filosofias e tradições. Meu DNA provavelmente carrega traços de pelo menos algumas dessas práticas:
1. Xintoísmo: A crença na energia dos antepassados e dos elementos da natureza. Faz sentido, já que sempre me senti estranhamente conectada a lugares e situações, como se soubesse que já estive ali antes.
2. Budismo Zen: Meditação, introspecção, busca pela iluminação. Esse aqui bateu forte, porque eu vivo querendo respostas sobre a vida e tentando entender minha missão – e, na maioria das vezes, a resposta que vem é: “Aceite o fluxo da vida, Bruna.”
3. Onmyōdō: Um sistema japonês de equilíbrio energético baseado no yin-yang e nas forças da natureza. Olha, se alguém precisa de equilíbrio energético, esse alguém sou eu.
4. Shugendō: Uma tradição de monges que se isolavam nas montanhas para treinar corpo e mente. O conceito de viver reclusa me atrai até certo ponto… até lembrar que gosto de Aperol e hambúrguer.
Ou seja, de um jeito ou de outro, o que eu vivo hoje já estava nos meus genes antes mesmo de eu entender o que era espiritualidade. Minhas dúvidas, minha busca por equilíbrio, minha necessidade de transformar tudo em significado – tudo isso já estava escrito na minha linhagem.
E tem um embasamento real nisso tudo. A epigenética, um campo da biologia que estuda como traumas e vivências dos antepassados podem ser herdados geneticamente, sugere que experiências emocionais e culturais podem, sim, ser passadas de geração em geração (Jirtle & Skinner, 2007). Isso explicaria por que certas tendências e padrões aparecem na nossa vida sem uma explicação óbvia. Talvez eu tenha herdado dos meus antepassados não só o sobrenome, mas também essa inquietação pela busca do sentido da vida.
Entre Mundos, Entre Portais, Entre Respostas e Mais Perguntas
Se eu pudesse perguntar algo aos meus ancestrais, eu diria: “Ei, vocês também sentiam essa agonia existencial ou fui eu que inventei moda?”
Mas a verdade é que essa inquietação faz parte de quem eu sou. Eu sou Monma, entre portais, entre mundos, entre a espiritualidade e a racionalidade, entre a tradição e a modernidade, entre a estabilidade e a vontade de fugir para o Japão.
Talvez eu nunca encontre uma única resposta definitiva, mas acho que essa é a beleza de viver nesse espaço entre. E quer saber? Tá tudo bem. Afinal, a melhor parte de estar entre mundos é poder transitar por eles – e, no final, criar o meu próprio.
A gente passa tanto tempo tentando ter controle sobre tudo que esquece o quanto é bom se perder um pouco.
Ouvir Hozier transformar “Do I Wanna Know?” foi como abrir um portal para uma saudade que eu nem sabia que sentia. Algumas saudades são diferentes de outras. Existem aquelas saudades fofas, tipo saudade de um brigadeiro na TPM, e existem aquelas que doem no peito como um boleto vencido que a gente esqueceu de pagar. Mas essa era diferente. Era saudade de um tempo em que a vida era descomplicada, de um romance que nunca teve começo nem fim, mas sempre existiu ali, flutuando no espaço-tempo.
O nome ou a pessoa pouco importavam agora. O ponto era que, naquela época, a minha maior preocupação era estudar para uma prova de química e não entender nada de ligações covalentes. Não tinha muitos compromissos, boletos, funcionários, decisões importantes ou mensagens urgentes que exigiam resposta imediata. Só existia o agora, o momento, a leveza de um encontro que acontecia sem precisar ser planejado. Era tudo tão fácil que dava até preguiça de chamar de romance.
Mas o problema de crescer é que a vida é basicamente uma sequência interminável de tarefas e alarmes. Você acorda e já tem coisa para fazer. Você dorme e sonha com as coisas que precisa fazer no dia seguinte. O botão de pausa simplesmente não existe mais. E aí, no meio dessa correria insana, bate a saudade daquela versão de mim que não precisava de agenda para marcar um café ou de planejamento estratégico para tirar um dia off sem culpa.
Engraçado como certas coisas mudam de cor com o tempo. O que parecia caótico na adolescência hoje soa quase sereno. É tipo ouvir Do I Wanna Know? do Arctic Monkeys naquela época e sentir o peso da frustração, da confusão, do desejo misturado com orgulho ferido. Era intenso porque a gente também era. Hoje, ouvindo a versão do Hozier, parece outra música. Agora o desejo vem com aceitação, sem tanta luta, sem precisar de todas as respostas. A gente aprende que algumas coisas simplesmente são, e tudo bem.
A verdade é que a minha definição de luxo mudou. Antes, eu queria uma bolsa cara. Hoje, eu quero dormir sem despertador. Eu quero viajar sem roteiro, sem compromisso, sem ter que justificar para ninguém que eu mereço esse descanso. Eu quero sentir que a vida flui de novo, como naquela época em que a gente só precisava existir e tudo parecia dar certo no final.
Então, talvez a moral dessa história não seja sobre o romance, nem sobre Hozier, nem sobre a prova de química que eu provavelmente fui mal. Talvez seja sobre o fato de que a gente passa tanto tempo tentando ter controle sobre tudo que esquece o quanto é bom se perder um pouco. E eu estou oficialmente decidida a me perder mais—de preferência em uma praia, com um drink na mão e o celular no modo avião.
Porque, no final das contas, leveza não é coisa do passado. Ainda dá tempo de resgatá-la.
A vida pode até rir, mas no final, é Deus quem dá a última palavra.
Tem dias em que eu acordo achando que agora vai. Que finalmente a vida entendeu que já me testou o suficiente e que, a partir daqui, tudo vai fluir. Mas, no minuto seguinte, ela dá risada na minha cara e sussurra: “Não vai não.”
E então vem o peso. O peso de quem já tentou tanto, de quem já acreditou mil vezes e, ainda assim, continua tropeçando nas mesmas pedras. O peso de quem cansa de ser forte, mas não tem outra escolha.
Às vezes, me sinto voltando para aquele lugar de quando eu era adolescente, quando tudo parecia um drama infinito e dormir era a única parte boa do dia. Só que agora não é drama, é cansaço. Agora eu sei que a vida não é um filme com uma trilha sonora inspiradora de superação no fundo. A vida é feita de dias bons e dias que são uma sequência de golpes no queixo.
Mas aí, bem no meio desse limbo, vem a fé.
Porque, se tem uma coisa que aprendi nesses últimos dias, é que Deus não nos deixa presos em ciclos à toa. Ele nos coloca diante dos mesmos desafios até que a gente aprenda a reagir diferente. Até que a gente entenda que paciência não é esperar com desespero, é confiar no processo.
E talvez seja isso. Talvez a evolução não esteja no fato de tudo dar certo de uma vez, mas na forma como a gente aguenta quando tudo dá errado. Talvez crescer não seja nunca mais cair, mas aprender a se levantar com mais leveza, sabendo que tem um propósito por trás de cada tombo.
Então, se hoje o dia terminou no chão, amanhã eu me levanto de novo. Porque a vida pode até rir, mas eu sei que, no final, é Deus quem dá a última palavra.
Amizade de verdade não pesa, não suga, não exige máscaras—ela flui, soma e permanece, mesmo quando o cenário muda.
Amizade, pra mim, não é sobre empurrar alguém pro buraco e chamar de liberdade. Não é sobre convencer a fazer o que não faz bem, só porque precisa de companhia no erro. Amigo de verdade segura sua mão quando o caminho é incerto – não te joga na fogueira pra se aquecer do próprio vazio.
E aqueles que te chamam de irmão na frente e te reduzem a uma história distorcida pelas costas? Esses são os mais perigosos. Sorriem, ouvem, concordam. Depois, usam cada palavra sua como moeda de troca em conversas onde você não foi convidado. Amizade não é sobre aplausos na sua frente e julgamentos onde você não pode se defender.
Tem também os que chegam com discurso de parceria, mas o que querem mesmo é se alimentar do que você tem. Não importa se é tempo, energia ou confiança – eles levam. E levam sorrindo. O problema dos sanguessugas é que, quando você percebe, já está drenado.
E os “amigos” que torcem por você, mas não pelas suas escolhas? Aqueles que gostam de você enquanto está sozinho, mas fazem cara feia pro seu relacionamento, pro seu trabalho, pro que te faz feliz? Eles te querem bem, mas não tão bem a ponto de não precisar mais deles. São amigos do “estou aqui pra você” – desde que o “você” atenda às expectativas deles.
E se alertar alguém sobre isso me faz manipuladora, que assim seja. Prefiro ser julgada por enxergar do que fingir que não vejo. No fim, ninguém perde por querer e fazer o bem. Mas muita gente se perde por não saber diferenciar amigo de figurante.
Moral da história? Amizade não é sobre presença constante, mas sobre constância na presença. Quem é de verdade permanece, sem precisar sugar, esconder ou manipular. O resto, com o tempo, se revela e se desfaz sozinho.
E você? Tem ao seu lado quem soma ou quem só sabe dividir?
Que nunca nos falte voz, coragem e espaço. Que sejamos difíceis, inquebráveis, livres. Sexo frágil? Só se for pra quem precisa da nossa força pra se equilibrar.
Hoje e sempre, escolhemos a nós mesmas. 💫
Tem uma coisa que sempre me intrigou: como é que a gente cresce ouvindo que mulher é sexo frágil e, ao mesmo tempo, passa a vida equilibrando boleto, cólica, trabalho, unha feita, frustração emocional e TPM – muitas vezes tudo isso ao mesmo tempo e sem nem poder surtar no expediente?
E mais: “sexo frágil” somos nós, mas são eles que precisam sugar a autoestima de uma mulher para não desmoronar? Tá bom.
O problema começa quando a gente percebe que ser boazinha demais é a pior forma de se autossabotar. Porque enquanto você tenta ser legal, compreensiva, a mulher que “não arruma problema”, tem sempre alguém se aproveitando da sua paz de espírito. Aí, um dia, você cansa.
Você acorda e pensa: “pera, e se eu simplesmente não aceitar mais nada que me desagrade?” Aí pronto. Virou difícil.
Sim, porque mulher que se impõe não é determinada, é difícil. Mulher que discorda não é inteligente, é complicada. Mulher que não se anula por amor não é forte, é egoísta.
E eu digo, com todo prazer: que sejamos todas difíceis. Que ninguém mais nos ache fáceis de manipular, fáceis de engolir sapo, fáceis de manter caladas.
Que a gente nunca mais aceite ser extensão do ego de um homem inseguro. Que a gente nunca mais seja plateia para macho medíocre que precisa da nossa atenção para se sentir importante. Que a gente nunca mais se molde para caber na fragilidade emocional de alguém que nem sabe o que quer da vida.
E mais importante: que a gente tenha voz. Não só para xingar um idiota no trânsito ou reclamar da entrega que atrasou. Mas voz para ser ouvida. Voz para ser foda. Porque ser foda de boca pra fora é moleza. Difícil mesmo é ser foda de verdade.
A vida toda me disseram que eu não podia. “Você não consegue”, “Isso não é pra você”, “Melhor deixar pra quem sabe”. E eu, boba, fui acreditando. Afinal, se tanta gente diz, deve ser verdade, né? Talvez eu tenha vindo com defeito de fábrica, talvez meu único talento seja pedir desculpa por existir.
E foi assim até que comecei a jogar beach tennis.
Ah, o beach tennis. O esporte que, aparentemente, não era para mim. Pelo menos foi isso que disseram. “Você não tem talento pra esportes”, “Vai brincar de outra coisa”, “Sei não, Bruna, acho que não é sua praia” – irônico, já que praia sempre foi minha coisa.
Por um tempo, fui deixando esses comentários me definirem. Até que um dia me olhei no espelho e pensei: será que é mesmo? Ou será que eu só aceitei essa história porque era mais fácil do que provar o contrário?
Então, ao invés de desistir, eu treinei. Treinei até sentir o braço doer, até tomar bolada na cara e seguir com dignidade, até perceber que eu estava, sim, melhorando. E, de repente, eu sabia jogar beach tennis.
E foi aí que me caiu uma ficha gigante, uma ficha do tamanho de uma quadra de areia: se eu melhorei no beach tennis, no que mais estavam mentindo pra mim?
A resposta? Em praticamente tudo.
Foi a partir desse momento que eu comecei a sair de todas as caixas onde me colocaram e eu não concordava.
“Você não pod…”, posso sim.
“Você não dá conta d…”, dou sim.
“Isso não é pra voc..”, tá bom, senta e assiste.
Porque se tem uma coisa que eu aprendi, é que ninguém realmente sabe o que é ou não pra gente. As pessoas falam com base nas próprias inseguranças, nos próprios medos e, às vezes, só porque adoram se meter. Mas eu decidi que não sou mais figurante da opinião alheia.
Então, se alguém quiser me encaixar em mais uma caixinha, já aviso: estou claustrofóbica para as expectativas dos outros.
E se ainda duvidarem, tudo bem. Eu até gosto. Melhor motivação do que essa, impossível.
Meu avô dizia: “Corpo são, mente sã.” E eu, teimosa que sou, demorei para entender que essa frase não era só um bom bordão de filme de coach. Mas a vida – essa professora insistente – fez questão de me mostrar na prática.
Nos últimos tempos, entre um devaneio sobre propósito e um surto (não vamos mentir aqui), percebi que minha mente estava uma verdadeira Tok&Stok desorganizada. Sabe quando você joga tudo dentro do armário e empurra a porta torcendo para nada despencar? Pois é. A cada desafio novo, lá ia eu tentando encaixar mais uma caixa sem espaço.
Até que resolvi testar o conselho do meu avô e comecei a reorganizar minha vida de dentro para fora. Não foi com aplicativos de produtividade ou planners coloridos (mentira, até tentei), mas sim com algo mais visceral: Pilates, meditação, som e escrita.
Pilates: o CEO do equilíbrio
Primeiro, voltei pro Pilates. Nada como se alongar e sentir músculos que nem sabia que existiam para lembrar que estou viva. E olha, a ciência comprova: um estudo publicado nos Cadernos de Saúde Coletiva mostrou que Pilates melhora o equilíbrio, alivia dores e aumenta a qualidade de vida. E eu posso garantir: me equilibrar naquelas máquinas infernais (que, na verdade, são minhas melhores amigas) ajudou a equilibrar minha balança emocional também.
A cada controle de respiração, eu sentia que também estava respirando melhor fora dali. O autocontrole que eu treinava no exercício – segurando o core enquanto tentava não despencar – começou a transbordar para outras áreas da minha vida. Me segurando para não responder mensagem impulsiva? Check. Me segurando para não pedir hambúrguer no lugar da salada? Quase check.
Meditação: o gerente da calma
Aí veio a meditação. No começo, parecia coisa de gente que tem muito tempo livre. Mas resolvi insistir. E não é que funciona? Estudos da Revista Interespe mostraram que meditar reduz estresse, melhora a cognição e ainda dá um boost na qualidade de vida.
Eu, que sempre fui da turma do “minha cabeça não para um segundo”, me vi sentada, em silêncio, ouvindo meus próprios pensamentos sem surtar. Uma evolução e tanto. Aos poucos, a meditação começou a me ajudar a assumir o controle, não só da minha respiração, mas das minhas respostas automáticas à vida. Comecei a reagir menos e agir mais.
Se antes eu entrava no modo “fogo no parquinho” com qualquer provocação, agora respiro fundo e penso: “vale mesmo gastar minha energia com isso?” Muitas vezes, a resposta é não.
Frequências, músicas e um sonho curioso
E aí chegamos no som. Eu sempre fui movida a música – da ópera ao funk, sem preconceitos. Mas recentemente, comecei a testar algo mais específico: áudios de frequências sonoras.
Pesquisas mostram que ouvir certas frequências pode impactar o cérebro de maneira regenerativa. A Journal of Alternative and Complementary Medicine publicou estudos sobre como frequências binaurais reduzem a ansiedade e melhoram a concentração. E a música clássica? Cientistas da University of Helsinki descobriram que ouvir Mozart e Beethoven ativa genes ligados à função cerebral e aprendizado. Ou seja, Bach pode ser um suplemento mental melhor que café.
Agora, olha que louco: semanas atrás, sonhei com “Livre Pra Voar”, do DJ Claudinho Brasil e Samanta Machado. No começo, achei aleatório. Mas depois percebi que a música era uma mensagem do meu subconsciente. Eu estava me libertando das amarras da bagunça mental e assumindo as rédeas da minha vida de um jeito mais estruturado.
A música, o movimento e o silêncio – tudo isso junto tem sido minha forma de organizar as prateleiras internas. Mas tinha um último ingrediente faltando…
A escrita: a arquiteta das emoções
Se Pilates me trouxe equilíbrio, meditação me trouxe calma e a música reorganizou meus sentidos, a escrita me ajudou a nomear tudo isso.
Sempre que sento para escrever, sinto que estou colocando cada emoção no seu devido lugar. Escrever é como organizar um armário mental: algumas coisas precisam ser dobradas com carinho, outras precisam ser jogadas fora sem dó.
Estudos mostram que a escrita terapêutica reduz a ansiedade e melhora o processamento emocional. Um artigo da Journal of Experimental Psychology comprovou que colocar os sentimentos no papel ajuda o cérebro a processar traumas e diminuir a atividade da amígdala – aquela parte do cérebro responsável pelas reações emocionais intensas.
E faz sentido. Desde que voltei a escrever, tenho sentido que minha mente está menos sobrecarregada. A poesia alimenta a alma, mas também serve de faxina. Meus textos são o jeito que encontrei de me ouvir, de me entender e de deixar registrado o que realmente importa.
E você, já arrumou seu armário interno hoje?
Se sua mente anda uma zona, talvez seja hora de testar um desses métodos. Pilates para o corpo, meditação para a mente, música para os sentidos e escrita para o coração. Seu futuro eu agradece – e, quem sabe, não te manda uma música de presente em um sonho também?
Sábado de Carnaval. Enquanto o Brasil acordava com glitter no rosto e ressaca moral, eu estava de pé às 7h da manhã no primeiro round, pronta para enfrentar um dia inteiro de trabalho. E quando eu digo pronta, quero dizer uma pilha de ansiedade, estresse e cansaço. Porque nada grita “alegria, alegria” como uma jornada de 11 horas de labuta, cercada por clientes apressados e mau educados.
O tempo passava num ritmo estranho, oscilando entre a velocidade de um piscar de olhos e a eternidade de uma fila de banco. Meio-dia bateu, e eu já estava reconsiderando todas as minhas escolhas de vida. Mas eis que chegam meus pais. Só de vê-los ali, alguma coisa dentro de mim se ajeitou. Um respiro. Um up necessário para continuar. Família tem disso – um jeito inexplicável de segurar a gente, mesmo quando a gente já estava meio caindo.
Às 18h, saí, fui pra casa. Banho, lágrima discreta, porque ninguém é de ferro, e o necessário ritual de “vamos fingir que temos energia para continuar”. Me arrumei com aquela vibe de “não queria estar fazendo isso”, mas a vida chamava. Segunda rodada.
Desci para o segundo round, pra minha surpresa, estavam lá minhas primas. E de repente, o astral mudou. Porque tem gente que chega e simplesmente faz o dia valer a pena. Gente que ri com você, que tira o peso da sua cabeça sem precisar dizer uma palavra. E a gente percebe, no meio das batalhas silenciosas que travamos todos os dias, que algumas pessoas são nosso resgate.
No final, é sempre isso: a vida pode até pesar, mas quem segura a outra ponta da corda faz toda a diferença. E você, já percebeu quem são os seus resgates nos dias pesados?
Ninguém ensina a lidar com a ausência. A morte, ao menos, tem um ritual, um desfecho, um ponto final ainda que doloroso. Mas o desaparecimento não. Ele é um vácuo onde as perguntas ecoam sem resposta, um labirinto sem saída, um relógio que nunca chega à hora certa.
O filme Ainda Estou Aqui traduz essa angústia de forma crua. O sumiço de Rubens não é apenas a sua ausência, mas a presença sufocante da dúvida. O que aconteceu? Por quê? Onde ele está? Perguntas que se tornam tão pesadas quanto a certeza da perda. Mas essa certeza nunca vem, e é isso que faz tudo ser ainda mais insuportável.
O que sabemos sobre Rubens? Pouco. O filme nos deixa essa lacuna como um reflexo da própria realidade: há um vazio no meio da história, exatamente como há na vida de sua família. Mas esse vazio incomoda. Porque, no fundo, queremos entender, queremos encontrar um culpado, queremos uma narrativa com começo, meio e fim. Queremos dar sentido ao que parece não ter.
E enquanto tudo se torna cinza, enquanto o peso da incerteza consome cada cena, há uma voz que se sobrepõe: Erasmo Carlos. A música, inesperada, surge como um fio de luz entre tanta sombra. Uma descoberta dentro de uma perda. Como se a melodia dissesse que, apesar de tudo, apesar de todos os desencontros e silêncios, algo sempre fica.
As atuações das Fernandas, aliás, são quase um grito dentro desse abismo. É a dor encarnada, a impotência de quem quer se agarrar a uma memória, a um nome, a um fio de esperança que talvez nunca existiu. É essa entrega que nos faz sentir junto. Que nos faz sair do filme ainda tentando entender.
E no final, o que resta? O silêncio, a incerteza, a falta. Mas também a prova de que, enquanto alguém se lembrar, ninguém desaparece por completo. Afinal, ainda estou aqui. E se não estivesse?
Tem dias em que a gente escolhe uma roupa pelo espelho. E tem dias em que a gente escolhe uma roupa pelo peito.
Porque não é só tecido, corte e caimento. É uma armadura, um grito, um abraço ou uma tentativa frustrada de se esconder do mundo.
Tem dias em que eu quero ser notada. Então coloco aquela calça que me deixa com cara de CEO da minha própria vida, mesmo que, por dentro, eu esteja me sentindo uma estagiária emocional. Mas tem dias em que só quero ser uma figurante no cenário da existência, e aí puxo o jeans surrado de mil anos atrás, aquele que me faz lembrar que já fui outra versão de mim mesma e, por algum motivo, ainda insisto em carregar essa versão no armário.
Porque roupa não é só sobre o que a gente veste. É sobre o que a gente sente.
Já percebeu que algumas roupas têm cheiro de memória? Como aquele vestido de formatura, que já não faz parte da minha vida mas, de alguma forma, ainda faz. Foi o auge da juventude, da liberdade, do frio na barriga. Está ali no guarda-roupa como uma cápsula do tempo, sem nenhuma utilidade real além de me lembrar quem eu fui e, talvez, quem eu ainda quero ser um pouco.
E tem aquela calça cara que não me serve mais. Mas não dou embora. Porque, de alguma forma, ela ainda me serve. Como lembrança, como última peça de um passado que eu não sei se quero soltar completamente.
Por outro lado, também tem aquelas roupas que se encharcaram de sentimentos ruins. A blusa que eu usava num dia péssimo, a calça que esteve comigo em um momento que eu preferia apagar. Guardo? Não sei. Mas se um dia eu usei as duas juntas e me senti mal, nunca mais repito a combinação. Não sei explicar, mas é como se a energia daquele dia ficasse presa ali, como um lembrete silencioso de que certas misturas simplesmente não funcionam.
Porque no fundo é isso: a gente não veste só roupas. A gente veste histórias. Escolhas. Emoções.
E às vezes, a pior parte não é abrir o guarda-roupa e não ter o que vestir. É abrir o guarda-roupa e perceber que nenhuma roupa combina com o que a gente está sentindo.
E aí começa o dilema: se eu não sei o que vestir, será que na verdade eu não sei o que estou sentindo? Será que estou emocionalmente desorganizada ou só precisando de um stylist? Quem sabe meu mapa astral não resolveria essa bagunça melhor do que a Marie Kondo.
No fim, coloco qualquer coisa e saio assim mesmo, torcendo para que ninguém perceba que estou mais confusa por dentro do que por fora. Mas e se perceberem? Bom, pelo menos a minha roupa vai contar uma história. Mesmo que seja a de alguém que claramente desistiu no meio do processo.
E você? Já se pegou olhando para o guarda-roupa esperando que ele te dissesse quem você é naquele dia?
Outro dia, um grilo entrou na minha casa. Pequeno, esverdeado, pulando sem rumo aparente. Mas, na minha cabeça, ele não estava ali por acaso.
Eu fiquei olhando pra ele. Ele ficou olhando pra mim.
E eu, claro, já comecei: O que isso significa? Será que é um aviso? Um presságio? Um sinal do universo?
Peguei o celular. “Significado espiritual de grilo em casa.”
E lá estava: sorte, transformação, crescimento pessoal. Bom sinal. Respirei aliviada. Mas continuei rolando a tela (porque a gente nunca para na primeira resposta) e encontrei um outro site dizendo que pode ser um mau presságio. Algo prestes a mudar. Aí já comecei a suar frio.
E essa sou eu. Essa pode ser você também.
Porque acontece o tempo todo. Se vejo um número repetido no relógio, acho que é o universo piscando pra mim. Se um passarinho pousa na minha janela, penso em quem já se foi. Se sonho com mar, me pergunto se é um chamado para viajar ou um alerta de mudanças.
Nosso cérebro não aceita o acaso. A gente precisa encontrar explicações, conectar os pontos, encaixar tudo numa narrativa que faça sentido.
Mas e se for só um truque da mente?
Na ciência, isso se chama apofenia — nossa tendência a enxergar padrões em eventos aleatórios. É por isso que vemos rostos em tomadas, figuras em nuvens e acreditamos que uma música ao contrário tem uma mensagem escondida. Já na psicologia, Carl Jung chamou isso de sincronicidade: a ideia de que coincidências podem ser, na verdade, conexões significativas.
E aí eu me pergunto: os sinais realmente existem, ou somos nós que decidimos enxergá-los?
Porque, no fundo, pode não ser sobre o grilo, os números repetidos ou o pássaro na janela. Pode ser sobre nossa dificuldade de sustentar as próprias escolhas.
É muito mais fácil acreditar que o universo está nos guiando do que admitir que a gente só quer tomar uma decisão e precisa de uma desculpa. Se eu penso em mudar de cidade e vejo uma borboleta pousando na minha mala, digo: “É um sinal! O destino está me mandando ir.” Mas e se essa mesma borboleta aparecesse enquanto eu pensava em ficar? Eu veria como um sinal para ficar?
A verdade é que os sinais só têm o peso que a gente dá. E talvez o verdadeiro sinal seja o que já sentimos aqui dentro.
O grilo, coitado, seguiu sua vida. Pulou para debaixo do sofá e sumiu. Sem grandes revelações cósmicas, sem nenhuma epifania estrondosa. Mas ficou ali, dentro de mim, como ficam todas as coisas que nos fazem questionar.
E você? Quantas vezes já esperou um sinal para tomar uma decisão que, no fundo, já sabia a resposta?
Era uma vez um homem chamado Tonho. Mas não qualquer Tonho. Este era O Tonho. O maior espetáculo de apatia que já pisou nesta terra. Se houvesse uma Olimpíada da preguiça, ele levaria ouro, mas provavelmente reclamaria do peso da medalha.
Tonho não andava, se arrastava. Cada passo seu parecia um sacrifício digno de épicos históricos, como se estivesse escalando o Everest quando, na verdade, só precisava ir até a esquina. Ele não trabalhava, ele cumpria tabela – e mesmo assim, com um desempenho tão desanimado que até um relógio quebrado era mais produtivo que ele.
Tudo para Tonho era um fardo. Uma cruz. Um sofrimento digno de novela mexicana. Pedir para ele fazer algo era como pedir para um peixe escalar uma árvore: impossível e ainda gerava um olhar de indignação, como se a mera sugestão fosse um insulto à sua existência. Mas é claro, ele não dizia isso abertamente. Tonho não falava. Tonho murmurava. Pelos cantos, entre dentes, sempre com aquela energia passivo-agressiva de quem gostaria de ser uma pessoa de atitude, mas o peso da própria insignificância não permitia.
E havia outra coisa sobre Tonho. Ele não gostava de mulheres mandando nele. Porque, veja bem, respeitar uma mulher como autoridade exigiria um nível de evolução que Tonho, estagnado em alguma vida passada, não havia atingido. Ele preferia resmungar, minar pelas beiradas, como um roedor tentando roer a fundação de um castelo.
Mas o mais fascinante em Tonho era sua incapacidade de perceber o próprio papel no teatro da vida. Enquanto todos ao seu redor evoluíam, buscavam, tentavam, falhavam e tentavam de novo, Tonho ficava ali, emperrado, esperando que o mundo mudasse sem que ele precisasse mexer um músculo. Mas o mundo não espera por Tonhos. O mundo avança, enquanto os Tonhos da vida permanecem estagnados, afundando em suas próprias reclamações, vítimas da única coisa que realmente os impede de crescer: eles mesmos.
Dizem por aí que a preguiça é um freio no quesito evolutivo do espírito. No caso do Tonho, parece que o freio travou de vez.
Se autoconhecer é maravilhoso, dizem. Um caminho de luz, falam. Mas ninguém te avisa que, no meio do processo, você vai se pegar chorando porque percebeu que repete os mesmos padrões que jurou que nunca mais repetiria. Ou que vai estar no meio de um surto existencial no trabalho, encarando o nada como se ele tivesse todas as respostas da sua vida.
Pois bem, nas últimas semanas, resolvi entrar nessa tal jornada do autoconhecimento. Dizem que é transformador, libertador, quase uma experiência transcendental. Mas eu diria que é mais parecido com desmontar um guarda-roupa da vida inteira e perceber que tem coisa demais acumulada lá dentro. E o pior: não dá nem pra culpar a vida, as circunstâncias ou os astros. É tudo sobre mim.
Foi assim que me vi obcecada com cada detalhe da minha existência. Meu cérebro virou um CSI emocional, analisando todos os casos arquivados da minha vida: “Por que eu ajo assim?”, “Será que minha missão de vida é escrever?”, “Por que sinto formigamento entre as sobrancelhas? Será que sou um Wi-Fi humano?”. E quando eu achava que ia dar um passo para a iluminação, vinha um vídeo aleatório no YouTube me dizendo que eu precisava ‘desbloquear meu chakra da confiança’.
Falando em confiança, também resolvi trabalhar minha inteligência emocional no relacionamento. Aprendi que isso significa basicamente não gritar, não dramatizar e não mandar indiretas no Instagram. Honestamente? O desafio do ano. Porque, às vezes, eu só queria um bom Aperol e a permissão divina para ser passivo-agressiva em paz.
Mas entre surtos e reflexões profundas, percebi que essa coisa de se conhecer melhor tem um lado bom. Estou aprendendo a confiar mais na vida, a segurar a ansiedade e a entender que nem tudo precisa ser controlado (mesmo que eu ainda tenha vontade de controlar tudo). E o mais importante: voltei a escrever. Ainda não sei se essa é minha missão de vida ou só mais uma forma chique de organizar meus pensamentos, mas pelo menos agora posso transformar minhas crises existenciais em algo que faça sentido.
No fim das contas, o autoconhecimento não é essa coisa mística e bonita que vendem por aí. Às vezes, é só você tentando não surtar enquanto encara o nada e se pergunta: “Será que estou no caminho certo?”. A resposta? Sei lá. Mas pelo menos agora eu bebo meu Aperol sem culpa.
Outro dia acordei com uma certeza: estou exausta de carregar o mundo nas costas. E antes que você me pergunte “mas quem te deu essa missão?”, já adianto que ninguém deu. Peguei por conta própria. Fui lá e me servi de um pratão de responsabilidades emocionais, existenciais e financeiras, tudo regado a um molho agridoce de dúvidas sobre o futuro e um toque de saudade do que ainda não vivi.
Tem gente que sente saudade do que já foi. Eu sinto do que nem aconteceu ainda. Eu e minha mania de romantizar o porvir, como se meu futuro fosse um roteiro bem escrito da HBO e não uma sequência aleatória de surpresas (na maioria das vezes, pouco cinematográficas).
E tem mais. Além de carregar esse mundo que nem me pediu carona, ainda tive a audácia de achar que eu ia conseguir escrever algo genial hoje. A musa inspiradora deve ter olhado pra mim e falado: “gata, hoje não”.
Aí vem aquele papo: “mas você precisa descansar”. Claro. Descansar entre um boleto e outro, entre uma meta e um sonho adiado. Vou tirar férias, sim. Uns 15 minutinhos deitada no chão olhando pro teto, refletindo se foi uma boa ideia essa coisa de crescer e virar adulta.
O problema é que, quando a gente se sente assim, sempre aparece um guru do otimismo pra dizer que é só confiar no processo. O processo, no caso, parece uma esteira de academia que não desliga nunca. E eu? Correndo de meia escorregadia.
Mas aí, no meio desse dramalhão digno de novela mexicana, lembrei que já passei por coisas piores e sobrevivi. Lembrei que a vida tem uns respiros, umas brechas, uns dias bons. Lembrei que, às vezes, não é preciso fazer nada além de aceitar que hoje é um dia meio cinza. Porque até os dias cinzas têm seu charme.
Então, se você também tá carregando um planeta nas costas, deixa eu te contar um segredo: ninguém te pediu isso. Pode devolver pra órbita. E se for o caso, tira uns minutinhos pra deitar no chão e encarar o teto. Dizem que é lá que moram algumas das melhores respostas.
Comecei o dia lutando com o despertador. Quer dizer, lutando é um exagero. Eu só perdi mesmo. Adiei uma, duas, duzentas vezes, na ilusão de que cinco minutos fariam alguma diferença na minha vida. Spoiler: não fizeram.
Levantei com a energia de um celular no modo economia, mas decidi começar o dia relax. Namorei meu amor, na tentativa desesperada de entrar no mood “zen”. Não sei se relaxei ou só me dei conta de que, enquanto isso, meu dia já estava começando sem mim e o caos me esperava lá fora, impaciente.
Fui me arrumar, meu momento terapêutico diário, aquele em que a maquiagem esconde a exaustão e o look bem montado me faz acreditar que estou no controle da vida. Ilusão? Talvez. Mas é sobre isso.
Cheguei no trabalho e, antes das 10h, já era um polvo. Cada tentáculo resolvendo um BO diferente, enquanto a cabeça só queria um café e um passe livre para fugir para as Maldivas. Mas não, fiquei firme.
Almoço? Ah, que conceito interessante. O meu aconteceu depois das 14h, porque antes disso eu estava sendo CEO, contadora, social media, operadora de telemarketing e, em alguns momentos, um call center humano.
Antes de almoçar, claro, passei no mercado. E em outro mercado. Porque a minha vida é assim: trabalho o dia inteiro, mas faço compras como se fosse uma influencer de vida tranquila e organizada.
Finalmente em casa, almocei, guardei as compras, dei aquela respirada funda de “eu aguento”, e voltei pro trabalho às 15h27. Sim, pontualmente 15h27, porque minha vida não tem nem a dignidade de ser organizada em números redondos.
Botei o financeiro em ordem, fiz propaganda, cobrei cliente, planejei a semana seguinte, dei uma olhadinha no abismo existencial e continuei vivendo.
Se não chover, vou no beach tennis. Se chover, o que vai acontecer é o colapso do meu sistema nervoso. Preciso urgentemente acertar umas bolinhas, antes que eu resolva acertar pessoas.
Depois, jantar com meu melhor amigo, que chegou faz mais de uma semana e até agora só me viu em forma de áudio no WhatsApp dizendo “meu Deus, preciso te ver”. Hoje não passa. Se passar, minha amizade entra com pedido de falência.
Ainda preciso dar atenção ao meu marido, porque aparentemente casamento não é só sobre dividir boletos, e também aos meus pais, que moram em outra cidade e me lembram disso com mensagens carinhosas do tipo: “sumida, né?”
E no fim, vou dormir. Quer dizer, tentar. Às 2h. Acordar às 7h. Porque meu dia precisava de 32 horas, mas me deram só 24 e ainda me disseram para ser feliz. Como vive? Não sei. Mas amanhã faço tudo de novo.
Meu avô era aquele tipo raro de pessoa que parecia saber de tudo antes de todo mundo. Ele não precisava de muito para ser grande. Não era de palavras vazias, nem de gestos grandiosos. Era grande no silêncio, na postura. Sempre foi o pilar da nossa família, aquele que, com uma frase, conseguia deixar tudo mais claro. Ele vinha de um lugar simples, mas sempre soube como fazer as coisas acontecerem, como conquistar sem pressa, como poupar e aproveitar o que tinha. Naquela época em que as coisas eram feitas com mais calma, ele sabia exatamente onde colocar cada passo, cada sonho, e com isso construiu um legado que não era só de bens materiais, mas de caráter. Era alguém que, em sua sabedoria silenciosa, conseguia ensinar mais do que qualquer palestra motivacional por aí.
Ele tinha um hábito simples, mas que me marcou profundamente: andava de carro não para chegar a algum lugar, mas para ouvir música. E não era qualquer música, era a música – aquela que tem o poder de fazer tudo parar por um momento e te transportar para outra dimensão, sem pressa. Ele dizia que a vida precisa de momentos de pausa para ser apreciada de verdade. Talvez fosse isso que ele soubesse fazer tão bem: encontrar beleza até nas coisas mais simples. E eu, que puxei dele esse gosto por música, sempre me pego em momentos de trânsito, sentindo que a estrada não tem fim, só para continuar ouvindo aquela canção que me faz pensar em tudo o que ele me ensinou.
A vida dele não era feita de discursos complicados. Quando eu ficava perdida em alguma equação de matemática, ele aparecia com a calma que só ele tinha, dizendo: “Você vai entender, é só pensar com calma.” E eu, com aquele pânico de não saber o que fazer com as equações, achava que nunca ia conseguir. Mas, com o tempo, percebi que não era só de números que ele entendia – ele sabia que a vida também se resolvia com paciência e, acima de tudo, com foco. Às vezes, só é preciso parar, olhar para o que é simples, e seguir adiante.
E quando ele me dava aquele conselho, “corpo são, mente sã”, parecia mais uma lembrança, uma orientação que ele mesmo tentava seguir, mas que, na prática, nunca estava realmente disposto a aplicar em si. Ele sabia que o equilíbrio entre corpo e mente era fundamental, mas, vamos ser sinceros, ele preferia a companhia do sofá. E eu, que sempre pensei que poderia passar pela vida sem fazer muito esforço físico, só me dei conta de que ele estava certo quando a vida me puxou de volta para o corpo, para a saúde – e eu, teimosa, demorei para entender que mente sã realmente precisa de um corpo são. Mas ele, sempre lúcido, talvez soubesse que, um dia, a gente entende.
Um dia, a voz dele ficou rouca. Nada grave, pensaram todos. Como ele, que sempre teve tanta energia, poderia ser tocado por algo tão simples? Mas foi. Era um aneurisma, que se apresentou silenciosamente, sem que ninguém percebesse a gravidade. Ele, que sempre esteve no controle, já não estava mais. Foi para o hospital, fez os exames, mas não voltou. Ficou ali, num silêncio, assim como foi a vida dele, até o último suspiro. Ele, que sempre falava sobre ter o controle das coisas, agora não podia mais controlar nada. E esse foi o maior ensinamento de todos: a vida, por mais que a gente tente, nunca vai seguir os nossos planos.
Antes de tudo acontecer, ele já havia me dado um recado, num desses momentos em que ele parecia saber mais do que os outros: “Seja forte. Cuide do seu pai.” Ele estava certo, como sempre. Eu só não sabia o quanto aquilo ia fazer sentido mais tarde, quando ele se fosse. No dia em que soube, fui para a rede, como ele faria, e fiquei ali, pensando nele. Eu não sabia ao certo o que estava acontecendo, mas, de alguma forma, sabia que o silêncio dele ainda estava ali, me dizendo para ficar calma, para ser forte.
E então, olhei para o céu. Como ele sempre fazia quando queria se conectar com algo maior. Nas nuvens, eu vi o formato dele, como se estivesse me dizendo, uma última vez, que estava tudo bem. Que ele sabia de tudo. Eu sei, você deve estar pensando que é uma história estranha, mas o que é a vida, senão um jogo de sinais, de coincidências, de momentos em que parece que as coisas se alinham de maneira misteriosa? Aquelas nuvens, para mim, eram uma despedida, mas também um abraço. Algo que ele, de algum jeito, sabia como deixar: um recado sutil, mas claro, de que ele não estava realmente se despedindo.
Hoje, sempre que ouço uma música que ele amava ou vejo as nuvens dançando no céu, eu sinto que ele ainda está por aqui, me guiando de algum jeito. Talvez, o que ele deixou em mim não tenha sido um legado de riquezas ou grandes feitos, mas algo mais simples: a capacidade de parar, ouvir a música e entender que a vida é feita de pequenos momentos que, no fim, são os maiores de todos. E esse é o maior legado que ele me deixou. Porque ele sabia, mais do que ninguém, que o tempo não é algo que controlamos, mas o que fazemos com ele, sim. E, quando ele se foi, deixou nas entrelinhas de sua vida as maiores lições de todas.
Tem gente que nasce com um coração que transborda. Daqueles que não sabem amar pela metade, que se jogam de olhos fechados, que fazem o impossível por quem nem sempre faria o mínimo por eles. E o mais curioso é que, no meio disso tudo, essas pessoas não sentem que estão perdendo nada—até o dia em que sentem.
Ser bom é quase um dom e, ao mesmo tempo, um perigo. Porque o mundo nem sempre sabe lidar com corações grandes. Às vezes, confundem gentileza com fraqueza, confundem empatia com obrigação. E o que era para ser bonito vira uma via de mão única, um beco onde só se entra, nunca se recebe de volta.
A questão é: a culpa é do mundo ou de quem se entrega sem medir? Porque tem quem avise, tem quem perceba, tem quem tente abrir os olhos. Mas será que todo mundo quer enxergar? Porque tem gente que prefere acreditar que amor, lealdade e amizade vêm sem peso, sem cobrança, sem a necessidade de reciprocidade. Talvez a paz deles esteja na ilusão de que todos ao redor sentem da mesma forma.
E aí vem a parte mais dura: se a pessoa não vê problema, quem somos nós pra avisar?
Cada um acorda no seu tempo. Cada um aprende do seu jeito. Alguns vão entender na dor, outros nunca vão entender. E no fim, o que resta pra quem observa de fora é o dilema de sempre: vale a pena alertar, ou cada um tem que aprender por si?
No fundo, a resposta é sempre a mesma. Você pode até plantar a semente, mas ninguém pode forçar o outro a colher.
Acordei às seis da manhã porque sou trouxa. Podia dormir até as oito, mas levantei, joguei beach tennis, suei, corri pra casa, troquei de roupa e antes das dez já tinha feito mais pelo meu dia do que certas pessoas fizeram em anos. A diferença entre nós? Eu resolvo problemas, enquanto tem gente que só sabe ser um.
E não é qualquer um, não. São os verdadeiros atletas do parasitismo. Fazem o mínimo, e ainda passam o dia exaustos de carregar a própria mediocridade nas costas. Um peso que, sinceramente, não é meu problema. Mas seria mentira dizer que não me diverte.
Porque o que me fascina é a falta de noção. Tem gente que tem um talento natural pra não valer nada e, ainda assim, achar que está enganando geral. São quase mágicos. Conjuram um personagem de “pessoa esforçada” enquanto, nos bastidores, vivem na base do jeitinho, do golpe, do “ninguém vai perceber”. Aí quando percebem, fazem cara de ofensa.
O currículo da falsiane é sempre o mesmo:
• Especialista em elogios falsos (com aquele delay no sorriso de quem precisa processar a própria mentira antes de falar)
• Mestre em puxar saco e tapete simultaneamente, porque a multitarefa só funciona quando é pra rasteira
• PhD em enganar otário, mas só os que se deixam enganar – e esses, infelizmente, nunca são os que realmente merecem ser protegidos
• Experiência comprovada em se fazer de vítima quando pega no pulo, com direito a choro ensaiado e frase dramática de novela mexicana
E sabe o que mais irrita? Sempre tem um bobo pra defender. “Ah, mas fulana não é má pessoa, tem um bom coração, todo mundo merece uma chance…” Ah, tá. A questão não é dar chance, é saber quem realmente merece. Mas tem gente que nasce com esse radar quebrado. Desconfiado só com quem fala a verdade, mas um cordeirinho na mão de quem vive na malandragem.
E aí vem a parte boa. A vida, essa senhora sábia e debochada, não deixa barato. Ela até dá corda, finge que não viu, deixa a pessoa se encher de confiança… Mas quando vem a fatura, meu amor, não tem cashback nem parcelamento.
E eu? Eu sigo. Trabalhando. Construindo. Criando. Porque enquanto uns vivem de dar rasteira, eu vivo de fazer história. E a diferença entre a gente é simples: o que eu construo, dura. O que elas fazem, desmorona.
E no final, a única coisa que eu sinto é alívio. Porque quem joga sujo pode até se achar esperto, mas nunca é vitorioso. E eu, sinceramente? Não tenho tempo pra pena. Cada um colhe o que planta. E elas plantaram vento. Boa sorte lidando com a tempestade.
Era uma quarta-feira comum até que, do nada, voltamos no tempo para a Idade Média. Não porque o mundo acabou, mas porque esquecemos de pagar a conta de luz. Um detalhe besta, um mero descuido, um sinal claro de que a vida adulta é basicamente um looping de boletos, prazos e esquecimentos estratégicos.
A verdade? Nem era por falta de dinheiro. Só de memória. Só de cabeça cheia demais, girando entre açougue, choperia, rotina e um milhão de pequenas responsabilidades que a gente insiste em equilibrar como se fosse fácil. O fato é que, sem aviso prévio – ou melhor, com todos os avisos que ignoramos – a escuridão tomou conta.
Sem Netflix. Sem banho quente. Sem Wi-Fi. Sem a ilusão de que tínhamos o controle de tudo.
A primeira reação foi óbvia: caos. A segunda foi inesperada: liberdade. Porque sem eletricidade, sem trabalho, sem a pressão do dia seguinte, sobrou tempo. Sobrou espaço. Sobrou a gente.
Foi assim que, sem luz e sem plano B, decidimos fugir. Para onde? Para o Airbnb dos meus sogros. Algo que nunca faríamos em uma quarta-feira qualquer, mas que, naquela noite, parecia a coisa certa a fazer.
E foi lá, na piscina quente, no banho morno e na comida pedida às pressas, que entendemos o presente disfarçado que o destino tinha jogado no nosso colo. Sem distrações, sem ruídos. Só nós dois. E então, o tempo desacelerou.
Rimos. Conversamos. Nos enroscamos no sofá para ver um filme sem precisar pausar para responder mensagens. Namoramos. Dormimos em paz. E, no meio desse apagão forçado, uma coincidência que não parecia tão coincidência assim: há exatamente quatro anos, começávamos a morar juntos.
Quatro anos de rotina, trabalho, boletos esquecidos e um amor que, vez ou outra, precisa de um respiro. E talvez tenha sido isso que a vida quis nos lembrar ontem: que, no meio do caos, a gente precisa desligar. Às vezes, à força.
Dizem que cada detalhe muda tudo. Uma borboleta bate as asas na China, e um motoboy se atrasa na minha cidade. O caos do universo é meticulosamente coordenado pelo acaso, e eu fico aqui, deitada na cama, olhando para o teto, me perguntando: e se eu tivesse nascido no dia 1º de agosto em vez do dia 2?
Porque, veja bem, eu gosto de números ímpares. Eles têm uma rebeldia bonita, uma coisa meio “não sou divisível por dois, me aceite assim”. Mas eu nasci no dia 2. Um número par. Um número que se dobra. Que se divide. Que se ajusta. E, cá entre nós, eu nunca fui muito de me ajustar.
Se eu tivesse nascido no dia 1, talvez minha personalidade fosse outra. Talvez eu fosse mais decidida, mais impulsiva, mais “chego antes da festa começar e nem espero o parabéns”. Talvez eu tivesse nascido de parto normal, porque pessoas que nascem no dia 1º me parecem determinadas assim, do tipo que já saem da barriga dando opinião. Mas não. Nasci no dia 2. Um número pacífico, diplomático, bem-comportado. O que é muito irônico, considerando que eu sou teimosamente do contra desde que me entendo por gente.
E se a mudança de data mudasse tudo? Se, por um capricho cósmico, essa antecipação de 24 horas fizesse com que eu escolhesse um curso diferente na faculdade? Ou um signo diferente no mapa astral? (Porque todo mundo sabe que 1º de agosto ainda é Leão raiz, mas dia 2 já começa a vir com um toque de canceriano arrependido.) Talvez, nascendo um dia antes, eu tivesse menos crises existenciais ou mais sorte. Quem sabe eu tivesse escolhido um nome artístico, me tornado influencer de lifestyle e estivesse agora postando um reels motivacional sobre “os benefícios de acordar às 5h da manhã” enquanto vocês, pobres mortais, tentam sobreviver ao café da manhã.
Mas não. Eu sou eu, nascida no dia 2, ainda encanando com os detalhes mais absurdos e fazendo do meu próprio nascimento um episódio inédito de “E Se?” da Marvel.
A verdade é que, no fim das contas, tanto faz se foi no dia 1, no dia 2 ou no dia 2000. A borboleta bateu as asas, eu nasci, cresci e cá estou: pensando demais sobre as coisas, cheia de teorias malucas e, claro, odiando um pouco o fato de que meu número de nascimento é tão par quanto uma planilha do Excel.
Todo mundo já conheceu um. O ser humano que sabe tudo, resolve tudo, opina sobre tudo… menos sobre a própria vida. Aquele tipo que te analisa como se fosse um coach não certificado, distribui conselhos que ninguém pediu e, claro, te julga com um rigor que nem Freud teria paciência.
Eles são especialistas em negócios (nunca tiveram um), mestres do amor (nunca conseguiram manter um relacionamento decente), grandes estrategistas de sucesso (nunca conquistaram nada). Você pergunta: de onde vem essa sabedoria toda? E a resposta é simples: da própria cabeça.
A pior parte? Eles acreditam. Criam narrativas onde são gênios incompreendidos, vítimas do sistema ou injustiçados pelo universo. A culpa nunca é deles. Nunca. São os outros. Sempre os outros. A ex, o chefe, a economia, o governo, Mercúrio retrógrado, o cachorro da vizinha.
E quando você menos espera, eles estão na sua vida. Entram sorrateiramente, com aquele ar de “só quero ajudar” e, antes que você perceba, estão fazendo análise gratuita sobre cada decisão sua. De repente, você se vê questionando até se cortou a carne do jeito certo no almoço.
Mas aí vem o plot twist: você descobre que, enquanto eles estavam ocupados demais julgando, fofocando e problematizando sua vida, a deles estava caindo aos pedaços. E o melhor que você pode fazer? Sorrir, brindar à sua liberdade e seguir plena. Porque no final, quem fala demais, faz de menos.
A vida adulta é um amontoado de boletos, ligações que poderiam ser e-mails e uma eterna tentativa de dormir mais cinco minutinhos. É um corre sem fim, e às vezes a gente se pega no piloto automático, só existindo, pagando contas e respondendo “tudo bem e você?” por pura força do hábito. Mas aí vêm eles. Os pequenos prazeres. Os momentos que seguram a gente no mundo.
Tipo um bom drink. Mas um bom drink mesmo, caprichado, bonito, com um gelo que parece ter sido esculpido por um monge budista em meditação profunda. O primeiro gole desce como um abraço interno, e então, devagar, tudo fica mais leve. A conversa flui, as preocupações encolhem, e até aquele ex que foi um erro monumental se torna um estudo de caso interessante, quase uma piada. Mas veja bem, é sobre curtir, não sobre virar um ser humano de bracinhos moles e neurônio solitário todo fim de semana porque a realidade dói demais para encarar sóbrio.
E depois, a comida. Ah, a comida. Se existe um motivo nobre para estar vivo, ele vem temperado e servido num prato lindo. Sentar num restaurante bom, pedir algo que faz a boca encher d’água, ver o garçom trazer aquele prato que parece uma obra de arte. O primeiro garfo, o sabor explodindo na boca, e pronto: instantaneamente mais feliz. Mas tem gente que, ao invés de saborear a vida assim, se afunda em coisa que só detona. Troca a alegria genuína do paladar pela anestesia barata do exagero. Escolhe a ressaca, a paranoia, o torpor. Troca um prato maravilhoso por um cigarro com gosto de morte e uma dose de sei lá o quê, servida num copo que fede a arrependimento.
Viajar, aliás, é uma das maiores provas de que a vida pode ser muito mais do que esse quadrado sem graça que algumas pessoas insistem em ocupar. É chegar a um lugar novo e sentir aquele choque gostoso de novidade, o frio na barriga de não saber exatamente onde está, mas amar cada segundo. Perceber que a vida não precisa ser um looping eterno de ressaca e bad trip, que existem sabores, culturas, cheiros e músicas esperando para serem descobertos. E que a gente pode, sim, buscar prazer sem precisar se arrastar feito um zumbi químico pelo caminho.
Mas nem tudo precisa ser tão longe. Existe um luxo maior que champanhe caro: acordar sem despertador. Abrir os olhos e não precisar chorar porque a realidade bateu forte demais. Sentir o corpo descansado, a alma leve. Respirar fundo e saber que o dia pode ser simples, sem precisar dopar a cabeça para parecer suportável.
E então vêm os dias de recarga. De filme no sofá enquanto chove. De comida gostosa na casa da família. De amigos rindo até a barriga doer. Daqueles momentos em que você olha em volta e pensa: como tem gente que troca isso tudo pelo nada absoluto? Pela alienação, pelo torpor, pela fuga constante da única coisa que vale a pena: sentir de verdade.
Talvez seja isso. Talvez o que sustente a gente nesse mundo não sejam as promessas de “só mais uma” dose, nem as noites que evaporam num blackout, nem os dias que se perdem no limbo do exagero. Talvez seja sobre os pequenos momentos. Os prazeres reais, simples, autênticos.
Ou talvez eu só precise de outro drink. Um bom, claro. Porque a vida já tem emoções suficientes – não precisa de anestesia.
Minha mãe adora contar essa história como quem prova, com um sorriso, que o mundo já nasci querendo consertar. Eu tinha quatro anos, mal sabia segurar o lápis, e, enquanto outras crianças desenhavam nuvens ou rabiscavam o próprio nome, eu escrevia “paz”.
Não “mamãe”. Não “papai”. Paz.
Dizem que a primeira palavra escrita da gente é como um presságio, um desejo que a alma larga no papel antes mesmo de a gente saber falar direito. E lá estava eu, toda concentrada, enchendo os céus dos meus desenhos com letras tortas e ansiosas. O sol tinha um sorriso, as nuvens eram de algodão-doce, e, ao lado de tudo isso, lá estava: paz. Assim mesmo, com uma insistência de quem mal entende o significado, mas já sabe que aquilo é importante.
Naquele tempo, paz era só uma palavra bonita, uma coisa que combinava com arco-íris e passarinhos. Mas, com o tempo, ela foi virando outra coisa. Foi virando um ideal, uma promessa que sempre parecia estar logo ali na próxima curva, mas nunca na minha mão.
A vida, claro, tratou de mostrar que paz não é cenário de desenho infantil. Não é céu azul nem sol sorridente. Paz é o som que o silêncio faz quando você sobrevive. É o abraço depois da briga, o café quente num dia frio, o barulho das ondas quando a cabeça está cheia. Paz, descobri, é algo que dói buscar porque, às vezes, ela vem misturada com um pouco de cansaço, um pouco de saudade.
Hoje, penso nos meus desenhos de criança como um mapa. Um jeito meio torto de me lembrar, lá na frente, que minha busca sempre foi essa. Não um sonho grande, um carro chique ou um destino paradisíaco. Não. Só paz. Uma palavra pequena, mas que pesa como uma mala cheia de coisas que você insiste em levar.
Talvez seja isso. Talvez, lá no fundo, a gente sempre soube o que estava procurando. Só que, na pressa de crescer, esquece. E você? Qual foi a sua primeira palavra? Aquele rabisco desajeitado que, se olhar direito, ainda é o que move os seus dias?